Migrações e xenofobia - Motivação política e econômica
Ricardo Silva
Migrações internacionais são movimentos de saída e chegada de pessoas entre países. É importante ressaltar que o termo migração internacional pode ser subdividido em emigração (refere-se a pessoas que saem do país) e imigração (refere-se a pessoas que entram no país).
Os impulsos migratórios são, geralmente, motivados por questões econômicas: de um lado, ligados a fatores de repulsão de emigrantes (crises econômicas, guerras, conflitos em geral, fome, etc.); e, de outro, a fatores de atração (oportunidades de emprego, sonhos de enriquecimento rápido, melhoria na qualidade de vida, etc.).
A título de exemplo, a Europa, em meados do século 19 e início do 20, passava por uma explosão demográfica (devido ao desenvolvimento de técnicas médico-sanitárias e o consequente aumento da natalidade) que, aliada à crise na produção agrícola e à fome (motivadas por sucessivas guerras), impulsionaram a saída de muitos europeus em direção a países do continente americano, movidos pelos sonhos do acesso à terra e do enriquecimento rápido.
Foi justamente com esses e outros tantos sonhos que, entre 1884 e 1933, quase 4 milhões de imigrantes desembarcaram no Brasil (alemães, espanhóis, portugueses, italianos, japoneses, turcos, sírios, entre outros), com destaque para os italianos, que somavam algo em torno de 1,5 milhão de pessoas.
Novos fluxos migratórios
Em meados do século 20, os fluxos migratórios internacionais conheceram uma inversão. Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), existem cerca de 200 milhões de migrantes no mundo, sendo que 60% deles são pessoas que saíram de países subdesenvolvidos rumo a países desenvolvidos, tendo como principais destinos os Estados Unidos (35 milhões, em 2000), a Europa (56 milhões, em 2000) e o Japão (1,5 milhões, em 1998).
Porém, esse novo fluxo de imigração internacional, acirrado pelas desigualdades entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos, deve ser entendido a partir de dois momentos.
O primeiro deles ocorre entre a década de 50 e fins da de 70, quando alguns países da Europa, os Estados Unidos e o Japão estimulavam a imigração, a fim de conseguir mão-de-obra para ocupar as vagas de menor qualificação e baixa remuneração, desprezadas por suas populações locais. Os imigrantes, então, eram bem-vindos, mas controlados. Geralmente, na Europa, chegavam imigrantes vindos de suas colônias (ou ex-colônias); nos Estados Unidos, mexicanos eram convocados a trabalhar no campo através do "bracero program"; e, no Japão, os "dekasseguis" (trabalhadores brasileiros com ascendência japonesa) eram bem recebidos.
Quanto ao segundo momento, da década de 80 em diante, a intensificação do processo de globalização e a ascensão do neoliberalismo trouxe maior pressão à abertura dos mercados e acelerou o desenvolvimento técnico-científico, o que possibilitou maior aceleração da produção e da circulação de mercadorias no mundo - e menor (ou diferenciada) participação do Estado nos assuntos ligados à economia.
Todos esses elementos acabaram permitindo às indústrias dos países ricos que elas migrassem pelo mundo, em busca de novos mercados e de mão-de-obra barata, gerando crescente desemprego e diferenças salariais entre os trabalhadores dos países desenvolvidos.
Desse período em diante, com exceção dos trabalhadores com alto grau de qualificação vindos de países mais pobres (a chamada "fuga de cérebros"), os trabalhadores com baixa qualificação já não seriam mais bem-vindos, pois passariam a disputar diretamente os postos de trabalho com parte da população local, gerando cada vez mais discriminação e preconceito.
Xenofobia
Diante do que vimos acima, a xenofobia (do grego, "xeno" = estrangeiro e "fobia" = medo), entendida como aversão ao imigrante, iria se tornar cada vez mais patente nos países desenvolvidos. Isso devido, basicamente, às diferenças sócio-culturais existentes entre pessoas de países diferentes e, principalmente, à relação tensa entre os trabalhadores dos países ricos e os estrangeiros, vindos de países mais pobres, que disputam os mesmos postos de trabalho.
A partir de então, os governos desses países ricos passaram a criar medidas legais e até mesmo barreiras físicas (muro na fronteira dos Estados Unidos com o México, muro na cidade de Celta, Espanha), de modo a dificultar cada vez mais a entrada de imigrantes.
Tais medidas, no entanto, só têm conseguido aumentar a migração ilegal. Acredita-se que entram em torno de 2,5 a 4 milhões de migrantes sem autorização nos países ricos. Nos Estados Unidos, estima-se que existam mais de 10 milhões de migrantes ilegais; na Europa, cerca de 6 milhões.
O grande desafio entre os países ricos e pobres, mais do que construir muros e elaborar leis que impeçam a entrada de migrantes, talvez seja a construção de um mundo mais justo e igualitário no século 21, pois, como dizia o geógrafo Milton Santos: "Apenas o acontecer próprio a um lugar não é indiferente ao acontecer próprio a um outro lugar, exatamente pelo fato de que qualquer que seja o acontecer é um produto do movimento da sociedade total".