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Com adesão parcial à greve de professores, UFRJ sofre com problemas de infraestrutura

Material está espalhado pelo corredor da Faculdade de Farmácia da UFRJ - Ricardo Cassiano/UOL
Material está espalhado pelo corredor da Faculdade de Farmácia da UFRJ Imagem: Ricardo Cassiano/UOL

Felipe Martins

Do UOL, no Rio

18/06/2012 06h00Atualizada em 18/06/2012 12h00

“Decepcionada”. Assim a estudante amazonense Larissa Ramos, 23, definiu seu sentimento ao chegar à maior universidade federal do país, a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).  Insatisfeita com as condições estruturais, ela é um retrato dos muitos estudantes ouvidos pela reportagem do UOL Educação na manhã do dia 14 de junho no campus da Cidade Universitária, na Ilha do Fundão. 

A adesão à greve nacional de professores é mais fortemente notada nos cursos de humanas da UFRJ. A Faculdade de Letras está vazia, com poucos alunos e professores nas salas e corredores. O mesmo acontece na Escola de Belas Artes. Na área de biomédica, odontologia teve grande adesão. O mesmo não aconteceu até agora com microbiologia e farmácia. Em outras áreas, a adesão é menor.

Trocou Ufam por UFRJ

Larissa cursava Microbiologia na Ufam (Universidade Federal do Amazonas). Decidiu pedir transferência para a UFRJ esperando encontrar uma universidade com maior amparo ao ensino. Apesar de reconhecer a qualidade dos professores da UFRJ, não esperava assistir às aulas no subsolo do prédio do CCS (Centro de Ciências da Saúde). “Não tem circulação de ar nos corredores das salas, infiltrações, forte cheiro de mofo, na sala corre um líquido amarelado, a aula tem de parar toda a vez que alguém dá descarga no andar de cima. Não tem condições de ter aula aqui. Foi uma frustração, uma surpresa muito desagradável”, relatou.

Bastou subir às escadas para o segundo andar do CCS e encontrar mais um retrato dos problemas estruturais. Em dezembro do ano passado, um incêndio destruiu o centro acadêmico da escola de enfermagem. Entretanto, passados seis meses, a área continua isolada, sem qualquer obra de reparo. “Disseram que foi um problema elétrico, mas até agora ninguém resolveu nada. Continua tudo isolado, na verdade abandonado, ninguém entra aqui pra mexer”, disse a estudante Fernanda Silveira, 22 anos.

Na caminhada pelo CCS, entulhos e material para obras ficam estocados nos corredores, em área próxima aos laboratórios da unidade.  Os alunos reconhecem a qualidade dos equipamentos, mas reclamam que não há aparelhos para todos os alunos. “Os aparelhos dos laboratórios são bons, mas a gente tem de dividir com o colega do lado. O aprendizado sem dúvida seria muito melhor se cada aluno pudesse acompanhar toda a aula sem precisar ficar revezando com o colega do lado”, disse a estudante de farmácia Fabiana da Silva.

Faculdade de medicina

Atravessando para o outro lado da rua, mais um retrato dos problemas da UFRJ, cartazes afixados na entrada do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho avisam que a emergência da unidade de saúde está em greve. Na quinta-feira (14), 35 professores da Faculdade de Medicina decidiram se juntar à greve nacional.

“O hospital vem sofrendo um deterioramento progressivo de sua infraestrutura que hoje se manifesta em questões mais agudas. Os elevadores quebrados, os docentes esperam quase uma hora na fila para chegar aos andares mais altos. Faltam professores. Os docentes foram se aposentando e não houve concurso público para novas contratações. Faltam leitos. Os alunos e professores disputam pacientes porque hoje só existe um pouco mais de 100 leitos no hospital. Há um processo crônico de descaso na UFRJ”, disse a diretora da Adufrj (Associação de Docentes da UFRJ) e professora do departamento de medicina preventiva da Faculdade de Medicina da UFRJ, Fátima Siliansky.

Administração central

Os problemas se espalham pelos prédios da UFRJ e nem mesmo o da administração central escapa.  Quem entra no prédio da reitoria encontra de cara dois elevadores quebrados.  No mesmo bloco funciona a EBA (Escola de Belas Artes) da UFRJ.  Os estudantes dizem que há uma série de problemas. Falta de limpeza, falta de laboratórios, falta até de armários são os problemas relatados pelos alunos.

“Na nossa sala de plástica, todo mundo começou a ter rinite por causa da poeira. Uma professora chegou a parar de dar aula porque começou a ter problemas respiratórios. Agora, com a greve, entrou uma equipe nova de limpeza e as coisas começaram a melhorar. Mas a gente continua sem laboratórios, nosso professor de pintura já nos avisou que vai ter de levar a gente para um ateliê de um amigo porque aqui não tem condições”, disse a estudante do curso de conservação e restauração, Thaís Costa, 19.

