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Alunos sul-coreanos estudam mais de 14 horas por dia; leia relato de professor

Leandro Moraes/UOL
Imagem: Leandro Moraes/UOL

John M. Rodgers

Para o International Herald Tribune, em Moultonborough (EUA)

18/10/2012 06h00

"Yeolsimhi haeyo", dizem os coreanos. Trabalho duro. A frase é dita sem parar e serve tanto de lema quanto para lembrar que ninguém gosta de quem resmunga. E não importa o quão duro um aluno esteja estudando, ele sempre pode estudar mais –pelo menos essa é a teoria.

Afinal, a própria nação foi construída após décadas de colonização japonesa e da guerra coreana por meio de trabalho duro. A Coreia do Sul tornou-se modelo de crescimento econômico e sediou os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo, um feito batizado de “milagre do rio Han”.

Toda manhã, por bem mais de 200 dias por ano, os alunos chegavam à escola de elite sul-coreana onde eu ensinava inglês às 7h40. Os professores e tutores estudantis os esperavam na entrada, para verificar seus cabelos (comprimento e estilo – permanente e tintura eram proibidos) e uniforme (camisetas para dentro, saia na altura do joelho e sapatos formais).

Depois, eles subiam as escadas para suas salas, onde esfregavam o chão, escovavam as mesas, limpavam as janelas e jogavam o lixo fora. A jornada acadêmica começava às 8h, tinha intervalos de 10 minutos, uma pausa para o almoço de 50 minutos e uma hora para o jantar às 17h.

Às 18h, quando eu costumava desligar meu computador, os alunos estavam se acomodando em suas cadeiras para outras quatro horas de estudo, durante as quais eram monitorados pelos professores para garantir que não se entregassem ao sono, às conversas ou a qualquer outra coisa que não fosse o estudo. Às 22h20, as salas se esvaziavam. Liberados, os jovens se dirigiam para os ônibus que estavam esperando para levarem-nos para casa (poucos moravam perto). A maior parte dos alunos só ia para a cama depois da meia noite. Há um ditado que recomenda que o estudante tenha apenas quatro horas de sono por dia se quiser entrar em uma das principais universidades.

Durante os anos que eu ensinei nesta escola de ensino médio, fiquei ao mesmo tempo maravilhado e horrorizado com o que a escola, os pais e o país esperavam de seus alunos –e como estes tentavam cumprir essas expectativas.

Algumas vezes, quando eu saía tarde da escola –por volta de 20h ou 21h– eu olhava para as salas e via os alunos ocupados fazendo dever ou consultando livros. Alguns ficavam em pé no fundo da sala para afastar o sono, todos aparentemente determinados em cumprir as expectativas colocadas sobre eles. Mas e seus tempos de juventude? –eu me perguntava, algumas vezes, ao descer o morro com as luzes da escola atrás de mim.

Ao retornar aos EUA, um antigo professor me deu uma oportunidade de falar aos seus calouros de filosofia sobre meus anos na Ásia. Animado, eu redigi uma apresentação pensando nas minhas aulas na Coreia, onde os alunos absorviam o material, algumas vezes silenciosos demais.

Diante de uma classe de 20 calouros universitários, a primeira coisa que eu observei foram os aparelhos eletrônicos em quase todas as carteiras: celulares, laptops, iPads. Mal eu tinha começado, vi um garoto mexendo em seu telefone por baixo da carteira, outro digitando em seu computador e um terceiro digitando no telefone à vista de todos. “Vocês poderiam parar?”, perguntei. Com um olhar incomodado, eles retornaram sua atenção à discussão, mas não por muito tempo –alguns minutos depois, já estavam distraídos novamente. As classes subsequentes foram similares.

Mais tarde, no escritório do professor, eu perguntei sobre o comportamento geral dos alunos, e mencionei os coreanos.

“Quando eu me aposentar, vou escrever um livro sobre o colapso da universidade americana”, ele me disse. “Há pouca sede de aprendizado, de trabalhar duro”.

“E os aparelhos eletrônicos?”, perguntei.

“Estão em toda parte”, respondeu, “mesmo quando são proibidos, os jovens acabam usando”.

Uma avaliação desesperadora, com certeza, mas o professor, que vem ensinando há 30 anos, chegou a dizer que eu estava ali para cinco alunos, mais ou menos. Esses –os que fazem perguntas, expressam interesse- vão realizar grandes coisas, porque eles “se levam a sério, e também levam o professor a sério”, disse.

Terminei minha apresentação, atravessei em silêncio o campus de New England, respirando o ar fresco do outono, pensando que, do outro lado do oceano, seria por volta de 9h da manhã, os alunos estariam sentados em suas carteiras ouvindo atentamente, trabalhando duro e, provavelmente, levando as coisas um pouco mais a sério do que muitos jovens nos EUA, para o bem ou para o mal.

(John M. Rodgers é professor adjunto na Universidade Estadual de Plymouth em New Hampshire, editor do “The Three Wise Monkeys” e do “Groove Korea”.)