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Brasil pode participar de avaliação inédita de educação infantil da OCDE

Professora com alunos de 4 a 6 anos em uma escola municipal de educação infantil - Guilherme Pereira/Divulgação
Professora com alunos de 4 a 6 anos em uma escola municipal de educação infantil Imagem: Guilherme Pereira/Divulgação

Renata Cafardo

Em São Paulo

16/01/2023 17h49Atualizada em 16/01/2023 17h51

A OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) começa a realizar neste ano a primeira grande avaliação mundial de crianças de 5 anos.

Fundações privadas assumiram parte do valor para que o Brasil participe do exame inédito e a entidade, a mesma que faz o Pisa, ainda aguarda uma oficialização do MEC (Ministério da Educação).

A prova, chamada de IELS (International Early Learning and Child Well-being Study), terá testes de Linguagens e Matemática e ainda vai coletar informações de pais e professores.

Para especialistas, avaliar crianças pequenas da educação infantil, algo ainda pouco comum, pode ajudar a garantir uma aprendizagem efetiva e melhor desenvolvimento durante toda a jornada escolar.

"Uma avaliação pode ajudar muito na alfabetização das crianças, algo que o Brasil precisa melhorar. Porque a alfabetização não começa quando o aluno chega ao ensino fundamental, já começa na educação infantil", diz a gerente de Conhecimento Aplicado na Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, Beatriz Abuchaim.

Como as conversas com a gestão de Jair Bolsonaro (PL) não prosperaram, a entidade se juntou à Fundação Lemann, ao Itaú Social, à B3 Social, entre outras, e captou cerca de R$ 700 mil - metade do valor que deve ser pago pelo governo à OCDE - para dar início à participação do Brasil no IELS.

O primeiro passo são traduções e adaptações dos questionários, que serão feitos neste ano. A aplicação da prova a cerca de 3 mil crianças dos primeiros dez países será em 2024 e os resultados devem sair em 2025.

"Esperamos que o grupo de nações participantes reflita um balanço de sistemas de ensino fortes e outros em desenvolvimento, além de variedade regional", disse ao Estadão Andreas Schleicher, diretor de Educação e Habilidades da OCDE e um dos criadores do Pisa. "A OCDE espera que o Brasil possa participar e para isso precisamos ainda de uma formalização do governo."

Schleicher, no entanto, acredita que o apoio das fundações e a mudança de governo podem ajudar a viabilizar a participação brasileira. Procurado, o MEC da gestão Bolsonaro não respondeu à reportagem até o fim de dezembro.

Antes da posse, a equipe de transição da área da educação do governo Lula disse que o exame chegou a ser mencionado em discussões, mas nenhuma decisão havia sido tomada.

Lúdico

Segundo a OCDE, os testes com os alunos são feitos com tablets, de maneira lúdica e duram cerca de duas horas. Há educadores que têm ressalvas em relação a provas feitas para crianças pequenas pela pressão a que podem ser submetidas.

Segundo Beatriz Abuchaim, o exame não requer que a criança saiba ler ou escrever, apesar de avaliar essas habilidades, e é realizado sempre junto com um adulto mediador. "A ideia é que ele engaje a criança e não seja um momento de tensão."

Um piloto do IELS realizado em 2018 em três países (Estônia, EUA e Inglaterra), divulgado em 2020, mostrou que a aprendizagem das crianças de 5 anos era maior quando os pais liam para elas todos os dias, conversavam com elas, tinham livros infantis em casa e as levavam para atividades extras, como dança e natação.

Além da Linguagem e da Matemática, foram avaliadas as habilidades socioemocionais e a autorregulação das crianças. Os resultados indicaram relação positiva entre as questões cognitivas e socioemocionais.

O Brasil tem 2,4 milhões de crianças de 0 a 3 anos na creche e 4 milhões na pré-escola (4 e 5 anos de idade), ambas compõem a educação infantil.

Nas últimas décadas, cresceu o investimento na primeira infância no mundo, após diversos estudos científicos mostrarem que boa parte do desenvolvimento do cérebro humano se dá nos primeiros anos de vida. O País ainda não tem, no entanto, nem todas crianças de 4 e 5 anos matriculadas na escola.

Saeb

A única avaliação oficial desta etapa no País foi feita pelo MEC em 2021, por meio do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica), quando aplicou-se questionários aos professores de uma amostra de creches e pré-escolas. Mas não houve análise dos resultados no governo Bolsonaro.

"O IELS vai ajudar os esforços do Brasil para melhorar sua educação. Os pais e professores precisam entender a importância do desenvolvimento da primeira infância e as evidências de como esse momento da vida das crianças é crucial para o futuro", diz o diretor da OCDE.

Em 2021, uma avaliação realizada pela Fundação Maria Cecília acompanhou as atividades em 3.400 salas de educação infantil do País, com observação de materiais, estrutura, currículo, alimentação e equipes.

Foi a mais ampla análise da educação infantil até agora no País e mostrou que 42% das salas não tinham momentos de brincadeira livre para as crianças e 55% não faziam leitura de livros. "Se não avaliarmos no início da trajetória escolar, vamos ter menos chance de consertar a rota", afirma Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecília.

O Brasil já participa desde a primeira edição do Pisa, em 2000, como país convidado, já que não é membro da OCDE. Os resultados do desempenho dos alunos de 15 anos ganharam importância e passaram a nos últimos anos a definir um ranking de educação mundial.

Por outro lado, há críticas a países que estariam moldando seus sistemas de ensino para se sair bem no exame. O Brasil costuma estar entre as mais baixas colocações, mas melhorou ao longo das décadas. Segundo a OCDE, os resultados das crianças pequenas poderão ser comparados aos do Pisa.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.