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Um leão a menos

Leão chamado Tommy caminha pelo Parque Nacional Hwange, mesmo local onde o leão Cecil foi morto, no Zimbábue - Tsvangirayi Mukwazhi/AP
Leão chamado Tommy caminha pelo Parque Nacional Hwange, mesmo local onde o leão Cecil foi morto, no Zimbábue Imagem: Tsvangirayi Mukwazhi/AP
Lucila Cano

07/08/2015 06h00

A morte do leão Cecil no Zimbábue provocou comoção e protestos em todo o mundo. Fosse velho, como alegou um guia de caça detido pela polícia local, fosse o que fosse, o bicho nada fez para servir de alvo a uma estratégia perversa.

Atraído para fora do parque em que se mantinha protegido e era atração turística, o leão foi flechado e passou por horas de agonia antes dos tiros que o mataram de vez. Foi submetido a uma sessão de tortura, literalmente.
 
A revolta expressa a perplexidade de todos diante do acúmulo de maldade que ainda predomina entre os homens. De um lado, a ciência caminha rápido na busca de novos planetas e na descoberta de curas para doenças até então sem remédio. De outro lado, a barbárie segue decepando cabeças, de humanos e de animais, para transformá-las em troféus da sua ignorância.
 

Ideias a mais

Pois a morte de Cecil, além de protestos, controvérsias e especulações, também gerou ideias, segundo o noticiário da semana. Sobre elas, duas notícias chamaram minha atenção. A primeira refere-se à empresa norte-americana Delta Airlines que em 3 de agosto divulgou não mais permitir o embarque de troféus de caça em suas aeronaves. Outra ideia é de um fabricante de brinquedos que lançará um leão Cecil de pelúcia com o objetivo de angariar dinheiro para projetos de preservação animal.
 
A notícia sobre a Delta diz que a empresa americana detém o maior número de voos para países da África e que ela segue o caminho de outras empresas aéreas que já haviam se recusado a transportar troféus de caça. Antes tarde do que nunca, embora tenhamos que conviver com uma triste realidade: à exceção das reservas ambientais, a caça ainda é permitida em diversos países africanos.
 
Já a fábrica de brinquedos Ty Inc. me passou uma sensação de faro mercadológico, na qual os americanos são mestres. Mas, pensando bem, e como declarou o próprio presidente da empresa, quando da divulgação, no mesmo dia 3 de agosto, o Cecil de pelúcia pode conquistar a adesão de muitos defensores dos animais. A empresa também se comprometeu a doar os lucros das vendas do brinquedo à mesma instituição que estudava o leão Cecil no Zimbábue, a Unidade de Pesquisa e Conservação Animal da Universidade de Oxford, na Inglaterra. 
 
Assim, com um leão a menos e ideias a mais, porque além dessas é bem provável que surjam outras, os protetores dos animais podem se sentir mais reconfortados. O sacrifício de Cecil não terá sido em vão.
 

E nós com isso

Por aqui não temos leões, mas onças pintadas em sério risco de extinção. Como elas, também estão na mira de caçadores e traficantes de animais outros bichos nativos, como o lobo guará e o cervo do Pantanal, só para citar mamíferos.
 
Caçadores e traficantes não são os únicos depredadores da fauna brasileira. Nossos bichos também são vítimas de atropelamentos em rodovias, do desmatamento, das queimadas, da pesca ilegal, da invasão de áreas de preservação ambiental, do avanço descontrolado de áreas urbanas, da expansão da produção agropecuária, da mineração, da poluição e das mudanças climáticas decorrentes de muitas dessas ações.
 
Em dezembro de 2014, o Ministério do Meio Ambiente divulgou a mais recente e mais completa Lista de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção. O estudo foi realizado pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), órgão ligado ao Ministério, ao longo de cinco anos. Isto, em um universo de 12.256 espécies pesquisadas (incluindo peixes e invertebrados aquáticos).
 
O levantamento anterior foi feito em 2004 apenas com 1.137 espécies, das quais 627 estavam ameaçadas. Desde então, 170 delas saíram da condição de risco de extinção, como a baleia-jubarte e a arara-azul-grande. 
 
No entanto, com a ampliação do estudo, surgiram outras espécies em risco. Hoje, o Brasil possui 1.173 espécies ameaçadas e no aguardo de boas ideias para preservá-las.
 
* Homenagem a Engel Paschoal (7/11/1945 a 31/3/2010), jornalista e escritor, criador desta coluna.