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Acusado de estupro, aluno da USP vai se formar em medicina; docentes reagem

Marcelle Souza

Colaboração para o UOL, em São Paulo

26/10/2016 17h51Atualizada em 27/10/2016 11h03

Um aluno da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) acusado de dopar e estuprar ao menos três estudantes em festas universitárias vai se formar após cumprir um ano e meio de suspensão.

A pena foi determinada após um processo disciplinar instaurado pela faculdade e agora, após seu cumprimento, o aluno poderá colar grau.

Um grupo de professoras chegou a pedir a extensão da pena ou a expulsão do aluno, mas a Procuradoria da USP informou à Congregação da Faculdade, em reunião realizada na última sexta-feira (21), que o estudante está apto a obter o título de médico.

“Entendemos que a pena aplicada foi mínima, ele deveria ter sido expulso, porque os fatos são gravíssimos e há provas. Sabemos de outros casos, mas só essas meninas, corajosas, conseguiram formalizar a denúncia”, diz a professora Heloisa Buarque de Almeida, integrante da Rede.

“A sensação que temos é que a universidade não está sabendo lidar com esses casos de violência sexual, quem denunciou é que está sendo penalizada”, afirma Buarque de Almeida. 

O advogado Daniel Alberto Casagrande, que defende o estudante punido, nega que haja crime.

Além dos três fatos investigados pela universidade, outros três envolvendo o mesmo autor chegaram ao conhecimento da Rede Não Cala (grupo formado por professoras e pesquisadoras para cobrar ações de enfrentamento aos casos de violência sexual e de gênero na USP). 

Os casos mais recentes não foram investigados porque as estudantes preferiram não formalizar as denúncias.

Em nota, o grupo de professoras questionou a decisão da Faculdade de Medicina: “Temos plena convicção de que a USP não pode correr o risco de diplomar alguém que pode ser um agressor, ainda mais para o exercício de uma profissão destinada ao cuidado, como é o caso da medicina”.

Procurada pela reportagem, a Faculdade de Medicina da USP afirmou que o aluno “cumpriu integralmente a punição de um ano e meio que lhe foi imposta pela universidade” e que “segue as determinações da Procuradoria Geral da USP”. A instituição ainda destaca que o caso é investigado pela Justiça.

Réu em caso de estupro

Ao menos um dos casos investigados pela faculdade contra o aluno citado virou processo (que tramita em segredo) na Justiça de SP. Na denúncia, uma estudante de enfermagem afirma que foi dopada em uma festa dos alunos de medicina. Ela contou ainda que adormeceu, acordou durante o estupro e tentou reagir e gritar, mas foi imobilizada pelo acusado.

Para intimidar a jovem, o homem teria dito que era policial militar. No processo, ele alega que a relação foi consentida.

Esse caso foi um dos relatados à do CPI do Trote, instalada em dezembro de 2014 na Alesp (Assembleia Legislativa de SP), que viraram sindicância na USP. À época, os deputados ouviram alunos e professores de instituições paulistas para apurar abusos em eventos universitários.

O mesmo estudante já foi acusado de homicídio quando era soldado da PM, de onde pediu exoneração em 2008. O fato ocorreu em fevereiro de 2004, na região central de São Paulo, quando ele teria atirado em outro homem durante uma discussão em um bloco de carnaval. Na Justiça, o caso foi suspenso.

Defesa do aluno

"As acusações de estupro não são verdadeiras. Foram instaurados três procedimentos apuratórios na FMUSP [Faculdade de Medicina da USP] e nenhum deles reconheceu a ocorrência de estupro", afirma Casagrande, que defende o estudante punido. 

Em abril de 2015, decidiu suspender inicialmente por 180 dias o aluno por "infrações disciplinares". À época, a direção disse que iria aguardar a conclusão das investigações criminais e do processo na Justiça.

"A suspensão das atividades acadêmicas se deu por outros fatos, não pelo estupro. Há um processo criminal em andamento que, por tramitar sob sigilo, não pode ser comentado", disse o advogado.