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História geral

Índia - Domínio inglês na Índia mostra dois aspectos do colonialismo

Túlio Vilela

Imagine a seguinte cena: uma expedição liderada por um grupo de aristocratas ingleses, esnobes, sendo transportados nas costas de elefantes asiáticos, devidamente acompanhados por toda uma equipe de serviçais e carregadores nativos que caminham por uma floresta da Índia.

O objetivo dessa expedição seria algo reprovável para nossas mentes "ecologicamente corretas": uma caçada por esporte, pelo simples prazer de matar animais raros. No caso, a presa é o mais temido animal das selvas e florestas asiáticas: um tigre.

Vários filmes mostraram cenas semelhantes a essa. Também mostraram cidades em cujas ruas poderíamos encontrar serpentes saindo do interior de cestos, enquanto eram "hipnotizadas" pelo som de uma flauta. Sem falar em faquires deitados sobre camas de pregos e soldados britânicos vestindo casacas vermelhas.

Produzidos nos anos 1950 e 1960, esses filmes eram ambientados numa época que a Índia, terra de mistérios e exotismo, era uma colônia da Grã-Bretanha. Eram filmes que faziam sucesso, mas a maioria deles apresentava um retrato bastante superficial do que era a Índia no período da dominação britânica.

Em primeiro lugar porque muitos, mas não todos, mostram os indianos de maneira estereotipada, difundindo uma visão preconceituosa a respeito dos habitantes da Índia. Em segundo, porque a maioria desses filmes se baseava em ficções literárias, como, por exemplo, as obras do escritor britânico Rudyard Kipling (1865-1936), criador de Mogli, o menino-lobo, e não em fontes históricas propriamente ditas.

Presença europeia na Índia

Muito antes do domínio britânico, a Índia já atraía a cobiça dos europeus. Os primeiros a chegar foram os portugueses, que lá desembarcaram no século 16, quando estabeleceram feitorias ao longo da costa de Malabar. Depois dos portugueses, vieram holandeses, franceses e britânicos.

Os primeiros navios britânicos chegaram à Índia em 1612. Esses navios eram da Companhia Inglesa das Índias Orientais, que estabeleceu feitorias no litoral indiano. Nessas feitorias, eram feitas trocas comerciais: produtos indianos (seda, algodão, especiarias...) eram trocados por produtos manufaturados da Grã-Bretanha. Nessa época, quem governava a maior parte da Índia era o Império Mogol (não confundir com mongol), fruto da expansão muçulmana na região.

O Império Mogol guardava semelhanças com o feudalismo da Europa medieval: as diversas partes do império eram administradas por governantes locais, que deviam obediência ao imperador, de maneira semelhante aos suseranos europeus que dividiam o poder com seus vassalos.

O Império Mogol e o "buraco negro de Calcutá"

Inicialmente, as autoridades locais do Império Mogol não se opunham ao comércio com os britânicos. No entanto, em 1756, Siraj ud-Daula, o nababo da província de Bengala, se apossou de uma feitoria fundada pelos britânicos na cidade de Calcutá. O nababo era uma espécie de "vassalo" do imperador mogol.

Ao tomar a feitoria, ele causou grande prejuízo para a Companhia Inglesa das Índias Orientais: os investidores estimaram um prejuízo de cerca de dois milhões de libras esterlinas. O nababo também ordenou que 46 prisioneiros britânicos fossem encarcerados numa prisão minúscula e insalubre, da qual apenas 23 deles saíram vivos.

Entre os britânicos, essa prisão ficou conhecida pela infame alcunha de "o buraco negro de Calcutá". No entanto, ainda há controvérsias se o nababo estava ciente das péssimas condições da prisão. É possível que ele não tivesse sido informado a respeito disso. Seja como for, a vingança dos britânicos veio pouco depois: um pequeno exército liderado pelo inglês Robert Clive (1725-1774) marchou para o norte. Além de soldados britânicos, esse exército era, em grande parte, formado por nativos indianos.

No ano seguinte, o exército liderado por Clive acabou conquistando toda a província de Bengala, dando início ao processo de dominação britânica na Índia. Em 1858, com a tomada de Punjab, no norte do país, os britânicos consolidaram seu domínio.

Concorrência desleal

Com a Revolução Industrial, as indústrias de tecelagem britânicas passaram a exportar tecidos para a Índia. Essa exportação era feita pro intermédio da Companhia Inglesa das Índias Orientais, o que significou uma "invasão" de produtos britânicos no mercado indiano.

A Índia, que antes exportava tecidos para a Grã-Bretanha, passou a ser mera fornecedora de matérias-primas e importadora de produtos industrializados. Ironicamente, parte do algodão, que servia de matéria-prima para os produtos das indústrias de tecelagem britânicas vinha da própria Índia.

