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Pais e professores se dizem castigados após ação policial em creches de SP

Terceirizadas têm 83% das vagas de creches municipais para crianças de zero a três anos em SP - Getty Images/iStockphoto
Terceirizadas têm 83% das vagas de creches municipais para crianças de zero a três anos em SP Imagem: Getty Images/iStockphoto

Bruno Aragaki

Do UOL, em São Paulo

25/09/2019 04h01

Resumo da notícia

  • Em 12 de setembro, polícia fez ação para investigar creches terceirizadas em SP
  • Entidades são suspeitas de desviar dinheiro público
  • Gestão Covas descredenciou creches investigadas
  • Funcionários foram dispensados, e pais se queixam da troca relâmpago de professores
  • Demitidos dizem ter sido punidos por supostos crimes dos patrões

Uma ação policial em creches municipais terceirizadas em São Paulo há duas semanas resultou, na última segunda-feira (23), na demissão de funcionários e na troca abrupta de professores na periferia da cidade.

Pais de crianças matriculadas no Centro de Educação Infantil (CEI) Egídio Corsi, na Cidade Tiradentes, se queixam da falta de planejamento por parte da prefeitura, e os demitidos acusam a gestão Covas (PSDB) de não dar amparo jurídico em um processo iniciado pela denúncia dos próprios funcionários, que notaram que o FGTS não vinha sendo depositado.

"Cheguei na creche para deixar minha bebê de sete meses e fui recebido por uma professora que eu nunca tinha visto, e minha filha não conhecia. Não entendi nada", diz Rafael Xavier da Silva.

Ele afirma que nem ele, nem nenhum outro pai foram avisados sobre a troca, nem os motivos.

"Depois soube por cima do problema [de suspeita de corrupção por parte dos representantes da creche], mas o que as crianças têm a ver?", questiona.

Jidalza Costa, mãe de Victor Hugo, tem relato parecido. "Meu filho já estava acostumado com as professoras, e trocaram do nada. Não concordei", afirma.

Em 12 de setembro, a CEI Egídio Corsi foi um dos 16 alvos de mandados de busca e apreensão realizados pela Polícia Civil, que desconfia que uma máfia de creches terceirizadas tenha se instalado na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo.

A ação começou com a denúncia de desvios de valores de FGTS e INSS de funcionários — que nesta semana foram demitidos, mas afirmam não ter recebido verbas rescisórias, nem tiveram as carteiras de trabalho carimbadas.

As autoridades desconfiam de envolvimento de funcionários da Prefeitura, que podem ter atestado notas fiscais falsas e ignorado indícios de irregularidades, como processos trabalhistas que passaram a indicar a Prefeitura também como responsável.

"Tais empresas em conluio vêm apresentando guias e certidões falsas, o que não é fato estranho à municipalidade, pois também reclamada naquelas lides trabalhistas de forma solidária, levando-se a crer também em um suposto envolvimento de órgãos de fiscalização da Secretaria Municipal de Educação", afirmava o pedido de busca e apreensão feito pela polícia.

Castigo terceirizado

Funcionários ouvidos pela reportagem se dizem punidos por possíveis crimes dos patrões. Os 23 empregados da CEI Egídio Corsi foram dispensados nesta semana.

"O alvo eram os donos, e quem foi castigado fomos nós", disse à reportagem uma funcionária, sob condição de anonimato.

"Nós denunciamos que não recebíamos o FGTS, e agora ficamos sem emprego e sem receber", completa.

Ela afirma que, após a operação policial, a creche passou a ser administrada por uma outra organização, a Associação de Voluntários Educadores Sociais.

"Trabalhamos alguns dias com eles, mas na segunda-feira falaram que não era mais para vir. Ligamos para o dono antigo, e não nos atendem mais", relata.

A gestora antiga da creche, a Associação de Mulheres da Cidade Tiradentes, foi descredenciada pela Prefeitura após denúncias reveladas pela Folha de S.Paulo terem sido confirmadas por investigações da Polícia Civil.

Também estão sob suspeita as associações Águas Marinhas, Criança de Deus e Casa da Mulher da Cidade Tiradentes — todas com unidades na periferia da cidade.

Reportagens do jornal mostraram suspeitas de desvio de alimentos, e a polícia descobriu que os representantes legais de ao menos duas associações sob suspeita, incluindo a que administrava a CEI Egídio Corsi, tinham vida de luxo.

Responsáveis por 280 mil das 340 mil vagas de creche oferecidas pela Prefeitura de São Paulo, as creches terceirizadas são gerenciadas por organizações, em teoria, filantrópicas — isto é, sem fins lucrativos.

Prefeitura diz que ajudará funcionários

Questionada pela reportagem, a Prefeitura afirmou que a "Secretaria de Educação de São Paulo poderá sanar as questões trabalhistas, mesmo não sendo de responsabilidade da Pasta".

Em nota, a administração municipal afirmou que a Diretoria Regional de Ensino "fará o envio do valor devido para os funcionários das entidades descredenciadas", mas não informou quando.

Sobre as reclamações dos pais, a pasta afirmou que "está acompanhando toda a transição e está à disposição dos pais e responsáveis para esclarecimento de quaisquer dúvidas".