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Lei de responsabilidade educacional: por menos leis e mais responsabilidade

Guilherme Perez Cabral

27/10/2015 06h00

Há quase dez anos, está em discussão, na Câmara dos Deputados, projeto de lei que trata da qualidade da educação básica e da responsabilidade dos gestores públicos em sua promoção. A iniciativa é importante, como, aliás, qualquer esforço em favor da melhoria da educação no país. Ganhou significação maior diante do compromisso assumido, no Plano Nacional de Educação (Lei nº 13.005/2014), de aprovar, no prazo de um ano, uma Lei de Responsabilidade Educacional.

Porém, analisando o precário cenário educacional brasileiro e contrapondo-o com as normas que, na teoria, o regulamentam, penso que não é exatamente uma nova lei o que o momento está a exigir, com mais urgência. Uma realidade melhor, definitivamente, não sairá do trabalho meramente legislativo. Sabemos disso. Melhor seria gastar nossas energias com mais ação, baseada no muito que já dispomos em termos de legislação.

E chama a atenção, no projeto de lei debatido no Congresso, o quanto repete o que já está previsto em lei.

Vincula a qualidade da educação básica à garantia de titulação mínima, formação continuada e condições adequadas de trabalho aos profissionais da educação; à institucionalização de plano de carreira docente; à promulgação de planos de educação, pelos Estados e Municípios; à universalização do ensino fundamental e médio, o primeiro em tempo integral; e ao atendimento de padrões de funcionamento da escola, baseados em cálculo de custo por aluno. Prevê, também, o processo nacional periódico de avaliação do rendimento escolar. Determina o desenvolvimento, pelo Poder Público, de ações específicas, em vista da solução de deficiências identificadas e da permanente melhoria do ensino. No fim, o projeto trata da responsabilidade do gestor público por descumprimento da lei, trazendo punições como a perda de mandato e de direitos políticos.

Nada, absolutamente nada disso é novidade.

O padrão de qualidade, a valorização do profissional da educação, inclusive por meio de plano de carreira, e a universalização da educação básica são princípios e garantias constitucionais (Artigos 206 e 208).

A lei de Diretrizes e Bases já trata do processo nacional de avaliação do rendimento escolar (Art. 9º); do oferecimento progressivo do ensino fundamental em tempo integral (Art. 34, § 2º); e da titulação mínima de profissionais da educação (Artigos 61 e 62). Assegura aperfeiçoamento profissional continuado; condições adequadas de trabalho; e inclusão, na carga horária, de período reservado a estudos, planejamento e avaliação (Art. 67). Ao custo mínimo por aluno, capaz de assegurar ensino de qualidade, refere-se  no Art. 74.

Quanto à exigência de elaboração de planos estaduais e municipais de educação, está prevista no Art. 8º do Plano Nacional de Educação, aprovado em 2014.

Em relação à responsabilização do gestor público o projeto não faz mais que remeter a regras previstas na Lei nº 1.079/1950, no Decreto-lei nº 201/1967 e na Lei nº 8.429/1992.

Reafirmar, no papel, direitos e obrigações que, mesmo em vigor há tempos, nunca foram cumpridos, é desnecessário. Faz lembrar sarcástica recomendação, citada por Raymundo Faoro, para remediar tantos desacertos históricos: promulgar uma lei para tornar as outras obrigatórias.

De qualquer forma, assumimos o compromisso de elaborar a nova lei. Então façamos isso, preenchendo espaços deixados pela legislação vigente, fortalecendo o sentido da qualidade, os mecanismos de seu controle e os procedimentos e critérios para responsabilização dos gestores, pelas faltas praticadas.

Mas não esperemos dela a solução dos problemas. Nem façamos dela o foco principal de nossos esforços. Já dispomos de leis educacionais. O que falta, mesmo, é ação, com responsabilidade. Lutar pela efetivação de nossos direitos, cumprir com nossos deveres, fazendo o que nos compete, e, finalmente, exigir dos demais (Poder Público e sociedade civil) o cumprimento de suas obrigações.