Ministro diz que criança sabe usar camisinha e professora reage: Vergonhoso
A afirmação do ministro da Educação, Milton Ribeiro, de que "crianças com nove anos de idade não sabem ler, mas sabem até colocar uma camisinha", provocou críticas entre especialistas da área, para os quais o ministro demonstra desconhecimento de suas atribuições.
A declaração aconteceu na última segunda-feira (26), em uma aula magna na UFPB (Universidade Federal da Paraíba), em João Pessoa, para a qual Ribeiro foi convidado a discorrer sobre avanços e desafios da educação.
O presidente pediu pra mim: 'Milton, cuide das crianças'. Crianças com nove anos não sabem ler. Sabem tudo. Com respeito a todas as senhoras aqui presentes, sabem até colocar uma camisinha. Mas não sabem que B + A é 'BA'. Estava na hora de dar um basta nisso"
Milton Ribeiro, ministro da Educação
Ao prosseguir com o discurso, Ribeiro, que é pastor presbiteriano, também disse que recentemente retirou "questões de gênero" do edital do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático), decisão, que segundo ele, teve aval do TCU (Tribunal de Contas da União).
"Respeito a orientação de todos, mas a gente não tem o dever, não tem o direito, melhor dizendo, de violar a inocência de uma criança nessa idade, de 6 a 10 anos, trazendo questões 'se você quer ser homem, você é homem', 'e quiser mulher, é mulher'", disse.
No evento, estavam presentes o reitor da UFPB, Valdiney Gouveia, a vice-reitora Liana Filgueira — nomeados em novembro pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) — e o prefeito da capital paraibana, João Pessoa Cícero Lucena (MDB).
Para a coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito Educação, Andressa Pellanda, a fala do ministro reflete "a discriminação e a falta de compromisso com os direitos humanos e com a laicidade do Estado" do governo Bolsonaro.
"A Constituição prevê que a educação deve servir para a formação para o trabalho, para a cidadania e para a formação plena dos seres humanos. Educação deve ser inclusiva. Vai muito além de letramento ou de contas básicas de matemática, vai muito além de conteúdos curriculares, e deve passar por educação em sexualidade e contra discriminações de todo tipo", afirma Andressa.
"Pronunciamento vergonhoso", diz estudiosa
Na avaliação de Denise Carreira, mestre e doutora em educação pela USP e coordenadora institucional da organização Ação Educativa, trata-se de "mais um pronunciamento vergonhoso do ministro, ancorado na ignorância, que fere marcos legais brasileiros e normas internacionais, desconstrói programas educacionais importantes e estimula a desinformação e o preconceito".
"Um grande desserviço à educação do nosso país, que vem sofrendo intensos ataques: cortes profundos de orçamento; ameaça absurda de reabertura obrigatória de escolas em um momento de alta da pandemia; perseguições diversas de grupos ultraconservadores negacionistas e privatistas", afirma.
O ministro confronta a decisão do STF que determinou ser dever do Estado a promoção da igualdade de gênero por meio da educação como forma de prevenir o abuso sexual e a violência doméstica sofrida por milhares de crianças e adolescentes"
Denise Carreira, mestre e doutora em educação pela USP
Segundo a educadora, quando o direito à educação para igualdade de gênero é negado, crianças e adolescentes tornam-se muito mais vulneráveis a serem vítimas de predadores sexuais e de outros perfis violentos".
Presidente-executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz, afirma que a fala de Ribeiro têm duplo propósito: diversionismo para esconder incompetência e para incendiar o debate.
"O ministro Milton Ribeiro faz parte de um governo e é coerente com a prática vigente: não faz gestão, lança narrativas para animar a militância e as milícias digitais mirando as eleições. Temos a pior gestão do MEC desde a redemocratização, um órgão incompetente e destruidor de políticas que vinham avançando", diz.
Já para Hubert Alquéres, membro da Academia Paulista de Educação e da Câmara Brasileira do Livro, "o MEC está entregue a um passadista que nos remete aos tempos da era da pedra lascada em matéria educacional".
"O Brasil precisa fazer a educação avançar, universalizando cada vez mais a educação obrigatória, gratuita e laica, com diretrizes nacionais e propostas inclusivas em busca pela qualidade num mundo em transformação tecnológica e pós-pandêmico. E da valorização da diversidade para superação de preconceitos", disse.
Procuradas pelo UOL, as assessorias do MEC e da UFPB não se manifestaram até a publicação da reportagem.
Defesa de Bolsonaro
Em uma apresentação de quase 30 minutos na UFPB, o ministro Ribeiro também dedicou parte do tempo para defender o presidente Bolsonaro, cujo governo agora é alvo de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) instalada para investigar ações e omissões no enfrentamento da pandemia de covid-19.
De forma indireta, Ribeiro atacou ainda as gestões dos antecessores do atual presidente, os petistas Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva.
"O Brasil não aguentava mais a corrupção. O Brasil não aguentava mais os desvios que aconteciam nos cofres públicos. Podem acusar o senhor presidente da República do que for, menos de ladrão, menos de corrupto", disse Ribeiro sobre Bolsonaro, que tem hoje quatro filhos alvos de apurações.
As suspeitas incluem desvio de recursos públicos, contratação de funcionários fantasmas, compra de imóveis com pagamento em dinheiro vivo e envolvimento na organização de manifestações que pediram o fechamento do Congresso e do Supremo.
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