O que define o analfabetismo funcional, que atinge 29% dos brasileiros?

O Brasil não reduziu o nível de analfabetismo funcional e segue com 29% da população de 15 a 64 anos sendo capaz de identificar apenas palavras isoladas ou ler frases muito simples. O resultado é da pesquisa Inaf (Indicador de Alfabetismo Funcional), divulgada hoje.

O que é analfabetismo funcional?

Um dos níveis de analfabetismo funcional é o absoluto. No país, 7% da população avaliada está nesse patamar e não consegue ler palavras e frases. Algumas pessoas ainda sabem ler números familiares, como o do telefone ou da casa, mas têm muita dificuldade para reconhecer e realizar operações básicas que envolvem tarefas simples da vida contemporânea.

Analfabetos funcionais no nível rudimentar sabem ler e escrever palavras e números. Segundo o Inaf, são capazes de localizar informações explícitas de forma literal em textos, conseguem entender materiais familiares —como recibo de mercado ou receita de bolo— e podem identificar o maior e o menor valor. Mas não conseguem fazer tarefas do cotidiano que envolvam textos um pouco mais longos e complexos ou que exijam alguma operação matemática mais elaborada. No Brasil, são 22% da população.

Níveis de alfabetização funcional

No campo dos alfabetizados, existe o alfabetismo elementar. Eles representam 36% dos brasileiros da pesquisa conseguem ler frases mais longas e localizar informações explícitas em textos de extensão média. Podem observar certas condições e realizar pequenas inferências, além de resolver operações básicas com números da ordem do milhar. Também conseguem comparar e relacionar informações numéricas ou textuais em gráficos ou tabelas simples que surgem no cotidiano doméstico ou social.

Já o alfabetizado funcional no nível intermediário corresponde a 25% da população. As pessoas já são capazes de localizar informação explícita ou não em textos diversos, como uma notícia de jornal ou texto científico, realizando pequenas inferências. Elas conseguem resolver problemas matemáticos envolvendo porcentagem e proporção, interpretar e elaborar textos diversos, reconhecer evidências e argumentos.

No topo da escala está o alfabetizado proficiente, que representa 10% dos brasileiros. São pessoas que conseguem ler e compreender integralmente notícias, textos opinativos, tabelas, gráficos e identificar nuances como ironia ou a distinção entre fato e opinião. Elas elaboram textos de maior complexidade com base em elementos de um contexto dado e opina sobre o posicionamento ou estilo do autor do texto.

Situação no Brasil

O impacto da pandemia atingiu especialmente os jovens. O percentual de analfabetismo funcional entre a população de 15 a 29 anos subiu de 14% em 2018 para 16% em 2024. Esse é o mesmo patamar verificado em 2018, ano em que a série histórica da pesquisa, publicada desde 2001, foi interrompida devido à pandemia de covid-19.

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Testes foram realizados com 2.554 pessoas de 15 a 64 anos, entre dezembro de 2024 e fevereiro de 2025. A economista Ana Lima, coordenadora do estudo, afirma que os dados surpreenderam negativamente. "Fenômenos desse tipo se movem muito lentamente; não esperávamos nenhuma revolução, mas nos impactou que o freio fosse mais forte do que imaginávamos."

Entre 50 e 64 anos, 51% dos brasileiros são analfabetos funcionais
Entre 50 e 64 anos, 51% dos brasileiros são analfabetos funcionais Imagem: Christian Rizzi/UOL

Desde o início da série histórica, o indicador mostrava uma redução progressiva no número de analfabetos funcionais no país. O aumento de dois pontos percentuais no nível de analfabetismo entre 2015 e 2018, para 29%, não foi considerado relevante, pois ficou dentro da margem de erro da pesquisa —de 2 a 3 pontos percentuais.

A pandemia não afetou apenas a educação formal, que passou a ser realizada a distância, por meio de aulas online, apostilas e até mesmo pelo rádio. "A falta de convivência em outros espaços de letramento, como trabalho, mercado e cinema, parece ter influenciado uma oscilação para baixo nos resultados", afirma Lima.

Historicamente, o nível de escolaridade é o maior indutor do alfabetismo no Brasil. Isso significa que, quanto maior o tempo de estudo, mais alfabetizado o indivíduo estará. Dados do ensino superior mostram que 88% dos jovens que ingressaram ou concluíram uma graduação são considerados plenamente alfabetizados, mas apenas seis em cada dez (61%) alcançaram o nível de alfabetização consolidada.

Entre 50 e 64 anos, mais da metade (51%) são analfabetos funcionais. O maior percentual de pessoas funcionalmente alfabetizadas está nas faixas de 15 a 29 anos (84%) e de 30 a 39 anos (78%). Essa faixa foi alvo das políticas de inclusão de crianças e jovens nas escolas nas últimas duas décadas.

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Raça e cor

O estudo revela que a desigualdade racial nos níveis de alfabetismo se mantém no Brasil. Em 2024, apenas 31% dos que se autodeclaram pretos e pardos alcançaram os dois níveis mais altos da escala de alfabetismo, contra 41% entre os brancos.

O cenário piorou em relação à edição anterior, quando esses percentuais eram de 33% e 45%, respectivamente. "Não tivemos surpresa. Mesmo com dados do IBGE mostrando que aumentou o nível de escolaridade entre as pessoas negras, a desigualdade em relação aos brancos ainda é muito grande", diz Lima.

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