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História geral

Império Carolíngio - apogeu e declínio - Pepino, Carlos Magno e as invasões bárbaras

Gilberto Salomão

A ascensão de Carlos Martel ao cargo de major domus já evidenciara uma situação de dualidade de poder na França. Embora, em princípio, tal cargo fosse uma indicação real, seu pai, Pepino de Heristal, havia conseguido impor seu nome como sucessor, tornando o cargo hereditário, numa estrutura de poder paralelo ao poder monárquico.

De qualquer modo, foi sob o comando de Carlos Martel, e sua inequívoca liderança sobre os guerreiros francos, que estes conseguiram derrotar os árabes na batalha de Poitiers, em 732.

A vitória teve múltiplos significados para o reino franco. Em primeiro lugar, ela consolidou a aliança entre os francos e a Igreja Católica, já que foram eles os únicos capazes de deter os infiéis que ameaçavam a Cristandade. Em segundo lugar, efeito básico da guerra para um povo germânico, verificou-se um fortalecimento da autoridade central, com a nobreza guerreira unida em torno de um comando centralizador. Por outro lado, lembramos que esse comando está nas mãos não de um rei formal, mas sim de seu major domus, cujo poder, prestígio e liderança sobre a nobreza suplantavam em muito o poder do rei.

Pepino, o Breve

Foi o filho de Carlos Martel - chamado de Pepino, o Breve - quem representou a conclusão desse processo. Alegando ser portador de sangue real (afirmava ser filho de Carlos Martel com a rainha Batilde) e contando com o apoio dos nobres e da Igreja, ele depôs o último rei merovíngio, Childerico 3º, e fez-se coroar rei da França no ano de 751. Surgia aí uma nova dinastia, chamada de carolíngia, pelo fato de se originar em Carlos Martel.

Foi durante o reinado dos reis carolíngios que os francos atingiram o apogeu de seu poder na Europa. Pepino ampliou a aliança que existia, desde Clóvis, entre os francos e a Igreja. O elemento mais forte dessa ampliação foi a luta movida por Pepino contra os lombardos, que ameaçavam Roma. Detentores de domínios ao norte da Itália, os lombardos, um dos povos germânicos que havia invadido as terras do Império Romano durante o século 5, vinham penetrando cada vez mais para o centro da península, ameaçando Roma e, consequentemente, a Igreja.

O próprio papa, Estevão 2º, ante o risco de invasão de Roma, fora forçado a se exilar na França. Foi ali que ele coroou Pepino, o Breve como rei dos francos. Foi com apoio militar dos francos que o papa pôde retornar a Roma, com a derrota do rei dos lombardos, Astolfo, e com a Igreja tendo suas propriedades restituídas.

Três anos depois, entretanto, Astolfo voltou a atacar Roma. Pepino, o Breve ordenou nova invasão da Itália, derrotando definitivamente os lombardos. Como resultado, os lombardos cederam os territórios de Ravena e de Pentápolis a Pepino, que, juntando-os ao ducado de Roma, doou ao papa Paulo 1º, que substituíra Estevão 2º, originando o Patrimônio de São Pedro, ou Estados Pontifícios.

A ação de Pepino, o Breve foi decisiva para a ampliação dos domínios francos. A irreversível aliança estabelecida com o papado foi o fator de justificação ante os fiéis para que aceitassem a dominação franca. Tanto que as conquistas francas, ampliadas de modo drástico no reinado do filho de Pepino, o Breve, Carlos Magno, foram todas elas obtidas com o apoio da Igreja.

Renascimento Carolíngio

Carlos Magno assumiu o trono em 768. Empenhou-se em expandir seus domínios, anexando o norte da Itália, em mãos dos lombardos, submetendo a Saxônia, a Baviera e a Bretanha, estabelecendo o controle franco sobre o nordeste da península Ibérica, derrotando os ávaros e obtendo a submissão de boêmios, morávios e croatas. Fez do Reino Franco a mais extensa unidade administrativa da Europa ocidental.

