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ES: Escola reduz evasão, leva prêmios e põe professor entre top 10 do mundo

Aula na biblioteca da E.E.E.F.M. Antonio dos Santos Neves, no Espírito Santo - Divulgação
Aula na biblioteca da E.E.E.F.M. Antonio dos Santos Neves, no Espírito Santo Imagem: Divulgação

Thiago Varella

Colaboração para o UOL, em Campinas (SP)

11/03/2017 04h00

Quem chega a Boa Esperança, no norte do Espírito Santo, é praticamente recebido pela E.E.E.F.M. Antonio dos Santos Neves, a principal escola do município. O prédio azul do colégio estadual, rodeado por palmeiras, fica localizado em frente a uma acanhada estação rodoviária na região central da cidade. Deste lugar, partem ônibus que, todos os anos, levam ex-alunos do colégio para estudar em faculdades e universidades do Estado --incluindo aí algumas instituições públicas, como a UFES (Universidade Federal do Espírito Santo).

Foi nessa escola que, no ano passado, o professor Wemerson Nogueira, 26, deu aulas de ciências e química e ganhou diversos prêmios ao implantar um projeto que analisou as águas do rio Doce após a poluição causada pelo desastre ambiental em Mariana (MG) e que, ainda, criou um filtro d'água instalado em diversas residências do vilarejo de Regência, a última comunidade atingida pela tragédia. Graças a este projeto, Nogueira vai disputar, no próximo dia 19, em Londres, o Global Teacher Prize, considerado o maior prêmio que um professor pode ganhar no mundo.

Apesar de ter durado apenas um ano, já que o professor em 2017 se dedica a palestras e a aulas em uma universidade, a união entre Nogueira e a escola de Boa Esperança foi um sucesso. De um lado, um jovem que já vinha implementando projetos ousados em colégios públicos de sua cidade natal, Nova Venécia. De outro, uma escola comprometida a acabar com a evasão escolar e com a violência juvenil.

"Tudo o que está acontecendo comigo, eu devo à escola Antonio dos Santos Neves", contou Nogueira. "Quando eu cheguei lá, procurei a diretora, falei que queria desenvolver um projeto envolvendo a tragédia de Mariana. Ela abriu os braços, me abraçou e disse que eu estava junto com ela. Depois daquele apoio que ela me deu, eu não precisava de mais nada. A gente trabalhou assiduamente, pedindo apoio dos governos e de todos. Todas as medidas possíveis para o projeto dar certo, ela fez", completou. 

E.E.E.F.M. Antonio dos Santos Neves, no Espírito Santo - Divulgação - Divulgação
A entrada da escola
Imagem: Divulgação
A professora Adriana Merlo dirige a escola há 12 anos. Segundo ela, durante esse tempo, a escola conseguiu reduzir o abandono escolar e alcançar alguns destaques com projetos.

O colégio foi premiado quatro vezes pela Secretaria de Educação do Espírito Santo nos últimos anos. Um desses prêmios foi o de educador do ano, recebido pelo professor Wemerson Nogueira no ano passado. Os outros três foram de protagonismo juvenil, de redução do abandono escolar e de combate à violência.

Em 2015, Merlo se baseou em uma cartilha desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça para montar um projeto de combate à violência juvenil. Com o material formado, os professores trabalharam o tema em todas as salas, do primeiro ano do ensino fundamental até o terceiro do ensino médio. "Cheguei a trazer um rapaz que ficou preso muito tempo por conta do tráfico, voltou para a escola e hoje trabalha e concordou em voltar para a escola para contar sua experiência", explicou a diretora.

Já em relação ao protagonismo, ela direcionou as atividades dos alunos do período vespertino durante o recreio. Por fim, a diretora ainda criou uma rádio como forma de incentivar os estudantes a se preocuparem com a escola.

"Na hora do intervalo, além das atividades recreativas, temos uma rádio que funciona. Quem está no estúdio improvisado são os alunos. A emissora se chama Rádio Conexão Jovem e foi inaugurada em 2007. Cada sala de aula tem uma caixa de som. Tem também uma na quadra e no refeitório. Esse projeto contribuiu muito no combate ao abandono dos estudantes", disse.

Na área do esporte, um professor de educação física virou treinador de atletismo e, durante três anos, chegou a classificar estudantes nos Jogos Escolares Nacionais. Para Merlo, este projeto ajudou a afastar os alunos das drogas, um problema sério mesmo em uma cidade com pouco mais de 15 mil habitantes, como é o caso de Boa Esperança.

"O que nós queremos de verdade é fazer do jovem alguém que vê bem o mundo onde vive. Melhorar sua condição de vida. Não viemos nesse mundo por acaso. Enquanto profissional, acredito que tenho uma missão", afirmou Merlo. "A escola proporciona aulas e projetos que propiciam o aluno a querer buscar o conhecimento. Querer melhoria para a sua vida. Não só sair daqui com um diploma, mas com educação para a vida", completou.

A escola

A diretora contou que, como Boa Esperança não conta com instituições particulares de ensino, o colégio recebe os filhos das classes menos favorecidas e também das famílias mais ricas da cidade.

"Temos cerca de mil alunos e oferecemos o ensino fundamental, médio regular, integrado à educação profissional e a educação de jovens e adultos", explicou. Para ela, o perfil dos estudantes é bem diverso.

"Aqui existem alunos disciplinados, com expectativas para o futuro. A cada ano temos cada vez mais alunos que passam em universidades públicas. Temos observado essa mudança. Mas também temos alunos com baixas expectativas para o futuro. Nossa cidade já convive com o tráfico de drogas e com a violência juvenil", lamentou.

Uma história de sucesso da E.E.E.F.M. Antonio dos Santos Neves é o caso do jovem Raphael Ferrete Batista, 19. Ele estudou da sétima série ao terceiro ano do ensino médio no colégio e, hoje, cursa agronomia na UFES, no campus de São Mateus.

"Na escola, a gente nunca é tratado como mais um aluno. A equipe escolar trata cada aluno como um caso especial. A diretora conhece cada aluno", contou.

O contato é tão íntimo que Batista recebeu ajuda de professores para se reconciliar com seu pai depois de um período de discussões. O que o jovem se lembra com mais carinho são das atividades extraclasse.

"Participei da orquestra de violões, do coral da escola e do teatro. Nessas atividades, eu pude conviver com pessoas de outras salas. Além disso, a gente viajava e vivia culturas diferentes."

Professor foi parar 'sem querer' na cidade

Wemerson Nogueira conta que foi parar sem querer na cidade. "Eu estava participando do processo seletivo no Estado. No final de 2015, fazendo minha inscrição, eu, que sempre dei aula em Nova Venécia, acabei colocando a cidade errada e fui parar em Boa Esperança. Nem conhecia o lugar. Mas acho que foi providencial minha ida para lá", contou.

Focado no prêmio, Nogueira espera poder continuar ajudando os estudantes capixabas, seja em Boa Esperança, em Nova Venécia ou em qualquer outra cidade.

"Eu acredito que chegar na lista dos top 10 finalistas é uma grande vitória. Eu fico feliz em saber que existe uma fundação no mundo que promove essa fantástica experiência na vida dos professores do mundo inteiro. Se eu vencer o prêmio, quero buscar formação, criar um laboratório em Nova Venécia e formar mais professores", planejou.