Um problema que parece de fácil solução vem causando grande tormento aos estudantes da EBA. A falta de armários para todos os alunos do curso de belas artes leva a uma situação surreal. Os estudantes trancam os armários com enormes cadeados e correntes para impedir que os colegas tentem o arrombamento.  Vários dos armários têm sinais de arrombamento. “Já arrombaram o meu, deixaram as minhas coisas espalhadas no chão. Tudo muito desrespeitoso”, disse a estudante que se identificou apenas como Roberta.

Reuni

Segundo o presidente da Adufrj, Mauro Iasi, os problemas na EBA são reflexos da má implementação do Reuni, programa de expansão do ensino superior, na UFRJ. “A Escola de Belas Artes foi a primeira faculdade da UFRJ a aderir ao Reuni. Ainda no Governo Lula, foi prometida a construção de um anexo, para que a faculdade ganhasse seu próprio espaço, deixando o prédio da reitoria, onde está há 30 anos improvisadamente. A obra não foi entregue passados cinco anos”, contou. A reitoria nega que os problemas estejam vinculados ao Reuni.

Um andar inteiro de salas de aulas foi isolado na EBA devido às infiltrações. Salas de aula, cujo espaço físico foi “criado” no último ano. Em um espaço onde antes existia apenas um amplo corredor, divisórias foram colocadas para classes de pintura. Entretanto, segundo os alunos, aulas práticas eram ministradas sem nenhuma estrutura. “Eu tinha aula prática de pintura naquelas salas. Como não tem pia para lavar os objetos, a gente tinha que ficar subindo e descendo o tempo todo”, disse Roberta. De acordo com os alunos, o local acabou interditado após queda consecutiva de rebocos. As infiltrações são perceptíveis e até estalactites se formaram devido o acúmulo de água no teto.

“A Escola de Belas Artes é um grande exemplo de como o Reuni foi implementado na UFRJ. O problema não é só lá. Na Faculdade de Serviço Social, onde eu dou aula, aconteceu a mesma coisa. Uma grande sala foi dividida em sete salas de 2m² para servir como salas de professores. Eu divido com mais três professores esse pequeno espaço”, disse o presidente da Adufrj, Mauro Iasi.

Adesão parcial na UFRJ

Enquanto a greve está forte na área de humanas, em outras áreas adesão é menor. Nos cursos de engenharia, a greve ainda não chegou. O mesmo acontece no curso de Química. “Na área de exatas, nem parece que está tendo greve. Os professores não aderem à greve porque sabem que se pararem vão perder o dinheiro da bolsa do CNPq para pesquisa”, disse Camila, 21 anos, estudante de Química.

As palavras da estudante são confirmadas pela Adufrj. Segundo a direção, os professores optam por não parar por receberem bolsas de empresas públicas ou privadas que tem parcerias com as faculdades. “O maior foco de resistência é no CT (Centro de Tecnologia). Os professores recebem verbas para projetos, convênios e têm cursos de pós-graduação pagos por empresas. São meios de complementação do salário, mas acaba sendo uma solução individual”, disse o presidente da Adufrj, Mauro Iasi. “Mas é importante deixar claro que nós não somos contra esses professores. Quando o movimento dos docentes atingir os objetivos, eles também serão beneficiados”, concluiu.

Apesar da maior ou menor adesão dependendo do curso, todos os alunos da UFRJ sofrerão a consequência da medida do CAG (Conselho de Ensino da Graduação). Devido à greve de docentes e funcionários técnico-administrativos os atos acadêmicos estão suspensos e os professores impedidos de lançar as notas dos estudantes. 

Outro lado

Procurado pela reportagem do UOL, o reitor da UFRJ Carlos Levi negou qualquer relação entre os problemas na UFRJ e o Reuni. “Os problema citados não têm relação alguma com o Reuni, programa que trata da expansão e que tem conseguido mudar um passivo de problemas acumulados após vários anos. Ainda precisamos enfrentar algumas dificuldades para colocar todos os espaços e instalações da universidade em condições adequadas, pois as universidades federais, de um modo geral, passaram por um longo processo de degradação que, só a partir de 2003, começou a mudar, dando condições a uma recuperação que visualizamos agora”, afirmou o reitor.

Ainda sobre os problemas levantados pela reportagem, a reitoria da UFRJ informa que já está providenciando os reparos necessários nas unidades acadêmicas. Sobre os elevadores, a universidade alega que o processo, em geral, é demorado, visto que os prazos de execução habituais para troca de peças costumam ser longos. Em relação ao hospital universitário, a nota da UFRJ afirma que, dos oito elevadores, quatro estão passando por obras de modernização. “Hoje, quatro elevadores estão em funcionamento, sendo dois, exclusivamente, para transporte de pacientes; um para cargas; e um para o público em geral”, conclui a nota.