Eutanásia - É correto adiar indefinidamente a morte dos doentes?
Deve existir um limite para a utilização dos benefícios trazidos pelo avanço tecnológico? Apesar de os direitos individuais serem cada vez mais reconhecidos e a família chamar para si a decisão pelo destino dos seus, os dilemas éticos se acumulam, sem que haja uma resposta rápida no biodireito quanto às circunstâncias que envolvem o término da vida.
Não é de hoje que a eutanásia, do grego euthanásia - "eu" significando "bem" e "thanatos", "morte" - a morte serena, sem sofrimento, prática pela qual se busca abreviar a vida de um doente reconhecidamente incurável, gera discussões calorosas. Frank Bacon, no século 17, foi o primeiro a lançar a idéia de eutanásia ao afirmar:
As afirmações de dois juristas espanhóis na década de 30 já nos oferecem uma idéia da polêmica que o assunto levantou desde então:
Eu creio que a missão do médico é a de devolver a saúde e aliviar os sofrimentos e as dores, não só quando esse alívio pode levar à cura, como também quando pode servir pra proporcionar uma morte indolor e calma. Ao contrário, os médicos consideram um escrúpulo e uma religião atormentar, entretanto, o enfermo, ainda quando a enfermidade é sem esperança. Ao meu modo de ver, em vez disso, eles deveriam possuir a habilidade necessária a dulcificar com suas mãos os sofrimentos e a agonia da morte. |
Ariosto Licurzi: A última vitória da medicina – frente à sua impotência científica – quando é impossível triunfar sobre o mal incurável, será adormecer o agonizante na tranqüila sonolência medicamentosa que leva ao letargo e à morte total, suavemente. |
Royo-Villanova y Morales: Para mim, que sou um otimista, a vida, por pior que seja, é sempre a vida; prefiro viver tarado com todos os estigmas, saturado de mil enfermidades, coberto de todos os opróbrios... a não viver. |
Na história da humanidade encontramos várias sociedades onde a eutanásia foi praticada. No Japão, os anciãos eram levados pelos filhos mais velhos para locais determinados, e ali permaneciam sem alimento até morrerem. O rio Ganges, na Índia, recebeu muitos corpos de pacientes com doenças incuráveis. Em Esparta, os recém-nascidos malformados eram precipitados do alto do monte Taijeto.
Os birmaneses enterravam vivos os idosos e os enfermos graves. Aos condenados à crucificação, em Roma, davam uma bebida que, depois de ingerida, produzia um sono profundo e prolongado, durante o qual o crucificado não sentia nem os mais cruentos castigos, e por fim caía em letargo passando à morte insensivelmente. Na Grécia, o Estado concedia autorização e proporcionava o veneno para uma pessoa matar-se.
Ativa, quando solicitada pelo paciente, ou, no caso de sua impossibilidade de manifestação, pelos familiares, com a utilização de meios próprios, passiva, pela suspensão de meios artificiais, ou eugênica, para fins de aperfeiçoamento racial, a eutanásia, permitida em poucos países. Ela não é permitida no Brasil. Entretanto, cada vez mais o desenvolvimento tecnológico acrescenta ao profissional de saúde, ao paciente e aos familiares, uma angústia quase insuportável.
Ortotanásia e distanásia
Qual seria, então, o momento certo para a morte, aquilo que alguns autores chamam de ortotanásia (orto de correto), que evite prolongamentos desnecessários da vida, tratamentos obstinados, morte lenta, ansiosa e com muito sofrimento, ou seja, uma distanásia (dis de distanciamento)?
Não devemos nos esquecer que, principalmente nos países mais pobres, deparamo-nos com os que alguns autores denominam de Mistanásia, que seria a morte miserável, daqueles que nem chegaram a ser doentes por impossibilidade de acesso aos serviços de saúde, vítimas de erro, má-prática de ordem econômica, científica ou sóciopolítico.
Uma coisa é certa, há cada vez mais o consenso de que ao invés de curar obstinadamente, devemos cuidar. Se a medicina não preserva a vida ou alivia o sofrimento, é moral parar o que é inútil e amenizar o desconforto do doente que passa a ser o foco de atenção, e não a doença.
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