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Faltam monitores para crianças com deficiência em escolas do Rio

Akemi Nitahara

Da Agência Brasil, no Rio de Janeiro

20/08/2015 08h58

Apesar do avanço no trabalho de inclusão de crianças com deficiência na rede municipal de ensino do Rio de Janeiro, ainda há alunos que não conseguem frequentar as aulas regulares. O menino João Marcos, de 5 anos, filho da recepcionista Priscila Felix Batista Gomes da Silva, que está desempregada, é matriculado na escola Reverendo Álvares Reis, em Inhaúma, zona norte, mas não está avançando no aprendizado.

Segundo Priscila, João Marco apresenta retardo na fala, agitação e falta de tônus muscular, mas ainda não tem diagnóstico. “Já tem três anos que ele está lá, esperando mediador. É complicado porque a professora não consegue dar conta, ele não está aprendendo nada. A professora reclama que ele não fica quieto, joga tudo no chão. Ela queria que eu tirasse João Marco, que ele não ficasse o período todo na escola. Eu disse não posso fazer isso, porque quero que meu filho aprenda”.

Priscila conta que já procurou a ouvidoria da Secretaria Municipal de Educação (SME), mas não foi atendida. “Eles alegam que se não conseguem estagiário nem para quem tem diagnóstico, imagina para quem não tem. Agora, fiz uma reclamação na ouvidoria, eles falaram que eu podia ir lá na escola para ter uma resposta. Fui à escola e a diretora só falou que em agosto ia fazer contratações, mas até agora não chegou ninguém”.

A diretora executiva da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae Rio de Janeiro), Tânia Athayde, afirmou que recebe relatos de que nem todos os alunos inseridos têm monitor. “A maioria tem um monitor na sala de aula, não é para aquela pessoa. A realidade que a gente ouve, dos relatos das pessoas, é que isso não se dá com essa regularidade como é transmitido”.

Segundo a secretaria, João Marcos está sem mediador no momento porque a rede está fazendo a renovação dos contratos e, assim que a questão for resolvida, ele será atendido. Após ser informada pela reportagem da Agência Brasil do caso de João Marcos, a diretora do Instituto Municipal Helena Antipoff (IHA), centro de referência em educação especial, Kátia Nunes, informou que uma equipe será enviada à escola dele para verificar o que está ocorrendo.

“Não vou dizer que está tudo maravilhoso, mas tem que estar. Se isso está acontecendo, imediatamente a equipe técnica vai avaliar para contribuir, para entrar em contato com esse professor, para que o anseio dele, as dificuldades de receber esse aluno nessa diversidade sejam contempladas. O que chega para a gente, imediatamente a gente vai até a escola. Essa questão da inclusão é muito nova para todos, mas ela tem que ocorrer”.

A diretora ressaltou que a inclusão não passa necessariamente pela presença de um monitor fazendo o acompanhamento individual e constante do aluno em sala, e sim por todo o contexto escolar de acolhimento da criança com deficiência. “Se o professor está tendo dificuldade com essa inclusão, é competência nossa, da SME, ir lá atender a esse professor e contribuir, porque entendemos que o desafio da inclusão não é só do professor, é de todos nós que estamos vivendo este momento. É uma questão de direito e que nós, professores e pedagogos, façamos valer isso para todos”.

Centro de Referência

Todo o trabalho na rede é supervisionado pelo Instituto Municipal Helena Antipoff, que atende no contraturno da escola regular crianças e jovens com deficiência, transtorno global de desenvolvimento, altas habilidades e superdotação, além de oferecer cursos de educação continuada para os professores. Este ano, já passaram pela capacitação mais de 4 mil professores, em 14 cursos.

De acordo com Kátia Nunes, equipes do instituto visitam periodicamente todas as escolas. “Nós avançamos muito nesse processo de incluir o aluno, o que se deu também por meio de tanto recurso, tanto equipamento, tanta formação. O acompanhamento de educação especial nas escolas foi fundamental, o município do Rio de Janeiro vem investindo nas coordenadorias, todos estão envolvidos para garantir o direito do aluno que está convivendo, seja com dificuldade de aprendizagem, hiperatividade, com deficiência. Todos têm o direito à escola”.

Professora do Instituto de Cegos Benjamin Constant, Maria Helena Francis Sena, que é deficiente visual, dá aula de braille e sorobã (adaptação para deficientes visuais do ábaco japonês) também no Helena Antipoff. Ela relatou que só conseguiu estudar a partir da adolescência, quando se mudou para o Rio de Janeiro, por falta de recursos na cidade do interior de Minas Gerais em que morava quando criança. Para Maria Helena, a inclusão das crianças com deficiência nas escolas é uma realidade que não pode sofrer retrocessos.

