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Marés de mudança

Lucila Cano

11/10/2013 06h00

Philippe Cousteau, conservacionista e neto do oceanógrafo Jacques Cousteau, foi moderador da sessão dos Diálogos para o Desenvolvimento Sustentável que tratou das ameaças aos oceanos, por ocasião da Rio+20 em junho do ano passado. A falta de um entendimento internacional para proteger os oceanos foi o destaque dos debates.

A presença de um integrante da família Cousteau foi emblemática, 20 anos depois de o próprio Jacques Cousteau ter alertado os integrantes das delegações da Rio 92 sobre a mesma questão.

Entre notícias cada vez mais frequentes a respeito do lixo depositado nos oceanos, o grupo Conservação Oceânica, do qual Philippe Cousteau é membro, divulgou em abril de 2010 um número assustador. Em um único dia, o 19 de setembro de 2009, cerca de meio milhão de voluntários coletaram mais de 10 milhões de fragmentos de lixo nas costas de seis continentes.

A variedade de detritos jogados no mar (e também em rios, lagos e represas) é grande. De pontas de cigarro, fraldas e preservativos a veículos pesados, a afronta é desmedida. O lixo plástico, segundo os oceanógrafos, vai se acumulando nos oceanos e os seus fragmentos se parecem com organismos de plâncton, base da alimentação dos peixes. Ou seja, os peixes estão ingerindo plásticos. Morrem pela boca e, por tabela, nós também.

Das recomendações para a prática

Boas propostas surgiram dos Diálogos da Rio+20. No entanto, sabemos que mudar os hábitos dos poluidores dos oceanos é um desafio e tanto. Por isso, uma ideia inovadora de reciclagem de detritos extraídos do mar merece atenção.

Trata-se do Projeto Maré, Tides of Change, apresentado pelo Coletivo Amor de Madre, o qual se desenvolverá em três anos, até as Olimpíadas de 2016.

Explicando melhor, o Projeto Maré foi inspirado pelo Sea Chair Project, do Studio Swine, de Londres, liderado por Azusa Murakami e Alexander Groves, que estudaram durante dois anos o potencial de uso de plásticos retirados do mar.

Os designers criaram o banco Sea Chair com fragmentos de plásticos vindos do mar. Por acreditarem que o design pode ser agente de mudança sustentável, eles oferecem esse projeto livre de direitos autorais, o que significa que ele pode ser replicado por pessoas de todo o mundo. 

Após esse experimento, e em parceria com o Coletivo Amor de Madre, consolidou-se a proposta do Projeto Maré, Tides of Change. Em Londres, o Maré UK (Reino Unido) será tocado pelo Studio Swine, com apoio do Imperial College. Por aqui, o Coletivo Amor de Madre responderá pelo Maré Brasil.

Cá e lá

O Coletivo Amor de Madre é obra da publicitária e artista plástica Olívia Yassudo Faria que, em 2009, inaugurou uma galeria de objetos em São Paulo. Em seu trabalho, ela busca associar a inteligência do design de produtos à sustentabilidade. 

Com a exposição Maré, Tides of Change, o Projeto Maré Brasil foi primeiramente apresentado na galeria, em São Paulo. Na sequência, ele se estenderá ao Rio de Janeiro, em etapas sucessivas até 2016.

Nesse período, serão realizadas ações de capacitação de pescadores e catadores de lixo na Baía da Guanabara, com o desenvolvimento de produtos junto às empresas de reciclagem. Haverá, ainda, a criação de objetos de design livres de direitos autorais com o plástico marinho e campanhas de educação desdobradas em mutirões de limpeza, palestras, vídeos, exposições e grupos de bate-papo.

A cargo do Studio Swine, o Projeto Maré UK cuidará da construção de uma máquina capaz de derreter o plástico com energia solar. Esse forno, também livre de direitos autorais, poderá ser recriado em outras partes do mundo.

Em 2016, ambas as equipes se encontrarão no Brasil para o lançamento do forno durante as Olimpíadas. A ideia é gerar conteúdo e conhecimento do projeto e das possibilidades de réplicas pelo mundo.

Na Baía de Guanabara, a equipe coletará material para desenvolvimento de objetos de design, seguindo o conceito do estúdio de transformar materiais descartados em objetos atrativos.

* Homenagem a Engel Paschoal (7/11/1945 a 31/3/2010), jornalista e escritor, criador desta coluna.