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Mídia - Confecom propõe controle dos meios de comunicação

José Renato Salatiel, Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação

Sem a participação das empresas de mídia e repleta de sugestões polêmicas, a 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) terminou no dia 17 de dezembro de 2009 com a aprovação de propostas como a criação de dispositivos de fiscalização da imprensa, proibição da posse de emissoras de rádio e TV por políticos e o fim do oligopólio dos meios de comunicação no Brasil. Caso sejam acolhidas pelo Poder Executivo, elas podem dar origem a projetos de lei.

Direto ao ponto: Ficha-resumo

O evento em Brasília durou quatro dias e reuniu 2,1 mil pessoas, incluindo 1.684 delegados que representavam segmentos da sociedade civil, empresariado e poder público. A conferência teve um custo de R$ 8,2 milhões para o governo federal.

Ao todo, foram aprovadas 672 propostas de um total de 1,5 mil apresentadas por cidades e Estados. Os projetos foram analisados em grupos de trabalhos e os que não obtiveram aprovação de 80% dos participantes foram rejeitados (menos de 30%) ou votados em plenário.

O principal objetivo das discussões é orientar a elaboração de políticas públicas para o campo da comunicação. Para se tornarem normas efetivas, as propostas precisam ser detalhadas, transformadas em projetos de lei e votadas no Congresso Nacional.
 

Censura

Por discordarem de iniciativas que visam o controle de veículos de comunicação, seis de oito entidades ligadas às empresas do ramo não compareceram ao evento: Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), Associação Nacional de Jornais (ANJ), Associação Nacional dos Editores de Revistas (ANER), Associação de Jornais e Revistas do Interior do Brasil (Adjori) e Associação Brasileira de Internet (Abranet).

De acordo com essas entidades, as propostas que seriam debatidas na conferência feriam a liberdade de expressão e informação e a livre-iniciativa do setor privado. Segundo os críticos, o receio é de que o Brasil adote uma tendência ideológica de intervenção estatal e de censura à imprensa que está se tornando comum América Latina, atualmente colocada em prática na Venezuela, na Bolívia e no Equador.

Participaram do evento a Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil) e a Associação Brasileira de Radiodifusão (Abra), que tem como sócios a TV Bandeirantes e a Rede TV!, além de sindicatos e ONGs.
 

Sensacionalismo

Entre as propostas mais polêmicas aprovadas na Confecom estava a que tratava do "controle social e participação popular" sobre empresas de comunicação. O texto diz: "Garantia de mecanismo de fiscalização, com controle social e participação popular, em todos os processos como: financiamento, acompanhamento das obrigações fiscais e trabalhistas das emissoras, conteúdos de promoções de cidadania, inclusão, igualdade e justiça, cumprimento de percentuais educativos, produções nacionais".

De acordo com isso, sindicatos ou ONGs poderiam ter acesso às contas das empresas e poder de monitorar o conteúdo produzido pelos meios de comunicação no país. A Abra, representando o setor empresarial, votou contra, alegando que o governo já possui meios de fiscalizar os veículos de radiodifusão.

Em editorial, o jornal O Estado de S. Paulo criticou o que considera "recomendações ideologicamente enviesadas que, transformadas em lei, restringiriam a liberdade de informação e criariam obstáculos à ação da iniciativa privada no setor". Para os defensores da proposta, a sugestão garantiria maior participação da sociedade no controle da mídia.

Proposta semelhante prevê "ações punitivas para emissoras de rádio e TV que veiculem conteúdos que desvalorizem, depreciem ou estigmatizem crianças e minorias" como negros, mulheres, idosos, indígenas, gays e deficientes físicos. As medidas atingem programas de TV sensacionalistas, que poderiam sofrer algum tipo de punição. Ambas as propostas tiveram votação apertada, com 51% de votos favoráveis.
 

Liberdade de imprensa

A Confecom também acatou o pedido de criação de conselhos de comunicação e de jornalistas. O Conselho de Comunicação teria atuação em âmbito federal, estadual e municipal; e dentre suas atribuições estaria, por exemplo, a regulação do conteúdo e das políticas de concessões.

