Bálcãs - nasce a Iugoslávia - Das guerras balcânicas ao reinado de Alexandre 1º
Érica Turci
- Bálcãs - Região é marcada por divisões históricas
- Bálcãs - 2ª Guerra Mundial
- Bálcãs - o período pós-Tito
- Bálcãs - conflitos entre etnias
No início do século 19, a Península Balcânica estava dividida entre o Império Turco-Otomano - que controlava a Sérvia, a Macedônia, o Kosovo e o Montenegro (ou seja, o sul e o leste) - e o Império Austro-Húngaro, que dominava a Eslovênia, a Croácia, a Bósnia-Herzegovina e a Voivodina (ou seja, o norte e o oeste).
Além disso, depois de várias décadas de conflitos entre austro-húngaros, turcos e eslavos, de inúmeras migrações dos sérvios, da conversão de uma parte da população eslava ao islamismo e da migração dos albaneses para Kosovo, a região se transformou numa enorme confusão de povos:
República | Principal etnia (%) | Segunda principal etnia (%) | Terceira principal etnia (%) |
Eslovênia | Eslovenos - 91,0 | Croatas - 3,0 | Sérvios - 2,2 |
Croácia | Croatas - 78,0 | Sérvios - 12,2 | Outros - 10,6 |
Bósnia | Bósnios muçulmanos - 43,7 | Sérvios - 31,4 | Croatas - 17,3 |
Sérvia | Sérvios - 65,8 | Albaneses - 17,2 | Húngaros - 3,5 |
Montenegro | Montenegrinos - 61,8 | Montenegrinos muçulmanos - 14,6 | Sérvios - 9,3 |
Macedônia | Macedônios - 54,6 | Albaneses - 21,0 | Turcos - 4,8 |
- *Na Sérvia, no território de Kosovo, os albaneses representam 90% da população, enquanto que, em Voivodina, os húngaros representam 20%. ** Bósnios e montenegrinos muçulmanos são mencionados especificamente para ressaltar a quantidade de eslavos convertidos ao islamismo. Fonte: OLIC, Nelson Basic. A desintegração do Leste. Editora Moderna.
A Grande Sérvia
No século 19, a Europa passou a ser palco de inúmeros movimentos nacionalistas. Nos Bálcãs se difundiu o pan-eslavismo, uma forma de nacionalismo que defendia a independência e a união dos eslavos.
As duas primeiras regiões eslavas que conseguiram a independência foram a Sérvia e o Montenegro, em 1878. A partir de então, o nacionalismo cresceu entre os sérvios, que queriam a formação da Grande Sérvia: um Estado que englobasse todos os povos eslavos dos Bálcãs, inclusive pelo fato de que os vários territórios da região abrigavam minorias sérvias.
Nesse clima nacionalista, entre 1912 e 1913 estouraram as Guerras Balcânicas, transformando as fronteiras e as relações políticas da região. Os turcos, muito enfraquecidos há anos, perderam o controle sobre os Bálcãs, enquanto que a Sérvia incorporou a Macedônia e o Kosovo.
Além disso, na Bósnia-Herzegovina, terroristas que apoiavam a formação da Grande Sérvia promoviam atentados contra o Império Austro-Húngaro. Em junho de 1914, um atentado acabou por assassinar Francisco Ferdinando, herdeiro do trono austro-húngaro.
Tal incidente foi o estopim para o início da 1ª Guerra Mundial (1914-1918), pois os austro-húngaros declararam guerra à Sérvia, enquanto a Rússia apoiou os sérvios. A Alemanha, aliada do Império Austro-Húngaro, invadiu a Bélgica, a fim de forçar a Grã-Bretanha e a França, aliadas da Rússia, a entrarem na guerra.
O Reino da Sérvia, Croácia e Eslovênia
No final da 1ª Guerra, croatas e eslovenos sugeriram a formação de uma "Iugoslávia", ou seja, um Estado dos "eslavos do sul", pois queriam se ver livres do domínio dos austríacos e húngaros. Tal Estado foi pensado por eles "(...) para não nos submetermos de forma alguma aos Bálcãs, que são uma extensão da Ásia. Nosso dever é europeizar os Bálcãs, e não balcanizar croatas e eslovenos" (Etienne Radic, político croata).
As diferenças culturais dos "eslavos do sul" eram enormes: Eslovênia e Croácia estavam mais ligadas à Europa e, por esse motivo, em constante mudança para se adaptarem à economia de mercado e à expansão capitalista, enquanto a Sérvia guardava os traços culturais da Ásia Menor, mais conservadora e fechada à influência capitalista europeia.
Mas esses pormenores não foram levados em conta pelos países vitoriosos da 1ª Guerra (Grã-Bretanha, França e Estados Unidos) quando, nos tratados do pós-guerra, dissolveram o Império Austro-Húngaro, garantindo a formação de um novo país no sudeste europeu: o Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos, com capital em Belgrado (capital da Sérvia), sendo o rei da Sérvia, Alexandre 1º, o governante do novo reino.
O novo Estado englobava a Sérvia (Macedônia e Kosovo já faziam parte dos domínios sérvios), o Montenegro, a Eslovênia, a Croácia, a Bósnia-Herzegovina e a Voivodina, formando o que era, aparentemente, o anseio dos povos eslavos, mas que resultou no domínio da Sérvia sobre a região, exatamente o contrário do que havia sido proposto pelos croatas e eslovenos.
A primeira Constituição do reino, votada em 1921, não agradou a grande maioria dos eslavos, fazendo com que as disputas nacionalistas levassem a graves conflitos étnicos: os sérvios, espalhados por todo território, passaram a ser atacados por eslovenos, bósnios e croatas, que lutavam por autonomia.
Aproveitando essa situação crítica, Alexandre 1º suspendeu a Constituição e impôs uma ditadura (1929), batizando o reino de Iugoslávia e impondo a nacionalidade iugoslava como a única aceita pelo novo Estado, contando que, dessa forma, anularia a fragmentação histórica, cultural e nacional dos diversos povos.