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Alunos de SP processam Uniesp por contrato obrigatório com o Fies

Marcelle Souza

Do UOL, em São Paulo

08/04/2014 17h15

Um grupo de dez alunos do curso de comércio exterior está processando o Grupo Educacional Uniesp (União das Instituições Educacionais do Estado de São Paulo) por propaganda enganosa. Os alunos dizem que foram atraídos pelo programa “Uniesp Paga”, sem saber que teriam que fazer um contrato do Fies (financiamento estudantil) para garantir a vaga.

Eles dizem que, por se recusarem a assinar o financiamento, tiveram problemas de acesso a notas e chegaram a ser impedidos de fazer provas.

“Eu, assim como grande parte da minha turma, fui atraída pela propaganda de que estudaríamos sem nenhum custo e que, em troca, a nossa obrigação seria ter frequência e uma boa média”, diz Káthya Esteves, 32. “Fizemos uma prova, entregamos a solicitação para participar do programa e em nenhum momento foi dito que teríamos que fazer um contrato pelo Fies”, afirma.

As aulas começaram no início de 2012 e, segundo os alunos, a exigência do contrato de financiamento só foi feita no segundo semestre daquele ano. “Quando isso apareceu, a gente se recusou a assinar o contrato e fomos informados de que, sem o Fies, oficialmente não seríamos alunos da faculdade”, disse Káthya, representante da turma. 

Os alunos não queriam firmar o contrato do Fies com os bancos (Banco do Brasil ou Caixa) porque o documento é assinado apenas pelo estudante e não há menção de que a dívida seria quitada pela Uniesp – as instituições de ensino não participam oficialmente do financiamento.

Procon alerta

“O estudante precisa desconfiar de qualquer propaganda que diz que ele vai estudar de graça. No caso da Uniesp, a maior parte das reclamações está vinculada à contração do Fies, e o aluno não sabe como isso funciona”, afirma Marta Aur, assessora técnica do Procon-SP.

“Um financiamento é uma dívida de longo prazo e quem paga é o aluno, a não ser que esteja tudo muito bem documentado”, alerta.

No ano letivo de 2014, a mensalidade do curso de comércio exterior, que tem quatro semestres de duração, é de R$ 1.253,65 na unidade Centro Velho da Uniesp, em São Paulo. Ou seja, a dívida do aluno ao final do curso é de mais de R$ 30 mil (sem contar os juros, apenas o valor das mensalidades).

Reclamações

“Quando você chega para fazer a matrícula, é empurrado para o programa Uniesp Paga, e a universidade impõe uma série de requisitos, como serviços comunitários, bom desempenho escolar e o contrato do Fies”, afirma o advogado André Costa e Silva, que defende o grupo.

Em 2013, a turma conseguiu uma liminar (decisão provisória) na Justiça para conseguir assistir às aulas e fazer as provas como alunos da instituição. “Nenhum aluno conseguia acesso ao sistema de notas e alguns estavam sem o bilhete único de estudante. Faltavam professores e tínhamos que brigar para ter qualquer informação”, diz Kátya.

Antes de parar na Justiça, a turma afirma que procurou o Procon-SP e tentou, sem sucesso, fazer um acordo com a Uniesp. Segundo um ranking divulgado pelo órgão no fim do ano passado, o grupo não é o único a ter problemas com a instituição: a Uniesp foi a universidade mais reclamada do Estado naquele ano.

Segundo o Procon, foram 290 queixas contra a instituição –70% solucionadas. O órgão diz que a maior parte das reclamações eram relacionadas à oferta de curso de ensino superior gratuito (como o programa “Uniesp Paga”) e à contratação obrigatória do Fies para liberação do acesso às aulas e provas.

Nos últimos doze meses, o site ReclameAqui recebeu 443 reclamações contra a Uniesp. Em uma escala de zero a dez, a nota dos consumidores foi de 2,67. Apenas 21% dos reclamantes voltariam a fazer negócio com a instituição.

No início deste ano, a turma se formou, mas no dia da colação dois alunos que fazem parte do processo não constavam na lista dos que estavam aptos. No dia seguinte, dizem os estudantes, eles conseguiram o documento porque foram até a instituição acompanhados do advogado.

Irregularidades

O MEC instaurou em julho de 2012 um procedimento para apurar denúncias de irregularidades nos processos seletivos das instituições vinculadas ao grupo Uniesp. No ano passado, a Uniesp sofreu uma série de sanções do MEC, que ficou impedida de solicitar abertura de cursos, fazer fusões e aquisições e realizar novos contratos do Fies.

A Uniesp está presente em 82 municípios, sendo 59 no Estado de São Paulo, duas unidades no Rio de Janeiro, uma em Tocantins, três em Minas Gerais, duas na Bahia, nove no Paraná, duas em Santa Catarina, cinco em Mato Grosso do Sul e uma na Paraíba.

A reportagem questionou a Uniesp sobre quantos alunos o grupo possui, quantos fizeram contrato com o Fies, quantos fazem parte do programa Uniesp Paga e qual é o perfil dos alunos, já que as mensalidades custam mais de R$ 1.000. Além disso, o grupo foi questionado sobre quais são as garantias que o aluno possui de que a Uniesp vai pagar o financiamento do Fies e por que oficialmente o grupo não existe, já que as instituições de ensino possuem mantenedoras diferentes. A Uniesp não respondeu às perguntas e não comentou o caso dos alunos que processam a instituição.

Em nota, a Uniesp afirmou que as questões levantadas pela reportagem fazem parte de um termo que será formalizado oficialmente nesta quarta-feira (9), em Brasília, com representantes da Procuradoria da República, do MEC, do FNDE e da Uniesp e que seus termos, a pedido do Ministério Público, não podem ser divulgados antes de serem assinados.