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Pressão e temperatura - Pressão interfere no ponto de ebulição

Fábio Rendelucci

Você já deve ter ido ao supermercado comprar um pacote de macarrão e - se você é como eu, que não sei cozinhar nada - lê as instruções contidas no pacote atendo-se, principalmente, ao tempo de preparo. Suponha que o espaguete que você comprou indique Tempo de cozimento: 10 minutos. Será que isso funciona?

Depende de onde você está. Pense primeiro em algo um pouco mais simples. Responda rapidamente: A que temperatura a água ferve? Garanto que você pensou em 100°C. Isso é verdade, mas só é verdade à pressão de 1 atmosfera. Você sabe que quando diminuímos a pressão atmosférica, o ponto de ebulição de um líquido diminui também, mas por quê?

Pressão e temperatura

Um líquido, assim como todas as coisas, é formado por moléculas. As moléculas, por sua vez, estão em movimento e, um desses movimentos é o de translação (ir de um lugar a outro). Imagine uma molécula de água dentro de uma panela com água. Ela vai se transladando e pode, por exemplo, bater na parede da panela mudando sua direção, mas pode também ir em uma trajetória tal que se dirija à superfície da água, onde não há parede para segurá-la. O que acontecerá então?

Ao atingir a superfície da água, a molécula encontrará duas barreiras: a tensão superficial e a pressão que o ar faz sobre a superfície. A tensão superficial funciona como uma película que envolve o líquido e pode ser muito forte ou mais fraca, dependendo das forças intermoleculares e das moléculas em si.

Imagine a seguinte situação: você andando em uma sala que tem uma única porta. Você está andando em direção à porta, que está fechada. Se essa porta for feita de papel de seda, será fácil rompê-la e sair da sala, mas se for de aço reforçado a coisa complica. Assim funciona a tensão superficial. Se ela for fraca, a molécula não tem grande dificuldade em vencê-la, mas se for forte...

Eu disse anteriormente que havia duas coisas que seguravam a molécula: a tensão superficial (nossa porta) e a pressão do ar na superfície. É como se, para mantermos a porta fechada, colocássemos uma pessoa para segurá-la. Se essa pessoa for uma criancinha, não será difícil afastá-la, mas se for um lutador de sumô teremos algum problema em abri-la. Assim funcionará a pressão do ar sobre a superfície do líquido: quanto maior, mais difícil será para a molécula transpor a interface.

Vaporização

Se você deixar cair um pouco de água sobre uma mesa e não enxugar, essa água permanecerá lá para sempre? Você sabe que não, ela irá evaporar, ou seja, transformar-se em gás. Isso se dá à medida que as moléculas "aprisionadas" no líquido conseguem, aos poucos, romper as barreiras da interface líquido-ar e, por isso a quantidade de água vai diminuindo até "desaparecer". Quando você ferve água, aquela fumaça que você vê saindo nada mais é do que um monte de moléculas que romperam a barreira e estão livres, gasosas.

Até aqui, você deve ter entendido como funciona fisicamente o processo de evaporação. Agora, vamos entender mais um conceito: uma de nossas moléculas que está caminhando no líquido, ao se chocar com a parede da panela ou mesmo com a superfície, aplica nela uma força. Como essa força é aplicada em uma área, podemos dizer que existe uma pressão. Quando a pressão que essa molécula exerce é igual à pressão que o ar faz na superfície, dizemos que o líquido entra em ebulição.

Tecnicamente, essa pressão exercida pela molécula é chamada de pressão de vapor. Quando a pressão de vapor se iguala à pressão atmosférica, o líquido entra em ebulição.

Por que a temperatura influi nisso?

A pressão de vapor, como vimos, está relacionada com a força que a molécula faz ao colidir com um obstáculo. É fácil intuir que, quanto maior for a velocidade da molécula, maior será o choque, maior a força, maior a pressão. O que faz uma molécula "andar" mais rápido ou mais devagar é a energia cinética que ela tem, podendo ser traduzida diretamente pela temperatura: quanto mais quente, mais rápida a molécula, maior a força de impacto, maior a pressão de vapor.

O que isso tem a ver com a cozinha?

Pense um pouco: para a água ferver, a pressão de vapor deve se igualar à pressão atmosférica. Quanto menor for a pressão atmosférica, mais rapidamente essa igualdade acontecerá e menor será a temperatura da água para que ocorra. Sabemos que quando a pressão atmosférica é de 1 atm, a água entra em ebulição a 100°C mas, se diminuirmos a pressão, ela ferverá a uma temperatura menor, nunca atingindo os 100°C.

Se você for cozinhar ao nível do mar, a temperatura da água ao ferver será de 100°C, mas se você estiver no Himalaia, ela deve ferver a uma temperatura bem mais baixa, por exemplo, 75°C. Como o seu macarrão, de acordo com as instruções fica pronto em 10 minutos, supomos que o mestre-cuca que escreveu as instruções pensou em 100°C. Contudo se nossa fervura estiver a 75°C, dez minutos não serão suficientes, deixarão o macarrão duro, necessitaremos de um tempo de cozimento maior!

Fervendo água a mais de 100°C

Existem algumas situações em que precisamos que a água continue líquida com uma temperatura superior a 100°C e, para isso, a solução é bastante simples: mantenha a pressão atmosférica em um valor superior a 1 atm. Isso é muito utilizado em radiadores de automóveis onde, sob pressão, a água continua líquida mesmo acima de 100°C e o mesmo ocorre nas panelas de pressão que, ao contrário da nossa macarronada no Everest, cozinha mais depressa pois a pressão interna da panela é superior a 1 atm o que obriga a água a ferver acima de 100°C.

Como você vê, um bom mestre-cuca devia se valer da ajuda de um químico ou de um físico quando for publicar uma receita. A não ser que tenha sido um bom aluno de ciências exatas...

 

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