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Senso numérico (2) - História da matemática

Roberto Perides Moisés e Luciano Castro Lima, Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação

Na pré-história, a relação do ser humano com as quantidades da natureza não se estabelecia de modo racional, por meio de uma abstração, mas a uma espécie de sentido qualitativo. Esse sentido refere-se simplesmente à capacidades de distinção entre o muito e pouco, e o pequeno e o grande, por exemplo.

A isso, o historiador matemático Tobias Dantzig chamou de senso numérico:

"O homem, mesmo nas mais baixas etapas de seu desenvolvimento, possui a faculdade que, por falta de um nome melhor, chamarei de senso numérico. Essa faculdade permite-lhe reconhecer que alguma coisa mudou numa pequena coleção quando, sem seu conhecimento direto, um objeto foi retirado ou adicionado à coleção.

O senso numérico não deve ser confundido com contagem que, provavelmente, é muito posterior, e que envolve, como veremos, um processo mental bastante intrincado. A contagem, pelo que sabemos, é um atributo exclusivamente humano, apesar de algumas espécies irracionais parecem possuir um senso numérico semelhante ao nosso."

Esse mesmo autor ilustra o "senso numérico" com a breve fábula que segue:

"Certa feita um urubu fez um ninho na torre da capela de uma fazenda. O fazendeiro resolveu matá-lo. Mas toda vez que entrava na torre, o urubu voava até uma árvore distante e de lá, com a sua vista de grande alcance, esperava até o homem sair da torre, quando voltava para o ninho.

O fazendeiro resolveu, então, entrar com um empregado, permanecendo lá dentro e mandando o empregado sair. O urubu, porém, não se deixou enganar: ficou na árvore e só voltou quando o fazendeiro saiu da torre. O homem não desistiu e entrou com dois empregados na torre, ficando lá novamente, enquanto os dois saíam.

Ainda não foi dessa vez que o urubu caiu na armadilha, esperando a saída do fazendeiro. E assim, repetidamente, o patrão tentou a manobra com três, quatro empregados sem conseguir nada.

Só quando entrou com cinco, o urubu voltou ao ninho, ao ver sair o quarto empregado. O seu 'senso numérico' só ia até quatro, e, por não saber contar mais que isso, acabou caindo na armadilha."

A ideia de número

Enquanto vivia da simples coleta, o homem pré-histórico foi apreendendo alguns movimentos da natureza. As condições mais favoráveis à sua permanência em determinado local imprimiam ao mesmo tempo uma dificuldade da manutenção da vida errante.

Se o número de elementos da tribo aumentava consideravelmente, por outro lado, ele desenvolvia uma melhor observação dos movimentos da natureza, como os fenômenos cíclicos (dia, noite, fases da lua, etc.). Isso lhe permitia a elaboração de uma ação intencional no sentido de favorecer sua fixação em determinados lugares.

Os passos do controle sobre o abastecimento de sua alimentação foram gradativos e cumulativos. O homem plantou, cultivou, aperfeiçoou, pela seleção, o que poderia ser ou não comestível. Colocou sob sua dependência as espécies de animais domesticáveis. Criou, assim, a agricultura e pecuária.

Registro e controle

Como produtor, o homem organizou-se socialmente em comunidades primitivas. A agricultura e pecuária substituíram a coleta e a caça, passando a ser as atividades que mais ocupavam os homens e, portanto, as que mais criavam problemas. Para superá-los, o homem foi criando instrumentos e uma complexa rede de ideias. Estas passaram a fazer parte de sua forma de compreender o mundo e de sua própria humanidade.

Entre essas ideias todas, a ideia de número exerce um papel especial, tanto para a compreensão da natureza, quanto do próprio homem. É como produtor que o homem se defronta com a sua primeira necessidade de uma matemática: a necessidade do registro e do controle do movimento das variações quantitativas, ou seja, das quantidades das coisas.

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