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'Falaram que não era para mim': ele levou 8 anos para passar em medicina

Gabriel foi aprovado em três faculdades públicas de Medicina em SP - Arquivo Pessoal
Gabriel foi aprovado em três faculdades públicas de Medicina em SP Imagem: Arquivo Pessoal

Camila Corsini

Do UOL, em São Paulo

02/02/2023 04h00

O estudante Gabriel Jie Bang, de 25 anos, foi aprovado em medicina em três universidades públicas após oito anos de tentativas.

Ele recebeu a notícia de que passou em terceiro lugar na USP Bauru — uma das instituições mais concorridas do país — na última sexta. Também foi aprovado em primeiro lugar na Famerp (Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto) e na Famema (Faculdade de Medicina de Marília), ambas públicas, no interior paulista.

Ao UOL, Gabriel contou a trajetória de dificuldades até ver seu nome na lista de selecionados.

"Minha relação com a medicina começou no início do ensino médio. O colégio [privado em São José dos Campos] tinha curso técnico, então eu escolhi uma das áreas oferecidas para cursar. Optei por análises clínicas, pelo meu interesse no funcionamento do corpo humano.

No último ano do ensino médio, prestei vestibular para uma faculdade particular de Taubaté e cheguei bem perto de passar. Sabia que a concorrência não se comparava à de uma universidade pública, mas que estava no caminho certo.

Durante o primeiro ano de cursinho, trabalhei em um laboratório de análises clínicas, na coleta. Tive a vivência com pacientes e atendimento e isso me fortaleceu na certeza de que escolhi a área certa.

Com a rotina de trabalho, porém, conseguia estudar apenas à noite, de segunda a sexta — entre 19h e 23h. Nos finais de semana, tentava fazer simulados e treinar conteúdo, mas, quando o cansaço batia, eu descansava.

No ano seguinte, pretendia me dedicar integralmente aos estudos, mas não foi o que aconteceu. Recebi a notícia de que meu pai estava com um câncer de pulmão e foi um balde de água fria

Ele morreu em 2016 e precisei conciliar a vida no cursinho e os problemas consequentes da perda dele. Muitas pessoas vieram me falar que talvez medicina não fosse para mim. Que aquele era o momento em que minha família mais precisava de mim.

Ao mesmo tempo em que perdia as esperanças de ingressar em uma universidade pública, sabia que tinha de continuar tentando. Queria dar um significado para isso. Queria ter ajudado meu pai quando ele estava doente.

Os anos foram passando: tentei uma terceira, quarta, quinta, sexta, sétima vez?

O ano da aprovação

Gabriel, ao lado da irmã e da mãe - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Gabriel, ao lado da irmã e da mãe
Imagem: Arquivo Pessoal

2022 foi o ano em que menos estudei. Trabalhava no hemocentro de São José dos Campos e no comércio com minha família. O tempo, que já era escasso, ficou menor ainda.

E o fato de ter menos tempo talvez tenha contribuído para ficar menos nervoso e adotar estratégias diferentes na hora de estudar.

Selecionei conteúdos e os professores mais adequados à minha necessidade [ele fez cursinho no Poliedro]. No último ano, já não conseguia assistir a todas as aulas

'Segui meu ritmo'

Oito anos é um tempo muito extenso. Muitas coisas acontecem. Se alguém tivesse me falado que eu demoraria tudo isso para passar no vestibular, não acreditaria.

E também não sei se teria a mesma coragem. Precisei desse tempo para conseguir as aprovações. É um processo doloroso, em que passei por diversas frustrações

Abdicar da vida social é comum entre quem presta cursos concorridos. Tentava descansar ao máximo, até por causa do trabalho, e sair de vez em quando. Muitas vezes, quando saía, vinha à minha cabeça que meus concorrentes deveriam estar estudando.

Diante de tantas reprovações, é lógico que a gente fica abalado, mas entender que cada um tem a sua realidade foi essencial para mim. E me poupou da comparação com os outros. Segui meu ritmo e, no final, deu tudo certo."