O desafio de ser menina
Lata d’água na cabeça diversas vezes por dia, todos os dias. Esta é a triste realidade da maioria das meninas que vivem em regiões castigadas por longos períodos de seca no Brasil e em outras partes do mundo.
Ao ir e vir sob o peso da desigualdade social que a falta de água potável e saneamento básico provocam, somam-se outras violências em constante ameaça às meninas. O estudo e a vivência escolar são substituídos pelo trabalho doméstico ou forçado, sem tréguas para as brincadeiras da infância. A vida adulta é antecipada por fantasmas. Corpos e mentes ainda frágeis são alvos de abusos físicos, psicológicos e sexuais, casamentos indesejados e gravidez precoce.
Condições de moradia precárias e parcos recursos financeiros completam o cenário de histórias interrompidas antes mesmo que suas protagonistas deem os primeiros passos em busca de seus sonhos de menina.
A depender de heranças culturais ou religiosas, o sexo feminino não é bem-vindo e, portanto, eliminado em abortos seletivos. Em outras circunstâncias e por crenças inaceitáveis, mulheres adolescentes são vítimas de mutilação genital. Pobreza, injustiça e discriminação perseguem o gênero feminino em todo o mundo. São violências que variam de povo para povo e que confirmam a necessidade urgente de proteção às mulheres desde a infância.
A situação das meninas no mundo
A Plan International, uma ONG criada há mais de 75 anos e presente no Brasil desde 1997, atua em defesa do bem-estar e dos direitos de crianças e adolescentes em 51 países, nos quais o empoderamento de jovens e mulheres é uma de suas principais bandeiras.
Por obra dos incansáveis esforços da Plan, a ONU elegeu o 11 de outubro como o Dia Internacional da Menina. A data começou a ser comemorada em 2012 e, ano a ano, vem conquistando mais atenção. Motivos não faltam e os mais contundentes estão no relatório que a Plan divulga anualmente sobre a situação das meninas no mundo.
Segundo o relatório de 2014, meninas menores de 16 anos são vítimas de 50% de todas as agressões sexuais que ocorrem no mundo, o que corresponde ao número de 150 milhões de garotas. Outro número impressionante refere-se ao casamento forçado de meninas entre 5 e 18 anos de idade: 14 milhões por ano, ou 39 mil por dia, geralmente com homens mais velhos.
É na adolescência que as meninas podem ser mais vulneráveis às piores formas de abuso, como o estupro, tráfico, venda, exploração e escravidão, tornando-se presas fáceis de doenças sexualmente transmissíveis. Por sua vez, a gravidez precoce e de alto risco, em consequência de uniões indesejadas, torna-se uma das principais causas de morte entre meninas de 15 a 19 anos em países em desenvolvimento.
Alarmante ainda é o número de meninas e mulheres submetidas à mutilação genital: 140 milhões em todo o mundo, com estimativa de aumento de 2 milhões a cada ano.
Palavra que não está no dicionário
O empoderamento, palavra que não consta de nossos dicionários, é um neologismo criado para traduzir o termo empowerment e que, em outras palavras, significa “dar a alguém melhor condição para controlar a sua própria vida”.
Amplamente utilizado por instituições de todo o mundo, o termo empoderamento é palavra que expressa o trabalho da Plan em seus programas de combate à desigualdade de gênero e defesa das meninas e mulheres.
No meu entender, pode ser explicado por ações que, somadas, contribuem para a conquista de um mundo melhor para todos: educar, cuidar, orientar e, sobretudo, preparar as meninas para ocupar seus lugares na sociedade, com direito à justiça, respeito e dignidade.
Iniciativas como o Dia Internacional da Menina e campanhas da Plan International merecem aplausos, adesões, doações e muita atenção de todos. Cabe a nós, entretanto, a responsabilidade da vigilância, porque a violência contra a mulher, em especial contra as meninas e adolescentes, está sempre mais próxima do que imaginamos.
*Homenagem a Engel Paschoal (7/11/1945 a 31/3/2010), jornalista e escritor, criador desta coluna.
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