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Universidade de Harvard tem "Semana do Sexo" com palestras, debates e sorteios de vibradores

Douglas Quenqua

Do The New York Times, em Cambridge, Massachusetts (EUA)

18/04/2012 06h00

Para uma mesa armada por um grupo estudantil do campus, esta continha alguns itens incomuns: um espéculo ginecológico, diafragmas, preservativos (para ele e para ela) e vários pacotinhos de lubrificante. Perto dali, dois estudantes rebatiam um para o outro uma camisinha inflada como se fosse um balão.

“Este é o Implanon”, disse Gabby Bryant, uma veterana de 22 anos que ajudou a montar a mesa, exibindo uma amostra do contraceptivo implantável. “Aqui em Harvard, você o recebe de graça.”

“Implanon?” disse Samantha Meier, outra veterana, que estava vendo os itens na mesa. “Não acredito.”

“Minha amiga conseguiu de graça”, disse Bryant, resolvendo o assunto.

Era a Semana do Sexo em Harvard, um programa dirigido pelos estudantes com palestras, painéis de discussão e conversas de fazer corar, sobretudo envolvendo sexo. O evento foi o primeiro de Harvard, apesar da tradição ter começado em Yale em 2002 e desde então se espalhado por universidades de todo o país: Brown, Universidade do Nordeste, Universidade de Kentucky, Universidade de Indiana e Universidade de Washington, todas realizaram alguma versão da Semana do Sexo nos últimos anos.

Apesar do agitado debate nacional sobre contracepção e financiamento para saúde reprodutiva, a Semana do Sexo em Harvard (e em outros lugares) se desviou da política, despontando como uma resposta à preocupação entre os estudantes de que as lições em sala de aula sobre sexualidade –seja no colégio ou além– não os preparam para a experiência em si.

Os organizadores desses eventos dizem que os estudantes universitários de hoje enfrentam uma realidade confusa: em um momento em que a sexualidade está mais descarada e ostensivamente em exposição, os jovens estão, paradoxalmente, praticando menos sexo do que em gerações anteriores, indicam as pesquisas.

“Eu acho que há esta cultura de ‘ficar’ em Harvard, onde as pessoas presumem que todo mundo está fazendo sexo o tempo todo, o que não é necessariamente verdade”, disse Suzanna Bobadilla, uma caloura de 21 anos.

Os estudantes aqui parecem menos interessados em debater a agenda social dos republicanos e mais em falar sobre como os costumes sexuais estão ligados às suas próprias vidas. Um evento: “Ficando no Campus”, fez os participantes falarem sobre as percepções criadas em torno do sexo casual –por exemplo, a ideia de que todas as mulheres são tão liberadas que ficam felizes em praticar sexo sem compromisso (um tema examinado a fundo na nova série da HBO, “Girls”).

O evento ajudou a eliminar esse rumor, disse Bobadilla, ao apresentar estatísticas mostrando que os estudantes universitários estavam praticando menos sexo do que seus antecessores, e ao “permitir às pessoas expressarem seus próprios pontos de vista”.

Essa educação sexual falada de modo franco é particularmente importante em uma escola como Harvard, ela disse, “porque os jovens de Harvard não querem admitir que não sabem algo que sentem que deveriam saber”.

À medida que a Semana do Sexo se espalha por mais campi, ela mantém um equilíbrio entre assuntos de saúde e prazer sexual. Diferente dos programas universitários típicos dirigidos pelos estudantes nas décadas que antecederam a descoberta do HIV/Aids, os eventos de campus vão além de instrução sobre sexo seguro, prevenção de estupro e doenças sexualmente transmissíveis, dando orientação sobre como se sentir mais à vontade e satisfeito sexualmente, tudo, pelo menos na teoria, em uma atmosfera livre de julgamento que abraça todos os estilos de vida.

A ideia é promover uma educação sexual que as escolas não podem –ou optam por não dar.

“Eu acho que o que nossa geração está fazendo é realmente tentar tratar dessas questões de uma forma que respeite as experiências, crenças e identidades individuais”, disse Meier, 23 anos, uma das organizadoras da Semana do Sexo de Harvard. “E eu vejo a Semana do Sexo como parte disso.”

