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Evolução de propósitos

Lucila Cano

29/11/2013 06h00

Em março de 2000, falava-se em quase 16 milhões de portadores de algum tipo de deficiência física, sensorial ou mental no Brasil. Deles, ao menos 9 milhões teriam idade para trabalhar, embora apenas 1 milhão estivesse em atividade. Na época, a lei das cotas já estava em vigor (lei 8.213/91), mas havia muitos empecilhos para o seu cumprimento, assim como ainda há.

Meses depois, o Censo 2000 divulgou o número de 24,5 milhões de deficientes, pois o IBGE passou também a considerar portadoras de deficiência pessoas com alguma ou grande dificuldade de ouvir, enxergar e andar.

No site da Secretaria Nacional da Promoção da Pessoa com Deficiência, um rápido histórico da evolução das pesquisas demográficas no Brasil esclarece: “O Censo 2000 marcou uma transição para uma nova forma de registrar informações sobre a deficiência no país. As perguntas levaram em conta a Classificação Internacional de Funcionalidade [CIF], Deficiência e Saúde da Organização Mundial da Saúde [OMS], com um foco em atividade”.

Retrato da deficiência

Em maio de 2002, a FBB (Fundação Banco do Brasil) anunciou parceria com a FGV (Fundação Getúlio Vargas) para a realização da pesquisa Retratos da Deficiência no Brasil.

O estudo integrou o Programa Diversidade da FBB, o qual foi direcionado para a questão da deficiência no país durante 2002 e 2003, com o objetivo de subsidiar políticas públicas e ações do setor privado para a inclusão social de pessoas deficientes.

Os resultados da pesquisa propiciaram a produção de um livro e bancos de dados e referências sob a responsabilidade do Centro de Políticas Sociais da FGV.

Em relação ao Censo de 2000, a pesquisa estabeleceu dois conceitos de deficiência que aclaram o entendimento do crescente número de deficientes registrados no Brasil. Temos os PPDs (pessoas portadoras de deficiência) e os PPIs (pessoas com percepção de incapacidade).  Entre os PPDs estaria incluída a população idosa que, pela longevidade, foi adquirindo deficiências visuais, sensoriais e de locomoção em diferentes graus.

A partir dessa classificação, e, naturalmente, com descritivo técnico mais minucioso que este breve relato, a pesquisa se aprofundou em questões sociais que afetavam a vida dos deficientes. Miséria ou baixa renda e falta de oportunidade para estudar, trabalhar e ter acesso à saúde e ao convívio social eram algumas delas. Na atualidade, as mesmas questões persistem.

Novas trilhas

Passada uma década, o Censo 2010 continuou na linha de apuração iniciada em 2000 e revelou que 45,6 milhões de pessoas declararam ter algum tipo de deficiência. Esse número corresponde a quase 24% da população total brasileira e assusta, inclusive, em detalhamentos: na faixa etária de 15 anos ou mais, 61,1% dessa população não têm instrução e, se têm, ela resume-se ao fundamental incompleto; quanto ao mercado de trabalho, 53,8% dos deficientes recenseados e em idade ativa não têm ocupação.

O propósito de ampliar o mapeamento das deficiências para melhor subsidiar a implantação de políticas públicas de que tanto carecem as pessoas deficientes é bem-vindo. Trata-se de uma evolução, de uma maneira mais abrangente de se enxergar as necessidades de todos.

Com esses subsídios, então, as soluções deveriam ser aceleradas para atender mais e melhor tantos deficientes no país, o que ainda não ocorre.

Por isso, não posso deixar de concordar com Tereza Costa d’Amaral, superintendente do IBDD (Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência), que, em artigo de setembro de 2012, questionou os números do último Censo. Assim como ela, também entendo que uma pessoa com catarata não deveria ser considerada deficiente.

Mas, em razão do Dia Internacional do Deficiente em 3 de dezembro, torço para que a ampliação do mapa da deficiência estimule a ampliação das políticas públicas e de novas trilhas para a inclusão social justa e digna das pessoas deficientes.

* Homenagem a Engel Paschoal (7/11/1945 a 31/3/2010), jornalista e escritor, criador desta coluna.