Topo

Tempos difíceis

Lucila Cano

28/02/2014 06h00

Coincide com o Carnaval uma época de excessos. Não me refiro aos exageros da folia nas ruas e nos salões. Do jeito que as coisas andam, esses parecem ser os de menor proporção. Falo dos excessos de ignorância que insistem em nos diminuir, em nos tornar menos civilizados neste século 21.

Mal começou o campeonato paulista e o futebol já fez uma vítima, não no estádio, o que seria deplorável, mas na rua, o que é mais deplorável ainda. No domingo (23 de fevereiro) um torcedor do Santos foi espancado por torcedores do São Paulo (segundo denunciaram suas camisas) e morreu no ponto de ônibus. Provavelmente estava a caminho de casa, onde sua mulher e um filho (o único) de cinco meses o aguardavam.

Por que torcedores de um jogo insosso, que acaba em empate, agridem e matam? Que placar os agressores foram desempatar nas ruas? A polícia investiga o caso.

Em outro bairro, um motorista bêbado jogou o seu carro importado contra um bloco carnavalesco. Atingiu muitos e, por enquanto, tem a sorte de não haver nenhuma vítima fatal entre os feridos. O carro ficou bastante danificado. Já a cabeça do indivíduo, não se sabe. Um provérbio diz que “vaso ruim não quebra”. Trinca?

São Paulo serviu de cenário para essas baixezas, mas, como sabemos, elas ocorrem em toda parte e, infelizmente, com muita frequência.

Além fronteiras

Do outro lado do mundo, mais um governante resolveu inibir a homossexualidade por decreto. Desta vez foi o presidente de Uganda. A lei que ele assinou leva à prisão perpétua quem praticar atos homossexuais. Dizem que é a lei mais rigorosa da África, onde a maioria dos países confina homossexuais à ilegalidade.

Por mais que respeitemos as particularidades culturais dos africanos, tais atitudes só agravam a qualidade da vida de povos flagelados pela AIDS. Desde a descoberta do vírus HIV – lá se vão 30 anos – até os dias atuais, laboratórios e instituições humanitárias internacionais enfrentam dificuldades para levar remédios e tratamentos a populações infectadas de determinadas regiões. Dificuldades essas impostas por governos incrédulos, que se recusam a aceitar os avanços da medicina.

Líderes mundiais se manifestam contra a decisão, fazem apelos públicos e sugerem medidas repressivas. Enquanto isso, a vida segue mais empobrecida, com menos comida, menos água e menos assistência a milhões de habitantes do continente africano.

De olho nas crianças

Nos últimos três anos (2011-2013), a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, responsável pelo Disque 100, recebeu 336,2 mil denúncias de violações de direitos de crianças e adolescentes.

O Disque 100 atende também a denúncias de violações de direitos de pessoas idosas, pessoas com deficiência, LGBT, pessoas em situação de rua e outros segmentos vulneráveis, como quilombolas, ciganos, índios e pessoas em privação de liberdade.  A informação é do Portal Brasil, que divulga a campanha da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e do Ministério do Turismo para proteção das crianças e adolescentes contra todos os tipos de violência durante o Carnaval.

A campanha leva o título “Proteja Brasil” e deve cobrir todos os locais de circulação de turistas, principalmente nas grandes cidades. Qualquer excesso contra uma criança deve ser punido. Para isso, o Disque 100 funciona 24 horas por dia, todos os dias. As ligações podem ser feitas de qualquer telefone fixo ou móvel e sem custos. O sigilo é garantido.

Em tempo

Para quem não cai na folia, fica a recomendação de leitura: “Cada homem é uma raça”, de Mia Couto (Companhia das Letras, 2013). Em uma de suas muitas visitas ao Brasil, o autor moçambicano lançou este livro de contos no ano passado. Tomo a liberdade de reproduzir a epígrafe de um deles: “Só um mundo novo nós queremos: o que tenha tudo de novo e nada de mundo”.

*Homenagem a Engel Paschoal (7/11/1945 a 31/3/2010), jornalista e escritor, criador desta coluna.