Já o Conselho Federal de Jornalistas, segundo os relatores, não almeja servir como instrumento de censura. De acordo com a proposta, ele funcionaria como um órgão corporativo, a exemplo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ou dos conselhos regionais de Medicina e Engenharia, para julgar casos de faltas graves contra a ética do profissional. A intenção é "garantir um jornalismo responsável, democrático e que reflita a pluralidade de opiniões da sociedade brasileira".

No entanto, entidades como a ANJ comparam o projeto com a tentativa frustrada de criar, em 2004, o Conselho Federal de Jornalismo. Na época, a ideia foi rejeitada porque foi entendido que contrariava o princípio de liberdade de imprensa, base para a existência de uma sociedade democrática.

Os delegados também propuseram reabilitar duas leis derrubadas este ano pelo Supremo Tribunal Federal (STF): a Lei de Imprensa e a obrigatoriedade do diploma para exercício da profissão de jornalista. A antiga Lei de Imprensa foi revogada pela Justiça por possuir artigos que, sancionados no período da ditadura militar (1964-1985), eram usados para coibir o trabalho jornalístico. Entidades como a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), por outro lado, entendem que a falta de lei específica prejudica tanto os profissionais quanto os cidadãos, que ficam à mercê de decisões de comarcas baseadas nos códigos Civil e Penal. Os grupos Globo, Folha e O Estado de S. Paulo rejeitam as duas sugestões, por verem nelas restrições aos serviços prestados pela imprensa livre.
 

Monopólio

Outro conjunto de propostas validado pela conferência mira nos conglomerados de mídia do país. Segundo o Projeto Donos da Mídia, 54 redes de rádio e televisão perfazem mais de 25% do total de 9.477 veículos de comunicação. Por isso, a Confecom apresentou regras para refrear a concentração de veículos nas mãos de pequenos grupos.

Hoje, a regulamentação do serviço de radiodifusão no Brasil funciona obedecendo ao sistema de outorgas que são concedidas por meio de licitações apreciadas pelo Congresso e sancionadas pelo presidente da República. A questão é que, muitas vezes, são os próprios senadores e deputados ligados a empresas de comunicação que concedem ou renovam as concessões.

Em 2008, o site Donos da Mídia identificou 271 políticos como sócios ou diretores de 324 veículos de comunicação no país, entre eles, prefeitos, governadores, deputados e senadores. O número, porém, não inclui a posse por meio de parentes ou "laranjas", de modo a burlar o artigo nº 54 da Constituição Federal, que proíbe a prática.

Três decisões consensuais da conferência reforçam a Constituição, proibindo outorga para ocupantes de cargos públicos, impedindo que deputados e senadores votem concessões e renovações de empresas - às quais eles ou seus parentes de até terceiro grau estejam ligados - e que políticos sejam impossibilitados de atuarem como comunicadores em rádios e TVs, durante o mandato.

Em relação às novas mídias, a Confecom ratificou planos de democratização do acesso à internet e melhorias de serviços de banda larga. Todas as sugestões serão encaminhadas aos poderes Legislativo e Executivo.

Direto ao ponto

A 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), encerrada no dia 17 de dezembro de 2009, aprovou 672 propostas, de um total de 1,5 mil apresentadas, com o objetivo de orientar políticas públicas de regulamentação, fiscalização e democratização do setor de comunicação no Brasil. Entidades ligadas a empresas não compareceram ao evento, por acreditarem que as sugestões discutidas contrariam princípios da liberdade de imprensa e informação, bem como a livre-iniciativa do mercado. Participaram representantes de sindicatos, ONGs e poder público. Principais propostas aprovadas:

• Maior controle social e participação popular nos meios de comunicação.

• Criação de conselhos de Comunicação e de Jornalistas para regular o conteúdo de mídia e julgar falta de ética profissional.

• Criação de uma nova Lei de Imprensa e volta da obrigatoriedade do diploma para prática do jornalismo.

• Implementação de medidas que coíbam oligopólios.

• Proibição de que políticos sejam donos de rádios e TVs, atuem como comunicadores e votem em outorgas para empresas às quais estão ligados.

• Incentivo a políticas de acesso à internet e disseminação de serviço de banda larga no país. Todas as propostas aprovadas serão encaminhadas ao Congresso e à Presidência da República, onde podem virar projeto de lei.

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