Romantismo no Brasil (4) - Romance indianista
Antonio Carlos Olivieri, Da Página 3 Pedagogia & Comunicação
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O romantismo no Brasil encontrou no "mito do bom selvagem" uma maneira de enaltecer a cultura nacional. A produção com temática indígena ficou conhecida como "romance indianista".
Como contraposição ao português, nosso conquistador e colonizador, ou mesmo ao europeu, e devidamente distanciado do negro escravo, também "estrangeiro", o índio tornou-se o símbolo do homem brasileiro, de sua origem e originalidade, de seu caráter independente, puro (de "bom selvagem"), bravo e honrado.
Ressalve-se, porém, que esse índio é compreendido através da óptica idealizadora do romantismo e está longe de corresponder a uma aproximação da realidade do índio brasileiro. Simboliza, antes, os ideais de heroísmo e humanidade das camadas cultas de nossa sociedade imperial.
No Romantismo europeu, esse papel foi exercido pela figura do cavaleiro medieval, personagem histórica da época de origem e formação das nações europeias, que desempenhou o papel de herói em obras como "Ivanhoé", do escritor escocês Walter Scott, ou "Eurico, o presbítero", do português Alexandre Herculano.
Todo dia era dia de índio
Substancialmente, o Indianismo está presente em nossas obras literárias românticas, enquanto idealização e valorização do índio, e também enquanto registro ou invenção imaginária de seu modo de vida, costumes e crenças, bem como de sua linguagem. Na época, tiveram impulso os estudos da língua tupi antiga, cujos vocábulos foram a partir de então aos poucos integrando a linguagem culta do Português escrito no Brasil.
Os exemplos mais evidentes e significativos desse Indianismo podem ser encontrados na poesia de Gonçalves Dias e na prosa de José de Alencar, com destaque na obra deste último para "O Guarani", "Ubirajara" e "Iracema". Mais discretamente, porém, e bem antes de Alencar, o Indianismo romântico não deixa de se manifestar nos capítulos 9 e 10, de "A Moreninha", de Joaquim Manuel de Macedo, em que se conta o amor do casal indígena formado por Ahy e Aoitin.
Sob o ponto de vista cronológico, a partir de 1836, podem-se identificar características românticas nas obras de autores brasileiros, com maior ou menor intensidade, brilho e originalidade. Este ano é considerado o marco inaugural do Romantismo no Brasil, devido à publicação de "Suspiros poéticos e saudades", livro de poemas de Gonçalves de Magalhães, e da revista "Niterói", onde se agruparam poetas e letrados brasileiros.
Publicados em Paris, refletindo claramente que seria essa agora a nossa referência cultural, tanto o livro quanto a revista têm importância parcial para o estudo do romance brasileiro: valem principalmente como marco cronológico. Mas um marco que não se pode desprezar. Trata-se da "oficialização" das ideias românticas em nossa literatura e, ao contrário do que sucedeu na Europa, aqui o Romantismo não veio influenciar um gênero já existente: foi através do movimento romântico que surgiu o romance brasileiro, cujo primeiro espécime de melhor qualidade é "A Moreninha".
Curiosidades quase literárias
Embora deva ser considerado o primeiro romancista brasileiro, Joaquim Manuel de Macedo teve alguns antecessores que não podem deixar de ser mencionados. No mínimo como curiosidade, pelas raríssimas referências a eles feitas (quando feitas), mesmo nos melhores manuais de história literária. No máximo, para esclarecer porque Macedo merece a paternidade do romance brasileiro.
Ao que tudo indica, a primeira narrativa de ficção publicada no Brasil foi "Statira, e Zoroastes" (1826), de autoria de Lucas José de Alvarenga. Nela, narra-se o amor do príncipe tibetano Zoroastes pela vestal Statira. Mas, além do pequeno valor estético e de não exercer influência na literatura que lhe é contemporânea ou posterior, "Statira, e Zoroastes" é muito breve (58 páginas), e faz da narrativa um mero pretexto para a divulgação de ideias políticas do autor, não podendo se caracterizar propriamente como um romance.
A partir de 1839, alguns poetas, historiadores e críticos passaram a publicar obras de ficção em prosa nos jornais e revistas da Corte, às quais chamaram romances. É o caso de Pereira da Silva, de quem se podem citar "O aniversário de D. Miguel em 1828" e "Jerônimo Corte Real", e do próprio Varnhagen, nome de indiscutível importância em nossa historiografia, que lançou a "Crônica do descobrimento do Brasil". No caso de ambos, entretanto, o leitor se depara com narrativas de fundo histórico, toscamente ficcionadas por autores cuja forma de expressão não era absolutamente a ficção.