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Escândalo em vestibular indiano tem milhares de prisões e mais de 30 mortes

Em protesto, estudantes de medicina dizem que a fraude põe fim à meritocracia no sistema educacional indiano - Reprodução/BBC
Em protesto, estudantes de medicina dizem que a fraude põe fim à meritocracia no sistema educacional indiano Imagem: Reprodução/BBC

10/07/2015 11h39

Um escândalo sobre fraude nas provas de vestibular para uma faculdade de medicina na Índia pode estar por trás da morte de mais de trinta pessoas, algumas em circunstâncias misteriosas. Mais de mil e novecentos suspeitos foram presos e as investigações indicam que políticos importantes e outras autoridades podem estar envolvidos.

A fraude, feita em larga escala, envolvia a venda de questões de provas do vestibular do Estado de Madhya Pradesh, adulteração de respostas, contratação de substitutos de candidatos e a venda de assentos especialmente marcados, ao lado de estudantes que davam cola aos candidatos que pagassem. Os preços pelos assentos especiais nos exames variavam entre o equivalente a 47 mil reais e 300 mil reais.

Em meio às investigações, 33 pessoas morreram em circunstâncias misteriosas - a maioria das vítimas que eram também acusadas de participação no escândalo morreram nos últimos dois anos - dando margens a teorias conspiratórias. Dez deles morreram em acidentes de carro, levantando suspeitas de que foram mortes premeditadas.

A dimensão da fraude é surpreendente. Desde o começo das investigações em 2012, mais de duas mil e quinhentas pessoas foram acusadas de envolvimento, sendo que 1.980 acabaram presas e a polícia ainda procura por mais de 500 suspeitos. Atualmente mais de 50 casos ligados ao escândalo tramitam por vinte tribunais de Madhya Pradesh.

Entre os acusados estão um ex-ministro do partido do governo, o BJP, assessores de ministros, funcionários de alto escalão, o dono de uma das melhores faculdades particulares da Índia, o irmão de um policial de alta patente, vários policiais e um milionário do setor de mineração.

Ameaça de morte

Durante investigações da denúncia de que as provas do vestibular de Madhya Pradesh estavam sendo violadas, um dos informantes da polícia, o médico Anand Rai, recebeu uma ameaça de morte por telefone.

O médico Anand Rai recebeu ameaças de morte por delatar o esquema fraudulento

"Do outro da linha, um homem dizia que iria me matar. Ele me disse para parar de colaborar com a polícia, e desligou em seguida."

Poucos minutos mais tarde, o mesmo homem voltou a ligar, dizendo ao médico para não passar o número dele para a polícia e prometeu dar a ele uma recompensa em dinheiro.

O doutor Rai não obedeceu, forneceu o número do telefone aos policiais que descobriram que a ligação tinha sido feita de Mumbai e prenderam o homem que ameaçou o médico.

O homem era um professor assistente em uma faculdade particular de medicina. Os policiais descobriram que ele era o mentor de uma das maiores fraudes já descobertas no país.

Pelo esquema, o grupo conseguia acesso às provas de vestibular. Ele contou aos policiais que as questões dos exames eram passadas por funcionários do Vyapam, o departamento responsável pela elaboração e aplicação de mais de 50 provas para vários cargos públicos além da faculdades de medicina do Estado.

Estima-se que 140 mil estudantes tenham prestado vestibular no Estado desde 2007. Números oficiais indicam que ocorreram mais de mil fraudes nas provas do Vyapam, mas segundo, Anand Rai, esse número é muito maior.

Ali Babá

"Isto é maior do que o roubo de Ali Babá e os 40 Ladrões", comentou Babulal Gaur, uma das maiores autoridades de Madhya Pradesh. "O escândalo trouxe má reputação ao Estado. Manchou o nome de nossos médicos. Se você diz que é médico formado em Madhya Pradesh, as pessoas te perguntam se teu diploma é falso ou verdadeiro", disse ele.

Com quase quatrocentas faculdades de medicina (públicas e particulares), o sistema indiano é um dos maiores do mundo, com cerca de 70 mil estudantes prestando vestibular a cada ano. Em torno de 30 mil médicos são formados por ano na Índia.

Em junho, a suprema corte indiana determinou que 600 mil estudantes fizessem novamente as prova do vestibular de medicina em todo o país, depois de ter ficado comprovado o vazamento de questões do exame.

Segundo o doutor Rai, as fraudes nas provas do vestibular de medicina na Índia ocorrem há muito tempo, envolvem muita gente e diferentes governos preferiram fingir que o problema não existia.

Ele diz que quando prestou exame, em 1994, a prova foi cancelada depois de ter sido descoberto vazamento de questões. Após o cancelamento, a prova foi cancelada e ele teve de fazê-la novamente. Um professor da faculdade foi acusado pelo vazamento. Um ano depois, o mesmo professor foi assassinado com 40 tiros.

Rai acrescenta que, ao prestar exame para o curso de pós-graduação, em 2005, percebeu algo estranho na lista dos 10 melhores resultados. "Os 10 melhores da lista eram todos filhos ou filhas de parentes de autoridades importantes e policiais. Achei muito esquisito. Em seguida descobri que os que tinham tirado as melhores notas moravam todos no mesmo alojamento. Protestamos e exigimos uma investigação, mas nada foi feito."

Quatro anos mais tarde o doutor Rai recebeu a primeira ameaça de morte pelo telefone.

Um dos assessores de um importante secretário estadual é um dos acusados de participação no esquema fraudulento. Ele diz que contou à polícia que questões de uma das provas do Vyapam tinha vazado. Quarenta pessoas, incluindo pais e estudantes foram presos. Segundo ele, o vazamento foi feito por funcionários do próprio Vyapam.

No centro do escândalo, o Vyapam é responsável não só pelo vestibular de medicina de Mahyda Pradesh como também pela aplicação de cerca de 50 provas para cargos públicos diversos.

Chandresh Bhushan, um juiz aposentado que chefia uma equipe especial de investigação que monitora o trabalho da polícia de Madhya Pradesh diz que "o Vyapam é apenas a ponta do iceberg".

"Isto está espalhado por todo o país. Este é o esquema mais audacioso e feito com ajuda da mais alta tecnologia com que me deparei. Apenas um dos presos foi responsável pela aprovação fraudulenta de 300 estudantes. Dá para acreditar?", perguntou Bhushan.