Primavera Silenciosa

Reportagem mais importante do século XX

Dida Bessana

Uma das reportagens investigativas mais importantes do século XX. Assim a Escola de Jornalismo de Nova York classificou, em 2000, 38 anos após seu lançamento, o livro "Primavera Silenciosa". Já sua autora, Rachel Carson, foi alçada em dezembro de 2006, pelo jornal britânico "The Guardian", ao primeiro lugar da lista das cem pessoas que mais contribuíram para a defesa do meio ambiente em todos os tempos.

Nascida em 27 de maio de 1907 numa fazenda na Pensilvânia, Rachel Louise Carson, incentivada por sua mãe, publicou seus primeiros trabalhos aos dez anos na revista literária infantil "Sr. Nicholas", a mesma revista que revelara Scott Fitzgerald e William Faulkner. Em 1928, licenciou-se na Universidade para Mulheres da Pensilvânia e quatro anos mais tarde fez mestrado em Biologia Marinha na Universidade Johns Hopkins. Depois de lecionar zoologia na Universidade de Maryland por curto período, em 1936 aceitou um emprego como bióloga no Departamento de Pesca e Vida Selvagem dos Estados Unidos. Entretanto, em pouco tempo passou dos scripts sobre os oceanos (que fazia para programas de rádio) aos livros.

Movida pelo desejo de compreender o mar de uma perspectiva não humana, escreveu "Under the Sea-Wind", publicado em 1941, em que apresentava o ciclo vital do pilrito-das-praias, uma ave marinha conhecida por sua árdua jornada da Patagônia ao Círculo Ártico. Dez anos depois, após extensa pesquisa sobre oceanografia, redigiu "O Mar que nos Cerca", publicado em série pela revista "The New Yorker", e o qual lhe rendeu diversos prêmios, dentre eles o National Book Award na categoria não ficção, e uma bolsa da Fundação Guggenheim (1951-52). Eleita para a Academia de Artes e Letras dos Estados Unidos, foi reconhecida por seus conhecimentos científicos e estilo poético. O último livro da trilogia, "The Edge of the Sea", de 1955, tornou-se imediatamente um best-seller e a consagrou definitivamente.

Com seu nome consolidado como a principal escritora de ciências do país, Rachel Carson retomou um antigo projeto: combater o uso indiscriminado de pesticidas de longa ação residual. Se em 1945 sua primeira tentativa de atrair o interesse da revista "Reader's Digest" para os danos ambientais causados pelo uso disseminado de inseticidas à base de hidrocarbonetos clorados e fósforo orgânico falhara, agora, mais de uma década depois, Rachel Carson estava em condições de provar sua tese: produtos sintéticos como o DDT alteravam os processos celulares das plantas, dos animais e, por extensão, dos seres humanos.

Com uma linguagem de fácil compreensão e usando inteligentemente o conhecimento do público sobre as radiações, nos poucos meses entre a publicação em série de "Primavera Silenciosa" na revista "The New Yorker", em junho, e o lançamento em livro, em setembro, seu alerta desencadeou um debate nacional sobre o uso de pesticidas químicos, sobre a responsabilidade da ciência e sobre os limites do progresso tecnológico, dando início a uma transformação na relação entre os seres humanos e o mundo natural e incitando o despertar da consciência ambiental.

"A 'Primavera Silenciosa' se transformou em um verão ruidoso", afirmou na época o jornal "The New York Times". De imediato, o livro inspirou a rede de TV CBS a fazer um documentário sobre os efeitos do DDT, comprovadamente um cancerígeno, e desencadeou intensa investigação no Senado. Anteriormente detratada por representantes da indústria química e por vários cientistas, inclusive por Paul Müller (que em 1948 recebeu o Prêmio Nobel de Medicina por ter descoberto as propriedades inseticidas do DDT), Rachel Carson depôs perante a Comissão do Congresso pouco antes de sua morte precoce, em 1964, e sustentou que um dos direitos humanos mais básicos deveria ser o "direito do cidadão de estar protegido em seu lar contra a intrusão de venenos aplicados por outras pessoas". Por ignorância, cobiça e negligência", asseverava ela, "o governo permitira que substâncias químicas venenosas e biologicamente potentes" caíssem "indiscriminadamente nas mãos de pessoas ampla ou totalmente ignorantes de seu potencial de danos". Tais produtos, em sua opinião, "não deviam ser chamados 'inseticidas', e sim 'biocidas'".

Dez anos após a publicação de "Primavera Silenciosa", a produção doméstica do DDT nos EUA foi proibida e criada a Agência de Proteção Ambiental Norte-Americana. Já em 2001, representantes de 120 países assinaram a Convenção de Estocolmo, um tratado internacional que visa a eliminar mundialmente a produção e o uso das substâncias mais tóxicas produzidas pelo homem, conhecidas como POPs, ou como "os 12 sujos", entre os quais figura o DDT.

Esta nova edição de "Primavera Silenciosa" tem introdução de Linda Lear, autora de "Rachel Carson, Witness of Nature", e posfácio de Edwar O. Wilson, autor de "Da Natureza Humana" e "The Ants", ambos ganhadores do Prêmio Pulitzer.


A Primavera Silenciosa 

Rachel Carson

Tradução: Claudia Sant'Anna Martins

Gaia Editora

328 páginas

é historiadora e jornalista.

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