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Reforma do ensino médio sem consolo

Guilherme Perez Cabral

13/02/2017 06h00

O Senado aprovou o projeto que transforma em lei a medida provisória da reforma o ensino médio brasileiro (MP no 746/2016). Só falta, agora, a manifestação da concordância (sanção) da Presidência da República.

Não tivemos a oportunidade de participar da discussão. Não dá para saber quão melhor (ou pior) seria a reforma se realizada de forma democrática (quero dizer, de forma radicalmente democrática).

Dentre as alterações à lei de diretrizes e bases – LDB (Lei nº 9.394/1996), o texto aprovado estabelece que o currículo do ensino médio será composto por uma “base nacional comum curricular” (BNCC), obrigatória para todos os alunos, complementada por um “itinerário formativo” específico, escolhido do estudante, na área de linguagem, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e sociais aplicadas ou formação técnica e profissional.

Prevê a ampliação progressiva da carga horária instituindo a política de fomento ao ensino médio em tempo integral. Além disso, reinclui, como componente obrigatório, o estudo da arte, da educação física da filosofia e sociologia, materiais que haviam sido excluídas pela medida provisória em vigor. A referência à educação ambiental, porém, sai definitivamente da LDB.
“Agora vai”, pensam alguns. Pensaram assim, também, tantos outros “reformadores” da nossa legislação educacional, como Benjamin Constant, com a reforma realizada em 1890; Epitácio Pessoa, em 1901; Rivadávia Correa, em 1911; Carlos Maximiano, em 1915; Francisco Campos, em 1931; Gustavo Capanema, em 1942.

Pensavam assim, também, acredito, os militares quando da reforma do “ensino secundário”, em 1971. Alteraram nossa primeira LDB, aprovada dez anos antes: uma LDB passível de muitas críticas (como todas as reformas anteriores e posteriores), mas fruto de intensos debates num contexto democrático, o que é fundamental.

Constant, Pessoa, Correa, Maximiano, Campos, Capanema, militares golpistas promoveram sua reorganização do ensino de cima para baixo. Convictos de suas razões do que é melhor para o Brasil, certos do caminho a ser seguido, dispensaram a participação dos destinatários. Não funcionou.

O ensino médio continua ruim. Exige, sim, medidas urgentes para sua melhoria. Em 1959, Manifesto assinado por grandes professores, da direita à esquerda do pensamento político – incluindo Anísio Teixeira, Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Sérgio Buarque de Holanda e Miguel Reale – já constatava isso. Colocava o ensino secundário como “ponto nevrálgico” na questão das reformas escolares então discutidas. Permanece assim.

A reforma do Temer, como a de tantos reformadores do passado, nos é imposta, de cima para baixo. Como a dos militares, em 1971, ataca uma LDB resultado de intensos e longos debates: um texto que, com seus erros e acertos, materializa o que pudemos construir com a participação de todos.

A reforma do Temer veio por MP, instrumento que, como se manifestou o Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, em ação que tramita no Supremo Tribunal Federal, não é adequado para reformas em políticas públicas, menos ainda em esfera crucial para o desenvolvimento do País, como é a educação.

“Agora vai” pensam alguns, como pensaram reformadores do passado, nos impondo seus erros e não nos levando a lugar nenhum. Penso que o melhor caminho é o debate, a participação. Aumenta a probabilidade de acerto e nos dá o consolo de que os erros a que estamos fadados são nossos. Erros e acertos coletivos, democráticos.