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Transporte escolar é direito à educação (ou: como medir dois quilômetros?)

Guilherme Perez Cabral

20/02/2017 04h00

Capital paulista. Pais e mães reclamavam do corte do transporte escolar gratuito para seus filhos, crianças com deficiência ou problema crônico de saúde. Foram avisados da perda do benefício poucos dias antes do início das aulas.

A prefeitura fazia o recadastramento dos alunos com direito ao transporte gratuito e tirou o benefício de quem, segundo seus cálculos, morava a menos de 2 km da escola. O debate girava em torno disso: o cálculo dos dois quilômetros. Antes, media-se pelo caminho da van. Agora, é o menor, ainda que a pé.

Foi a notícia que saiu.

Educação e transporte são direitos humanos fundamentais, prevê a Constituição. Transporte escolar é direto fundamental em dobro.

O direito ao transporte escolar tem tudo a ver com o direito à educação. Um leva ao outro, literalmente. Fica muito difícil aprender se não há como chegar na escola.

Por isso, a Constituição determina que o dever do Estado com a educação abrange, dentre outras coisas, o atendimento ao aluno, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas de material didático, assistência à saúde, alimentação e... Transporte.

A LDB (Lei de Diretrizes e Bases) determina a mesmíssima coisa. E estabelece, também, que o investimento do Poder Público com programas de transporte escolar significa uma despesa com educação. No orçamento, entra na rubrica “manutenção e desenvolvimento do ensino”.

Transporte escolar e educação, repito, têm tudo a ver. Mas estão ligados em promessas e compromissos legais que teimam em não sair do papel. Vivem no mundo do que é possível, do (pouco) que deu para fazer.

Sim, transporte, educação e transporte escolar são direitos humanos fundamentais. Porém, da categoria “direito social”. Quer dizer, são direitos que, para serem concretizados, exigem uma ação do Poder Público. Andam junto com políticas públicas e com a prestação de serviços públicos.

Nesse sentido, aprendemos na aula de direito constitucional, os direitos sociais estão em normas que têm “eficácia limitada”. A produção dos efeitos nelas previstos dependem de outras providências. Dependem da ação do Poder Público. Dependem de políticas públicas. Dependem da prestação de serviços públicos.

Mas falta dinheiro, dizem os ricos governantes. O governo federal, os estados e os municípios estão endividados. Não dispõem de recursos para garantir os direitos de todo mundo. Muita gente e muito direito para (é o que se diz) pouco dinheiro.

Discutimos, então, o que é possível. Lutamos para que seja, pelo menos, o mínimo para viver dignamente. Reivindicamos, por exemplo, o transporte gratuito para crianças com deficiência e doenças crônicas.

Quanto ao Poder Público, se ocupa com cálculos, argumentos “técnicos” e “jurídicos” e mesóclises para justificar os cortes. Cortar ao máximo possível os direitos dos outros.

E a conversa acaba assim. Como se medem dois quilômetros?