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SC: Universidade prepara câmeras para pais vigiarem alunos e gera críticas

Câmeras de vigilância na UFSC vão monitorar as principais saídas do campus - Divulgação
Câmeras de vigilância na UFSC vão monitorar as principais saídas do campus Imagem: Divulgação

Aline Torres

Colaboração para o UOL, em Florianópolis

29/03/2017 04h00Atualizada em 28/10/2021 17h01

A UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) prevê implantar em maio um novo projeto de segurança para seus alunos. Pais poderão vigiar os estudantes por meio das câmeras instaladas no campus. Contudo, o Rota Segura, como foi batizado, tem causado polêmica, além de ser visto como insuficiente para reduzir crimes.

Para tentar controlar a violência no campus da Trindade, em Florianópolis, a SSI (Secretaria de Segurança Institucional) quer uma rota que priorize as três saídas da universidade e onde serão colocadas 15 câmeras. Por meio de um aplicativo e da ID (identidade universitária), os pais dos alunos poderão acompanhar o trajeto dos filhos.

Nos últimos anos, a federal catarinense tem investido em tecnologia para conter a insegurança. Há 1.300 câmeras instaladas para fiscalizar o mais de 1 milhão de metros quadrados de terreno. Recentemente, a Receita Federal também doou dois drones, que sobrevoam áreas não monitoradas do campus.

Ainda assim, somente neste ano, a SSI já registrou quatro boletins de ocorrência de roubos. Estudantes ouvidos pela reportagem afirmam que nem sempre procuram o órgão universitário para prestar queixa, então dizem crer que esse número seja maior. Segundo pesquisa do jornal-laboratório da instituição, 58 de 66 entrevistados disseram já terem sido assaltados no campus da Trindade.

As principais denúncias no local são de furtos e assaltos. Mas há casos de agressões, racismo, assédios, atropelamentos, invasão da moradia estudantil e até sequestro.

"Somos adultos, não faz sentido babá eletrônica"

Clarissa Levy, aluna de jornalismo, frequenta a universidade há três anos e já teve a bicicleta furtada. Ela conta que o momento mais inseguro para circular na faculdade é após as 22h, na saída das aulas noturnas. Para ela, a sensação de medo piorou após a proibição pela reitoria das atividades noturnas, como eventos e festas. "Agora a universidade é um grande vazio", diz.

"Eu acho que a reitoria reduz a questão da segurança ao monitoramento. Somos adultos, não faz sentido ter uma babá eletrônica. Essa vigilância, inclusive, é desconexa ao objetivo educacional", afirma.

Para Douglas Nichel, 20, e Paola Villa, 21, do curso de filosofia, a solução não é tecnológica. "Eles deveriam colocar mais guardas no campus", disse Nichel. O jovem já foi assaltado com um taser. "Ao observar um crime da universidade, você evitará que ele aconteça?", questiona Villa.

As universitárias Manoela Bonaldo, 24, Jade Kalfeltz, 18, e Mariany Bittencourt, 22, concordam. "Os vigias deveriam cuidar das pessoas, não do patrimônio", diz Bonaldo. Para Kalfeltz, o Rota Segura "melhora a sensação de segurança, não a segurança em si".

A universidade conta com 38 servidores responsáveis pela segurança e 198 terceirizados que cuidam da guarda patrimonial. Eles se dividem entre o campus da Trindade, que é o maior, e os outros dez, que estão espalhados por diferentes bairros de Florianópolis e cidades de Santa Catarina.

É uma escuridão [o campus], não tem nenhuma segurança, sempre ficamos aflitos

Roberto Nobre, que tem enteada na UFSC

Somente no campus da Trindade circulam 40 mil pessoas por dia. "Por isso chamamos de cidade universitária. Há mais gente aqui do que na maioria das cidades do Estado", disse Leandro Luiz de Oliveira, secretário de segurança institucional da UFSC.

Oliveira explica que os projetos de segurança sempre são recebidos com alguma resistência pelos estudantes. Segundo ele, já há campanhas como "Não Transforme a UFSC no BBB" e "Grande Irmão, Não". Mas ele diz que cabe aos estudantes decidirem se irão passar suas IDs aos pais.

"Essa é mais uma ação para inibir marginais. Por lei, os seguranças da UFSC andam desarmados. Então, a Polícia Militar também vai ter acesso às imagens e poderá intervir se for necessário", afirmou. Os pais dos alunos que virem alguma situação de violência poderão ligar para a PM ou para o SSI.

UFSC - Acervo Agecom/UFSC - Acervo Agecom/UFSC
Campus da federal de Santa Catarina
Imagem: Acervo Agecom/UFSC

Para o chefe do gabinete da reitoria Áureo Mafra Moraes, o projeto não propõe uma vigília, mas uma cooperação da sociedade, que ajudará na fiscalização. "Há muitos pais preocupados, que cobram ações da universidade e têm boas relações com os filhos, que não se importarão de serem vistos. Outros alunos criticam porque não querem que os pais vejam o que estão fazendo", comentou.

Mafra Moraes também rebate a afirmação de que o fim das festas aumentou a insegurança. "É uma falsa afirmação. Afastamos as pessoas mal-intencionadas, envolvidas com tráfico, assaltos, pessoas armadas que não tinham nenhum vínculo com a UFSC e eram atraídas por esses eventos."

"Não é a solução ideal"

Já os pais divergem sobre o Rota Segura. Marines Dias Moreira, 68, é mãe de uma estudante de psicologia. "Não posso dizer que esse é um projeto ético, por que ele macula a liberdade e a privacidade das pessoas, mas creio que é necessário. Temos medo do que possa acontecer aos nossos filhos."

Roberto Nobre, 48, conta que a enteada tem aulas de educação física à noite em um dos piores locais do campus. "É uma escuridão, não tem nenhuma segurança, sempre ficamos aflitos", disse. "Se esse projeto funcionar, ela poderá nos ligar quando estiver saindo da aula e acompanharemos o caminho até o carro pelo celular. Não é a solução ideal, mas já é algo."

Rubia de Oliveira, 51, mãe de um estudante de engenharia, é mais crítica. Para ela, a universidade deveria investir em iluminação, guarda e os frequentadores da universidade deveriam se identificar com crachás magnéticos para ter acesso ao campus. "Acho que é uma solução mais real", opina.