Todas essas conquistas foram feitas, repetimos, tendo a Igreja como principal avalizadora e justificadora. Essa condição consolidou-se definitivamente quando, na missa de natal de 800, o papa Leão 3º coroou Carlos Magno Imperador dos Romanos. O título tinha uma conotação essencialmente religiosa, significando o imperador daqueles que seguiam a religião de Roma. Entretanto, acabou assumindo um significado muito maior, de uma ressurreição do Império Romano do Ocidente.

Claro que essa ressurreição dava-se em direta aliança com a Igreja Católica, a qual passaria a gozar de uma estrutura política forte para amparar seu crescente poder. Criava-se ali a dicotomia e a complementaridade entre o poder espiritual - representado pela Igreja e centrado na figura do papa - e o poder temporal, terreno, que tinha no imperador sua expressão máxima.

A administração do Império seguiu o modelo franco da divisão em condados (cerca de 200), passando os bispos também a exercerem um poder condal em suas cidades. Nas regiões fronteiriças Carlos Magno criou as Marcas, sob o controle de um funcionário, o que originou o termo "marquês". Estas medidas favoreceram o desenvolvimento dos poderes jurídico-militares regionais localizados.

Numa tentativa de manter algum controle central, Carlos Magno criou os missi dominici, funcionários que percorriam o império, fiscalizando a administração de condes e bispos. Mais do que eles, entretanto, o verdadeiro responsável pela manutenção de um mínimo de centralização foi o estado de guerra constante que caracterizou o governo de Carlos Magno. Ele multiplicou os domínios e as relações de vassalagem, colocando o rei no alto de uma estrutura minimamente organizada em termos político-militares.

A centralização política que parcela da Europa ocidental conheceu depois de mais de três séculos favoreceu um modesto desenvolvimento econômico, incapaz de reverter a ampla organização rural, e promoveu o chamado Renascimento Carolíngio. Escolas foram fundadas, os aristocratas estimulados a alfabetizarem-se, a corte tornou-se um centro de homens sábios e algo do passado cultural romano foi recuperado. O chamado Renascimento Carolíngio foi um fenômeno essencialmente cultural, diretamente apoiado na Igreja Católica.

Fim da dinastia carolíngia

Com a morte de Carlos Magno, em 813, o poder passou para seu filho Luís, o Piedoso, que governou até 840. Fortemente influenciado pela Igreja, Luís foi um monarca fraco. Terras da Igreja e domínios senhoriais conseguiam livrar-se do controle do poder central, tornando-se autônomos e livrando-se do cumprimento de suas obrigações para com o poder central.

Seu governo coincidiu também com uma nova onda de invasões, que caracterizaram toda a Europa ocidental do século 9. Vindos da Escandinávia, os vikings e seus navios de quilha rasa subiam os rios, espalhando a morte e a destruição por vastas áreas. Os sarracenos, piratas muçulmanos do norte da África, assolaram as zonas litorâneas da Itália e da França. E os magiares (ou húngaros), cavaleiros nômades das estepes da Ásia central, submeteram o norte da Itália e a Alemanha a contínuas incursões de pilhagem.

A morte de Luís significou o fim da unidade imperial. Seus três filhos repartiram o Império no Tratado de Verdun (843). Carlos, o Calvo, ficou com a França Ocidental (que deu origem ao Reino da França); Luís, o Germânico, com a França Oriental (a futura Alemanha); e Lotário, com a França Central, repartida após a sua morte, em 870, entre Carlos e Luís.

A autoridade real esfacelou-se rapidamente. Condes, duques e marqueses usurpam os poderes reais e passam a exercê-los em nível local. Em 877, os domínios, chamados então de feudos, tornam-se hereditários. Em 911, o rei Carlos, o Simples, incapaz de deter os ataques vikings, cedeu-lhes o ducado da Normandia, origem de sua outra denominação, normandos.

O ano de 911 viu também o fim do ramo germânico dos carolíngios, com a morte de Luís, o Jovem. Em 987, morrendo o último soberano carolíngio da França Ocidental, Luís 5º, os aristocratas escolheram Hugo Capeto, Conde de Paris, como rei.

Essa data assinala o fim da dinastia carolíngia sobre a França, dando origem à dinastia capetíngia, que governou o país até o século 14.

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