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O que pedir para Papai Noel

Lucila Cano

14/12/2012 17h12

Religioso, ou não, nesta época do ano dificilmente alguém escapa do espírito do Natal. Conduzidos pela crença, ou pressionados pelas convenções sociais, embarcamos em um período de sentimentos e ações contrastantes. 

Ao consumo em alta se contrapõe a chama da solidariedade e a grande maioria, independentemente de sua condição econômica, realiza alguma boa ação. Ainda bem. 

Depois de um ano de muitas atitudes impensadas e respectivas consequências, proclamam-se promessas de toda ordem. As campeãs na preferência mundial referem-se ao fim dos excessos e à mudança de hábitos. 

À perspectiva de virada do calendário, multiplicam-se os desejos pessoais por bens materiais e poder, embora os cumprimentos e mensagens insistam no cunho universal de paz e fraternidade. 

Desejos

A propaganda, via de regra, interpreta muito bem o comportamento humano. Ao ouvir a “voz do além” que avisa que “o seu desejo foi realizado”, uma aspirante a miss pergunta: “Alcançamos a paz mundial?”. “Não”, complementa a voz, “é o outro desejo”.  O comercial, que ainda deve estar em exibição em alguns lugares, termina com o esclarecimento de que o outro desejo é o carro com IPI reduzido.

A ironia fina e o bom-humor, marcas registradas da propaganda inteligente, são fios condutores de grandes verdades. Este ano Papai Noel anda reticente quanto aos pedidos de paz mundial. Quem sabe, para o próximo Natal ele consegue?

Outros pedidos mais singelos poderiam ser mais facilmente atendidos pelo bom velhinho. Mas, não custa nada lembrar, alguns itens de extrema necessidade permanecem em falta nos postos que abastecem o trenó natalino. Entre eles, destaco: comida e água para todos, saúde para todos, educação para todos, creches para todos, transporte público para todos, moradia para todos, justiça para todos, trabalho para todos. 

A escassez talvez se deva à etiqueta “para todos”, a mais admirada e desejada, não só no Brasil, mas em todos os cantos do planeta. Deve ser por isso que nem sempre Papai Noel acerta na encomenda. No mundo globalizado em que vivemos, ele bem que merece uma carta de crédito. No entanto, ela de nada serve diante de tantas restrições, embargos, burocracia, impostos, desvios, subsídios. 

Vagas

Poderia continuar citando inúmeros outros empecilhos ao bom desempenho de Noel, como as graves alterações climáticas e os desastres naturais cada vez mais frequentes. Mas, vamos e venhamos, sabemos todos que nem tudo depende dele. Vontade política e gestão pública para que alguns sonhos se materializem estão a cargo de outros protagonistas.

Não temos o direito de por fim ao sonho do Natal. A esperança de que tudo pode melhorar para todos é, no íntimo, o que move todos nós. Parece uma meta inalcançável, assim como a paz mundial, mas não descabida.

A começar por nossos próprios pedidos, que poderiam ser mais modestos, embora leves e enriquecedores. Coisas como paciência, serenidade e humildade para reaprender lições básicas de convivência e cidadania.

Acredito que também podemos pedir força para o trabalho, inspiração para práticas éticas e renovadoras e uma dose diária de fraternidade. 

Além do Natal, Noel tem vagas o ano inteiro para colaboradores dispostos a doar um pouco de si a quem precisa. 

Pode ser um brinquedo, um agasalho, um copo d’água ou um prato de comida. Pode ser um sorriso, um afago, uma gentileza.

Pode ser uma palavra, a leitura de páginas e páginas de um livro, ou simplesmente ouvir. Pode ser a orientação, o ensinamento, o incentivo, a brincadeira.

Pode ser um minuto de silêncio e, por que não, até um pensamento em favor da paz mundial.

Possivelmente, antes de fazer pedidos a Noel, descobriremos que temos muito mais a oferecer do que a pedir.

 

* Homenagem a Engel Paschoal (7/11/1945 a 31/3/2010), jornalista e escritor, criador desta coluna.