Luís da Câmara Cascudo - Uma obra fundamental para conhecer o folclore brasileiro
Oscar D'Ambrosio, Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação
- A gulosa disfarçada
- O papagaio real
- O diabo na garrafa
- O príncipe Lagartão
- Três ladrões de ovelha
- O padre, o estudante e o caboclo
- Sapo com medo d'água
- A onça e o bode
- Os sete sapatos da princesa
- Cobra Norato
- Luís da Câmara Cascudo
"O Brasil não tem problemas, só soluções adiadas". Esta frase mostra bem o universo mental do historiador, antropólogo, advogado e jornalista potiguar Luís da Câmara Cascudo (1898-1996). Autor de aproximadamente 190 livros, plaquetes e traduções, possui uma obra ampla e fundamental para mergulhar no folclore brasileiro.
De sua extensa produção, alguns livros são indispensáveis. O mais conhecido é o "Dicionário do Folclore Brasileiro". Lançado em 1954, após uma década de pesquisa, contou em sua elaboração com uma equipe informal de amigos do autor por todo o Brasil. Embora peque nas referências bibliográficas exatas ou acadêmicas, conquista pela quantidade e qualidade das informações.
Outra referência obrigatória é "História da Alimentação no Brasil". Publicado em 1967, teve o patrocínio do jornalista Assis Chateaubriand, responsável pelo financiamento das viagens de Cascudo a África, continente onde o autor estudou as raízes de uma parte fundamental da culinária brasileira.
Gestos e charutos
As outras duas obras são de 1973. "Civilização e Cultura" focaliza a etnografia, definindo, por exemplo, vocábulos essenciais em pesquisas nas áreas de sistemas de ideias, conhecimentos teóricos e organização social, religiosa e estética. Fica evidente aqui o amor do autor pelas línguas grega e latina numa busca constante pela origem das palavras. "O vício da literatura grego-latina vacinou-me contra as ditaduras mentais contemporâneas", comentava.
Outra importante criação é "História dos Nossos Gestos". Trata-se de uma pesquisa diferenciada que conta, com muitas curiosidades e detalhes, a história e a evolução de 333 gestos comuns no país. Cada um deles é visto como um elemento portador de grande quantidade de informação e pleno de sentido cultural.
Amigo de outro grande folclorista, Mario de Andrade, Câmara Cascudo amava seu charuto ("O charuto é quase uma extensão do meu rosto. Este é um dos meus vícios, é vício confessável, exibido. Um bom charuto é um prazer cotidiano, mágica fumaça consoladora") e sua rede ("Meu pai dizia que a rede fazia parte da família. A rede colabora no movimento dos sonhos").
Jornada pessoal e poética
Mergulhava às vezes em silêncios demorados que a esposa definia como "uma viagem de Câmara Cascudo a Câmara Cascudo". Nessa jornada pessoal e poética, tornou-se referência em pesquisa de cultura popular e se aproximou dos ideais da Semana de Arte Moderna de 1922 no sentido de preferir a observação da cultura cotidiana do povo às imitações nacionais do universo europeu.
Foi Mário de Andrade quem, em carta enviada em 1937, instigou o amigo potiguar a abandonar as biografias de personalidades históricas oficiais como Solano López e o Conde D'Eu. Para o autor de "Macunaíma", o intelectual potiguar devia se dedicar a "escritos caídos das bocas e dos hábitos que você foi buscar na casa, no mocambo, no antro, na festança, na plantação, no cais, no boteco do povo".
Cascudo era um observador de detalhes. Sua percepção do cotidiano do povo brasileiro o tornou uma referência não só do folclore no sentido de ter a sensibilidade de valorizar as lendas populares, mas principalmente de considerar as cantorias e danças brasileiras como expressões de um saber legítimo e fascinante.
Um professor
Filho do coronel Francisco Cascudo, que fora inicialmente caçador de cangaceiros e, mais tarde, dono, em Natal, RN, do jornal "A Imprensa", Luís tem um papel fundamental na cultura brasileira na preservação de contos e histórias que recolhe e transcreve a partir de relatos orais. É o que se vê em obras como "A Literatura Oral no Brasil", "Contos Tradicionais do Brasil" e "Lendas Brasileiras".
Mesmo fora do eixo Rio-São Paulo, Câmara Cascudo ganhou um espaço ímpar na cultura brasileira. Lecionou na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), que hoje tem um Instituto de Antropologia que leva o seu nome. Embora fosse chamado de folclorista, não gostava dessa denominação. "Faço questão de ser tratado por esse vocábulo que tanto amei: professor. Até hoje minha casa é cheia de rapazes me perguntando, me consultando", dizia.