A maioria das tecelagens indianas faliu, pois nelas a produção ainda era feita de forma artesanal, incapaz de concorrer com os produtos industrializados vindos da Grã-Bretanha. A situação que colocou muitas famílias na miséria.

A "joia" do Império Britânico

A importância da Índia para o império colonial britânico era tal que ela passou a ser chamada de "a joia mais cara da coroa". O país rendeu muito tanto para os cofres públicos britânicos quanto para os bolsos de muitos homens de negócios da Grã-Bretanha.

Quem não tinha muitos motivos para comemorar era o povo indiano que enfrentou graves problemas durante o período da dominação britânica, dentre os quais, os constantes abusos e humilhações a que as autoridades britânicas submetiam os indianos.

Colonialismo e racismo

Coerentemente com as crenças racistas da época, os britânicos e os europeus de modo geral se julgavam superiores aos povos nativos da África e da Ásia. Essa visão racista era usada para justificar a expansão colonialista das potências europeias nesses continentes e apelava para argumentos pseudocientíficos, que mais tarde, no século 20, serviram de base para a ideologia nazista pregada por Hitler.

Segundo o discurso colonialista, os povos asiáticos e africanos eram incapazes de resolver seus próprios problemas e precisavam da "ajuda" dos europeus que estariam trazendo o "progresso" e a "civilização". Outro problema enfrentado pelos indianos eram as constantes crises de fome que abalavam o país.

Revolta dos Cipaios

Em 1857, teve início na Índia a rebelião que ficou conhecida como Revolta dos Cipaios, iniciada por soldados nacionalistas hindus. O objetivo da revolta era dar um fim à dominação britânica no país. Os rebeldes assumiram o controle da cidade de Délhi e receberam o apoio de príncipes locais.

Os jornais britânicos da época fizeram uma cobertura sensacionalista e tendenciosa dos fatos: os rebeldes foram descritos como "cruéis" e "fanáticos", ao mesmo tempo em que se omitia as razões que levaram à eclosão da revolta. A rebelião se estendeu até o ano seguinte, mas acabou sendo sufocada pelo exército britânico que se utilizou de canhões e metralhadoras.

A revolta foi um divisor de águas na história da presença britânica na Índia: para evitar novas rebeliões, as autoridades britânicas aumentaram ainda mais o controle sobre o território indiano. O governador-geral passou a representar diretamente os interesses da coroa britânica na Índia, assumindo o título de vice-rei. Em 1876, a rainha Vitória foi proclamada imperatriz da Índia. Como os britânicos, os indianos passaram a ser súditos da rainha Vitória.

Contradições coloniais

Toda forma de colonialismo é uma forma de dominação, de exploração e um desrespeito à soberania dos povos que são vítimas da colonização. O colonialismo britânico na Índia não foi exceção. No entanto, apesar disso tudo, a presença britânica também trouxe alguns benefícios para a Índia.

Em primeiro lugar, os britânicos deixaram como legado um idioma comum, o inglês, que tornou possível a comunicação entre as diversas etnias que habitam a Índia. É preciso lembrar que a Índia não é propriamente uma nação, mas várias, vivendo sob um mesmo território.

Cada uma delas tem sua própria cultura, suas próprias crenças religiosas e seu próprio idioma. A convivência entre essas etnias não é e nunca foi fácil. Os conflitos religiosos entre hinduístas, muçulmanos e outros são constantes. As autoridades britânicas também coibiram certas práticas violentas que eram então comuns em certos lugares da Índia: proibiram, por exemplo, o sati, ritual que consistia em cremar a viúva (ainda viva) junto com o corpo do falecido marido.

Também perseguiram os thugs (ou thuguees), uma seita de assassinos, adoradores da deusa Kali, que assaltavam e estrangulavam suas vítimas pelas estradas do país. Além disso, também modernizaram o país: construíram ferrovias, telégrafos e fundaram universidades, o que permitiu o surgimento de uma elite letrada indiana. O próprio Gandhi (1869-1948), um dos principais líderes da luta pela independência da Índia, figura-chave no processo de descolonização do país, estudou Direito em Londres, a capital inglesa.

Terra de contrastes

Para o bem ou para o mal, a presença britânica na Índia deixou marcas. Essa presença foi marcada por contradições, o que ainda é uma característica da Índia moderna, terra de contrastes sociais.

Hoje, a Índia chama a atenção tanto pelo que possui de tradicional, de milenar, quanto pelo que possui de moderno, de dinâmico. Ao mesmo tempo em que enfrenta problemas socioeconômicos graves (fome, miséria, superpopulação, conflitos étnicos e religiosos, concentração de renda, crescimento urbano desordenado...), a Índia é uma das principais economias emergentes, com taxas de crescimento expressivas, que exporta programas de computadores para empresas do mundo inteiro.

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