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Investimento em ensino médio integral reduz matrículas no fundamental

Anuário aponta que fechamento das escolas foi um dos motivos para queda nas despesas de educação nos estados - Ana Paula Bimbati/UOL
Anuário aponta que fechamento das escolas foi um dos motivos para queda nas despesas de educação nos estados Imagem: Ana Paula Bimbati/UOL

Ana Paula Bimbati

Do UOL, em São Paulo

03/08/2021 00h01

O Brasil teve uma queda de 9% nas matrículas de tempo integral na educação básica do ano passado em comparação com 2019. O ensino fundamental 2 concentrou a maior diminuição, segundo dados do Anuário Brasileiro da Educação Básica 2020, divulgado hoje pelo movimento Todos pela Educação em parceria com a editora Moderna.

Além de uma carga horária maior, chegando a nove horas e meia, as escolas de tempo integral oferecem uma grade curricular diferente, algumas com aulas de dança, jogos e projeto de vida —o que ajuda os alunos a planejarem o que vão fazer após o fim da escola.

Em 2019, as escolas públicas registraram 5.002.641 matrículas, em todas as etapas. Já no ano passado, antes da pandemia, o país chegou a 4.547.066.

Com a pandemia e, consequentemente, com a queda na aprendizagem, perda do vínculo com a escola e, em muitos casos, riscos de evasão, a expansão da jornada torna-se imperativa para que a mitigação dos efeitos do prolongado fechamento das instituições de ensino seja de fato efetiva.
Priscila Cruz, presidente do movimento Todos pela Educação

Veja os números por etapa escolar

  • Educação infantil: De 1.820.935 matrículas em 2019 para 1.820.479 no ano passado;
  • Ensino fundamental 1: De 1.308.263 matrículas em 2019 para 1.033.087 no ano passado;
  • Ensino fundamental 2: De 1.111.146 matrículas em 2019 para 779.397 no ano passado.

Na educação infantil e no fundamental 1, os números não sofreram tantas alterações. Para Priscila Cruz, presidente do movimento, "grandes políticas públicas avançam, tendo como grande motor o governo federal", e essa não foi uma bandeira do governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

Os números do ensino médio, segundo os dados do relatório, vão na contramão das outras etapas escolares. As matrículas cresceram de 762.297, em 2019, para 914.103, no ano passado.

matriculas em tempo integral em escolas publicas - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

Para o movimento, o aumento dos dados na última etapa da educação básica se deve a investimentos feitos pelo MEC (Ministério da Educação) e secretarias estaduais de Educação. Em Pernambuco, por exemplo, 54,5% das matrículas nas escolas públicas são ofertadas em tempo integral.

Cruz aponta que a priorização pelo ensino médio acabou afetando as outras etapas. "O governo [Michel] Temer [MDB] ficou voltado para o ensino médio. Se por um lado foi importante, por outro aconteceu um vácuo em relação ao fundamental."

A gestão de Temer aumentou em 41,8% o número de alunos de tempo integral. Segundo Gabriel Corrêa, gerente de Políticas Educacionais do Todos pela Educação, o investimento do governo federal também foi diminuindo ao longo do tempo.

"O ano de 2015 foi o auge do financiamento [para escolas de tempo integral no ensino fundamental]. Aí, esse valor foi reduzido em 2016 e ainda mais em 2017. Isso acabou influenciando as matrículas", explicou Corrêa.

O programa Novo Mais Educação, lançado por Temer, teve só em 2018, segundo o gerente de políticas educacionais, um investimento considerável. "Já no Ensino Médio, a expansão tem sido muito positiva nos estados. No entanto, é preciso ter cuidado para que esse movimento não traga uma canibalização das matrículas em tempo integral no Ensino Fundamental, quando há concorrência de recursos adicionais para que a ampliação da jornada seja efetivada."

No estado de São Paulo, a gestão de João Doria (PSDB) também tem apostado na modalidade. Só no mês passado, o tucano anunciou a expansão para mais 778 escolas.

Despesas com educação caíram 14% em 5 anos

Estados brasileiros reduziram em 14% as despesas com educação no ano passado, se esse número for comparado com os gastos de 2015. Ao todo, foram R$ 11,4 bilhões a menos. Em relação a 2019, a diminuição foi de 9%.

No ano passado, em números gerais, as despesas empenhadas ficaram em R$ 113,5 bilhões, e as pagas chegaram a R$ 103,2 bilhões.

Já em 2015, o valor empenhado foi de R$ 132,2 bilhões e as despesas pagas resultaram em R$ 121,1 bilhões. O estado de Goiás teve a maior diminuição de 2019 para 2020, de 38,1%.

O governo, porém, rebate os números e justifica com a contabilização dos pagamentos a aposentados. Diz que "a diferença se baseia na contabilidade dos proventos dos aposentados da pasta dentro da função educação, o que acrescentou, no ano de 2019, um valor de R$ 1.924.138.555,99".

"A atual gestão do governo estadual tem cumprido a vinculação constitucional de 25% de investimento em educação e, com isso, conseguiu reformar todas as escolas do estado, investir em uniformes, tênis e mochilas para todos os 530 mil estudantes", afirma, em nota, ressaltando que "os investimentos, por meio de importantes programas e ações, continuam em 2021".

Segundo Cruz, o fechamento das escolas e a demissão de professores temporários são algumas das consequências para a diminuição das despesas.

Ela aponta, porém, que os estados poderiam ter utilizado o dinheiro para melhorar outros pontos. "Podemos afirmar que é um erro do Brasil, por ter perdido a oportunidade de utilizar nesse período o recurso da educação, mesmo esse recurso da recomposição [do orçamento], para investir em infraestrutura das escolas", diz ela.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado, o gerente de políticas educacionais do Todos pela Educação disse que o financiamento em 2015 foi para escolas de tempo integral no ensino fundamental, não no médio. O texto foi corrigido.