A Semana do Sexo nasceu em Yale como a Semana do Sexo Kosher, uma ideia que o Yale Hillel teve para gerar interesse no grupo. Mas à medida que mais clubes e docentes passaram a se envolver, “um membro do corpo docente apresentou a ideia, por que tinha ser um evento judeu?” disse Eric Rubenstein, um dos fundadores. Então foi tomada a decisão de abandonar o ângulo kosher, dando nascimento em 2002 ao que passou então a se chamar Semana do Sexo de Todo Campus.

“Todos os envolvidos queriam que fosse algo real, desafiador e com o qual as pessoas pudessem se relacionar, algo que as pessoas tivessem que considerar”, disse Rubenstein, 29 anos, que atualmente trabalha como trader e estrategista de petróleo para o Citigroup. “Não se resumia apenas a falar sobre os assuntos regulares.”

A educação sexual sempre fez parte da universidade, de um jeito ou de outro. E toda geração de estudantes tenta preencher as lacunas percebidas no currículo formal com suas próprias iniciativas, seja pela distribuição de preservativos nos anos 90 ou a explosão de colunas estudantis sobre sexo –e até mesmo revistas pornográficas– na última década. Os estudantes chamam isso de educação; pais e administradores podem chamar de atuação.

Na primeira Semana do Sexo de Harvard, que terminou em 31 de março, havia painéis sobre conversar sobre sexo com seu médico e carreiras em saúde sexual, mas também eventos sobre ética da pornografia; sexo e religião; práticas excêntricas como bondage; e sexo gay e lésbico. Após todo evento, os organizadores sorteavam vibradores.

Apesar da participação de alguns professores, capelães e provedores de saúde, a universidade em si não foi patrocinadora. Em Yale, o nome foi mudado neste ano de Semana do Sexo em Yale para simplesmente Semana do Sexo, por pressão da administração.

As semanas do sexo enfrentam alguma oposição das universidades, ex-alunos e estudantes em quase toda parte onde são realizadas. Algumas pessoas não gostam da ideia de recursos da universidade sendo usados para promover atividade sexual. Outros acham que os eventos promovem uma abordagem irresponsável ao sexo, que coloca o prazer em primeiro lugar.

Neste ano, um novo grupo chamado Estudantes por uma Yale Melhor começou a oferecer uma alternativa à Semana do Sexo chamada Semana do Amor Verdadeiro. Em 2007, Chelsea Thompson, um estudante da Universidade do Nordeste que se descreveu como cristã, formou um grupo chamado Mulheres de Valor, que promoveu uma noite em um spa para dar às estudantes do sexo feminino uma alternativa à Semana do Sexo. Segundo o blog do grupo, mais de 100 mulheres participaram, incluindo o time inteiro de softball.

“Educação não significa dar a todo mundo todas as opções que possam ter”, disse Isabel Marin, uma integrante dos Estudantes por uma Yale Melhor. “Significa dar às pessoas a informação certa sobre como devem encarar os relacionamentos e as opções sexuais. Não é um bufê.”

Mas os organizadores no campus dizem que estão apenas tentando reconhecer a realidade: a de que muitos estudantes fazem sexo pela primeira vez quando estão na faculdade e que isso pode causar muitos sentimentos e reações fortes.

“As aulas sobre sexualidade na faculdade são quase sempre bastante acadêmicas, elas não necessariamente refletem a experiência pessoal das pessoas”, disse Aida Manduley, presidente da Semana do Sexo da Brown. “Nós tentamos equilibrar a situação.”

Em uma era onde materiais sexuais explícitos estão prontamente disponíveis a um apertar de botão de teclado ou controle remoto, alguns estudantes consideram os procedimentos da semana em Harvard surpreendentemente brandos. Brenda Serpas, uma caloura, frequentou um seminário chamado “Conversa Suja” e o considerou, bem, não tão sujo.

“Muita gente achava que daria dicas sobre como falar de modo sujo”, ela disse, “mas não se tratava de nada disso. Era como ser consensual e ficar à vontade se expressando com seu parceiro”.

Shana Kim, uma estudante do segundo ano, acrescentou: “Que você não precisa ter vergonha. Fique à vontade consigo mesma”.

“E acho que é sobre isso que se trata a semana toda, basicamente”, acrescentou Kim. “Saber o que quer, saber como consentir ao que quer e permitir aos outros que façam o mesmo.”