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Livros apócrifos: por que evangélicos rejeitam parte da Bíblia de católicos

Com ajuda de fotografia ultravioleta, pesquisador encontra um dos manuscritos mais antigos do Novo Testamento encoberto sob outros textos Imagem: DW

Ranieri Costa

Colaboração para UOL, em Sumaré (SP)

07/03/2024 04h00Atualizada em 23/10/2024 08h36

Quando a reforma protestante, liderada por Martinho Lutero em 1517, fez surgir um novo grupo religioso —hoje chamados evangélicos— uma das primeiras medidas foi abandonar livros que até então eram usados pela Igreja Católica.

Os protestantes rejeitam livros do Antigo Testamento por considerarem apócrifos, ou seja, de autoria duvidosa. São eles: Tobias, Judite, 1 e 2 Macabeus, Sabedoria de Salomão, Eclesiástico e Baruc. Essa diferença se dá apenas no Antigo Testamento, sendo que há consenso no Novo Testamento.

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Segundo eles, não há provas da autenticidade dos escritos. Além disso, dizem, não são divinamente inspirados e não seguem as mesmas características textuais dos outros (escritos, em sua maioria, por Moisés e pelos profetas). A reforma protestante não os assume como canônicos principalmente por não terem sido escritos em hebraico.

Para os católicos, esses escritos são classificados como deuterocanônicos. Ou seja, acreditam na canonicidade (inspiração divina) posterior aos outros textos tidos como sagrados.

A Igreja Católica assume esses livros deuterocanônicos [...] são os livros advindos da Septuaginta, que foi a tradução do hebraico para o grego [feita entre os séculos 3 a.C. e 1 a.C.].
Felipe Zangari, teólogo católico e mestre em ciências da religião

Há entre os evangélicos as denominações que usam os livros, como as igrejas luteranas e anglicanas. O bispo anglicano Eric Rodrigues inclusive acha ruim tratá-los como apócrifos ou deuterocanônicos por dar um sentido ruim, espúrio e perigoso ao texto.

No Brasil, os luteranos seguem a versão calvinista da Bíblia, e não a versão luterana. Mas, em outros países, especialmente nos europeus, os deuterocanônicos estão lá, mas como apêndice, não como divinamente inspirados, mas nunca foram retirados
Thiago Surian, teólogo e pastor luterano

Para nós, são livros bíblicos importantes, válidos e devem ser lidos por todos a fim de crescer na fé. A Igreja [anglicana] os lê para exemplo de vida e instrução de costumes, porém, não se deve estabelecer nenhuma doutrina a partir deles.
Eric Rodrigues, bispo anglicano

Para quem é cristão, católico ou evangélico, os Evangelhos contidos no Novo Testamento são os mesmos: Mateus, Marcos, Lucas e João.

Livros possuem valor histórico

Apesar de não serem canônicos para os evangélicos, os livros possuem um valor histórico e são estudados em seminários protestantes. São considerados não autoritativos "por não se encaixarem no ethos protestante de se basear nas fontes originais", explica o pastor presbiteriano e mestre em teologia, Paulo Won.

Até porque o estudo contextual dessa época é muito importante para o desenvolvimento daquilo que nós vamos ver no Novo Testamento com o surgimento dos fariseus, dos saduceus e dos essênios.
Won

Quais são os livros rejeitados

Tobias e Judite, segundo Zangari, são novelas de personagens do Israel pré-exílico. O enredo de Tobias, por exemplo, tem características de um texto romântico. Um dos dilemas de Tobias é que seu pai, Tobit, ordenou que ele se casasse com alguém de sua descendência e a única opção seria sua prima Sara, jovem que teria ficado viúva de 7 maridos. Mesmo com medo, Tobias seguiu as orientações do anjo Rafael e não morreu durante a noite de núpcias como os outros.

Macabeus são livros mais recentes, da primeira metade do século 1 a.C. Eles contam a história da disputa e vitória do povo hebreu contra o Antíoco 4° Epifânio, imperador de origem helenística, e tratam da ressurreição e da tradição de rezar pelos mortos.

Sabedoria de Salomão e Eclesiástico são meditações atribuídas ao rei Salomão. Trata da sabedoria divina, dádiva pedida por Salomão para que se tornasse capaz de governar.

Baruc conta sobre grupos que teriam experimentado o exílio e, a partir disso, fizeram novas leituras da invasão da Babilônia.

Apócrifos do Novo Testamento

Apesar de haver consenso sobre o Novo Testamento, há mais de uma centena de livros considerados apócrifos rejeitados por católicos e evangélicos. Os mais conhecidos são o Evangelho de Maria, o Evangelho de Tomé e Atos de Pedro, por serem de autoria duvidosa. Eles tratam, entre outras coisas, da infância de Jesus, de um milagre feito por ele aos cinco anos e da Paixão de Cristo.

Nos primeiros séculos do cristianismo, os livros que não eram canônicos se consolidaram como grande referência de espiritualidade. A Didaquê e O Pastor de Hermas, por exemplo, foram absorvidos pela igreja como sementes da revelação divina, explica Zangari.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado, Antíoco 4° Epífanes é de origem helenística, não assíria. Informação foi corrigida.
Diferentemente do informado, a Septuaginta foi redigida entre os séculos 3 a.C. e 1 a.C. e não no século 2 d.C.

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