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É conversando que a gente se entende? Alunos de Etec discutem ocupação

Karina Yamamoto

Do UOL, em São Paulo

12/05/2016 15h00

Eram cerca de 30 alunos em frente ao portão da escola técnica Professor Basilides de Godoy, zona oeste paulistana. Estavam uniformizados, com material na mochila e estavam dispostos a entrar para ter aulas.

O clima estava tenso por causa da troca de agressões que havia ocorrido dias antes entre grupos contrários e a favor da ocupação do colégio, que acontece desde o dia 3.

"O pessoal do noturno foi agressivo e conseguiu entrar. É isso que a gente vai ter que fazer?", comentou um adolescente. "A gente veio para a assembleia", completou uma menina. 

De dentro do portão, uma representante perguntava: "quem disse que ia ter assembleia?" e já completou: "A gente não marcou nada".

Perto da entrada estavam alguns adultos, duas mulheres e dois homens, pais de alunos que ocupam a escola. Eles não interferiam nas conversas entre os adolescentes.

Do outro lado da rua, um outro grupo com cinco homens também só observava a movimentação: três deles eram pais de estudantes, mas da turma que queria ter aula.

"O que ouço sempre é o mesmo discurso de pais e alunos, se há possibilidade de fraude, isto deve ser apurado", diz Sérgio, pai de estudante do 1º ano. 

"Mas as ocupações estão tirando o direito da aula e, assim, trazendo mais um prejuízo aos alunos que é o conteúdo programático escolar."

 

Claramente divididos

Uma roda de alunos começou a se formar quando a reportagem do UOL se apresentou e disse que estava ali para entender a história. 

"A gente quer ter aula", eles repetiam à exaustão. A turma era o segundo ano do técnico em mecatrônica, curso famoso por ser exigente. 

Então explicaram que só terão 15 dias de recesso em julho e estão preocupados com a reposição das aulas perdidas. Aos sábados, a turma já repõe uma matéria que ficou sem professor durante um bimestre, MPM (manutenção de projetos mecatrônicos).

Outra reclamação dos estudantes contrários ao protesto era de que a assembleia que decidiu a ocupação não foi legítima.

Mateus estuda no 2º ano do curso e disse que os alunos da Etec que são contra a ocupação foram pegos de surpresa: "a gente foi para a assembleia e eles tinham tudo pensado, a gente não estava organizado". Por isso, o menino exige outra reunião para discutir a forma de protesto.

"Eles não querem fazer outra assembleia, porque vão perder", acredita Gabriel, que é representante da classe.  

"Precisa ter 5% dos alunos para ser legítima e a gente tinha essa quantidade de pessoas" foi a resposta dada pelos ocupantes.

Uma das meninas, Caroline, não escondia a indignação com a estratégia dos colegas em paralisar as aulas. Pouco falava, mas não precisava. Sua insatisfação era nítida.

Addiel, seu namorado e sempre ao lado dela, resmungava enquanto os argumentavam eram colocados na roda de conversa: "Querem que a gente perca o curso? E, depois se não tiver reposição, a gente vai formar sem essa matéria? Vai fazer falta na hora de arrumar um emprego bom".

"Como eles querem melhorar as coisas assim? Tirando o pouco que a gente conseguiu?", perguntava Addiel.

"A visibilidade é negativa [com as ocupações]", "quando a ocupação acaba, o governo faz o que quer [como está fazendo com as salas de aula fechadas]", "por que a gente não protesta fechando a Paulista?", disseram outros alunos.

Em contra partida, os estudantes da ocupação respondiam: "a gente conseguiu a promessa de marmitex em agosto", "eles iam fechar escolas e não, salas", "quantos de vocês foi aos protestos que a gente marcou?".

No vaivém dos argumentos de um lado e de outro, os alunos chegaram a alguns pontos de acordo. Saíram de lá, com o compromisso de listar as aulas que precisam ter (os alunos que são contra a ocupação) para que os outros corram atrás de voluntários para essas aulas.

De noite, uma das reivindicações foram atendidas: os estudantes e os professores poderiam entrar no dia seguinte, com os professores, mas sem coordenação para as aulas.

Querem aula

Essa história de entrar na escola "feito bandido de madrugada" e paralisar as aulas tira os alunos do sério-- os alunos que querem ter aula e que parecem querer agarrar a chance do técnico com todas as forças.
 
Na noite da segunda-feira, 9, quando a reportagem voltou para acompanhar a entrada dos alunos do noturno, uma frase resumia esse sentimento.
 
"Essa menina aí tem 16 anos, eu tenho 26", dizia Alexandro. "Eu já estou atrasado 10 anos, preciso entrar."
 
O estudante do técnico em mecânica conta que precisa do curso para tentar um emprego melhor. 
 
"Moça, vocês estão sendo usados", argumentava Alexandro. Segundo, a molecadinha da manhã, que tem "uma mentalidade muito diferente do pessoal da noite", está sendo manipulada por interesses políticos, para desviar a atenção do "que está acontecendo em Brasília", o impeachment.
 
Do lado de dentro da grade, uma menina de pouco mais de 15 anos, ouvia e tentava contra-argumentar. Sem sucesso.
 
"Golpe é acabar com o meu futuro de estudante", disse Alexandro.