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Na guerra entre gestores e sindicatos, quem sofre são professores e alunos

Carlos Eduardo Sanches, pesquisador e especialista em financiamento da educação - Reprodução
Carlos Eduardo Sanches, pesquisador e especialista em financiamento da educação Imagem: Reprodução

Cristiane Capuchinho

Do UOL, em Florianópolis*

03/06/2014 05h34

Alunos e professores saem machucados de disputas entre movimentos sindicais e gestores, considera Carlos Eduardo Sanches, pesquisador do tema e consultor.

Para ele, os debates têm sido feitos sobre uma estrutura de carreira que precisa ser remodelada. Enquanto isso não acontecer, a guerra entre instituições vai manter professor desvalorizado -- e alunos da rede pública sem 200 dias letivos e 800 horas-aula por ano.

Apesar da Lei do Piso, que institui que o salário do professor no Brasil deve ser superior a R$ 1.697, ter sido aprovada em 2008, em todo o país é possível encontrar redes municipais e estaduais que não pagam essa quantia.

Segundo Sanches, a principal dificuldade dos municípios de adotar a lei do piso é sua estrutura de carreira antiga e com uma lógica maléfica.

Paus e pedras

"Os planos consideram o salário-base e em cima disso há gratificações, vantagens pessoais e abonos. Essa política foi construída em uma época em que o salário base era bem mais baixo. Com o aumento de 78% do salário-base, como você mantém todos esses penduricalhos, essas gratificações? Não cabe." O problema para o professor, alerta, é que a aposentadoria dele será calculada sobre o vencimento do salário-base.

"Movimento sindical e gestores estão debatendo sobre a estrutura antiga. Daí vem movimento sindical, de um lado, com paus e pedras na mão, os gestores também com paus e pedras, e quem sai machucado é o professor. É preciso superar esse modelo", afirma.

Para viabilizar melhores salários e valorizar a carreira do professor, sua sugestão é que sejam retiradas as gratificações e seja fortalecido o salário-base. O objetivo é que o professor tenha salário melhor, contínuo e com evolução ao longo de seu tempo de magistério. "A partir do momento que focamos no salário-base, sem penduricalhos, estamos falando: 'olha professor, lá na frente, na aposentadoria, você vai ser recompensado'. Isso é valorizá-lo", considera.

Professor tem que ter compromisso e comprometimento

Sanches lembra que, no entanto, a reestruturação do plano de carreira pode não representar ganho imediato para o professor --o que incomoda alguns movimentos sindicais--, pois os gestores precisam fechar uma proposta que caiba no orçamento ao longo da trajetória dos docentes. Dessa forma, os professores podem não ter ganho hoje, mas têm a garantia de que receberão 12 salários, 13° e férias, afirma.

O tratamento profissional que deve ser dado ao professor, por parte das redes, também deve ser usado com os alunos. Esse compromisso é o primeiro passo para que o professor retome o reconhecimento social perdido, acredita.

"Professor tem que ter compromisso e comprometimento. Magistério precisa de missão e vocação sim, mas é profissão e precisa ser profissional. O professor tem que ser cobrado também por assiduidade, pontualidade, por enxergar cada um dos seus 30 alunos", diz Sanches.

Municípios sofrem pressão orçamentária

A implantação da Lei do Piso nas redes municipais brasileiras tem ainda uma segunda barreira: aumento do número de professores sem crescimento proporcional da arrecadação.  

Em estudo feito por Sanches com dados dos relatórios de gestão fiscal, ele averiguou que o número de professores das redes municipais cresceu 117% entre 1993 e 2012, saindo de 469 mil professores para quase 1,1 milhão. Nesse mesmo período, o volume de recursos nas prefeituras cresceu 85%.

Uma das soluções possíveis para reduzir esse descompasso é a complementação da União. A estratégia foi defendida por Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, durante o fechamento do 6° Fórum Nacional Extraordinário da Undime (União Nacional de Dirigentes Municipais da Educação).

Apesar do governo federal receber a maior fatia da arrecadação tributária, de acordo com estudo do Fineduca (associação de pesquisadores em financiamento de educação) apresentado por ele, as redes municipais são responsáveis por 42% dos gastos com educação, os Estados e o Distrito Federal por 40% e a União por 18%.

*A jornalista viajou a convite da Undime