“Acho que a inclusão é uma realidade, ela é um fato, ela é necessária, eu acho que está havendo muito investimento nisso. Agora, é preciso que não pare, é preciso que deem importância, que deem apoio ao professor que quer se capacitar, porque senão, segundo o que a gente pode perceber, a inclusão acabaria sendo de direito, e a gente deseja uma inclusão de fato”.

Uma das alunas de Maria Helena no IHA é a professora Cristine Ferreira de Pinho, que dá aulas de artes na Escola Gabriela Mistral, na Praia Vermelha, na Urca, zona sul do Rio. Cristine conta que decidiu aprender braille para receber no próximo ano uma aluna cega que ainda está no maternal. “Ela ainda não é minha aluna, mas a gente está se preparando para recebê-la no ano que vem. Eu estou fazendo a alfabetização em braille e a audiodescrição, que foram oferecidos para os professores de artes, e já estou inscrita em outro curso de educação especial, tudo aqui no IHA”.

Também aprendendo braille, a professora Liliane Correia da Silva, responsável pela sala de recurso da Escola Dom Aquino Correia, em Copacabana, zona sul do Rio, informou que, no momento, atende a 16 crianças de nove escolas. Apesar de nenhuma delas precisar do braille para se comunicar, o recurso pode interessar a outros alunos.

“Hoje, não tenho nenhuma criança com deficiência visual em um grau que precise do braille, mas tenho um aluno TGD [Transtornos Globais do Desenvolvimento] que se interessou, então ele está sendo alfabetizado e, ao mesmo tempo, fica fazendo a comparação com o braille. O sorobã ajudou muito também na matemática, tanto para o TDG quanto para a síndrome de down. Então, mesmo o recurso não sendo específico para aquela criança, às vezes ela se interessa e a gente acaba fazendo disso uma ferramenta para ela se interessar cada vez mais”.

Crianças incluídas

As escolas regulares também recebem crianças com deficiência. Após fazer um abaixo-assinado online que repercutiu nos meios de comunicação e conseguir um mediador para acompanhar o filho Pedrinho, de 9 anos, na escola, a técnica em radiologia Sheila Velloso afirmou que o menino, que tem a doença neurológica rara Síndrome de Cornélia de Lange, melhorou o comportamento também em casa, antes muito agitado e agora mais comunicativo.

“Ele está na escola desde maio. Melhorou, está mais quietinho, a gente está querendo melhorar a forma de comunicação dele, que agora puxa a gente, tentando se comunicar que quer mais alguma coisa. A terapeuta também sentiu isso, ele está mais centrado, mais comportadinho, fica sentado em uma carteira prestando atenção. O convívio dele com as outras crianças também está melhor”.

Pedrinho frequenta a turma regular da terceira série do ensino fundamental na Escola Pedro Ernesto, na Lagoa Rodrigo de Freitas, na zona sul do Rio. Após saber do abaixo-assinado feito por Sheila, a dona de casa Marya Gomes, mãe de Davi, menino autista com 6 anos de idade, seguiu o mesmo caminho e conseguiu um mediador para acompanhar o filho na escola, trabalho que ela mesmo fez por três anos.

“Atualmente, ele está na Escola Senador Corrêa [em Laranjeiras, zona sul], mas não estou muito satisfeita. Porque a secretaria colocou uma estagiária que não é nem do ramo da educação, ela estuda assistência social, e até ela mesma me passou um certo desconforto em relação ao fato de ficar com o Davi, porque não sabia lidar, passar alguma coisa didática”.

Apesar de o filho demonstrar interesse pela escola, Marya disse que falta estrutura pedagógica para atender às crianças com deficiência. “Só o fato de a criança estar na escola não adianta muita coisa, ainda falta muito investimento da Secretaria de Educação nesse quesito. Eles têm que mandar um profissional que saiba lidar com a criança, com deficiência, não apenas uma pessoa para olhar o aluno. Porque isso não passa nenhuma segurança para os pais. É uma coisa que, para eles, funciona, mas é muito no papel, na prática é muito diferente”.

De acordo com a Secretaria Municipal de Educação, a rede tem 12 mil alunos com deficiência nas 1.008 escolas municipais, sendo que 450 têm salas de recursos e atendem a mais de uma unidade, além de dez escolas dedicadas apenas à educação especial. A secretaria informou que o acompanhamento individual não é automático nem obrigatório para todos os casos, depende de uma avaliação do desenvolvimento da criança.