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Cavando Votos - Autor e intérprete: Cornélio Pires (1884-1958)

Gravação Columbia, 1929

Autor e intérprete: Cornélio Pires (1884-1958)

Homem: Boa tarde, patrício!

Caipira: Bas tarde!

Homem: E o senhor, como vai?

Caipira: Aqui como véio, perrengue, viveno de lembrança e de sodade...

Homem: Os homens envelhecem, mas a pátria se remoça. Agora vai por todo o Brasil um sopro de vida nova de reação...

Caipira: Quá! Como tempo de dantes nunca mai há de ficá.

Homem: Que mal lhe pergunte...

Caipira: Pregunta bem...

Homem: O senhor é eleitor?

Caipira: Pra qué que ocê qué sabe?

Homem: Queria que o senhor fosse votar na próxima eleição para presidente da República.

Caipira: Ói, moço. Num seja tonto. Largue mão disso. Deixe dessas patacoada. Ói, eu já fui monacrista, virei repurbicano, desvirei e revirei. Eu hoje em dia nem num sei o que é que eu sô. Esse negócio de monacria e de repúrbica pra mim é a mesma coisa que criação de porco.

Homem: Ó, o senhor é pessimista.

Caipira: Isso que ocê falô num sei o que é. Mas isso eu num sô. Ocê arrepare que eu tenho razão. Ocê recóie um porco magro no chiqueiro. De minhã cedo, ocê pinche um jacá de mio, ele: "hum". No meio do dia, outro jacá de mio, ele: "hum". Na boca da noite, outro jacá. De minhã cedo ta puído. O porco vai cumeno, vai ingordano, vai ingordano, ingordano... Quando ele tá bem gordão, só qué dormir, roncar dia e noite. Vancê pincha uma espiguinha de mio cateto, ele exprementa, larga, sobeja pras galinha pinicá... Tá gordo, tá infarado, tá cheio, num tem mais fome, num precisa mais cumê, parô de cumê... Esse é o imperadô. Agora com a Repúrbica, não tem jeito. Vancê recóie um porco magro, antes de ingordá; vancê sorta, arrecoie outro, num há mio que chegue, pois.

Homem: O senhor não tem razão. A República é muito boa.

Caipira: Pode sê, mas... Pra encurtá o causo. Vancê que tem viajado muito, tem andado muito aqui pra roça?

Homem: Tenho.

Caipira: Então cê deve cunhecê muitas qualidade de árve.

Homem: Conheço.

Caipira: Vancê cunhece aquel'uma que ta ali perto da ponte?

Homem: Conheço muito. É um ingaieiro.

Caipira: Ingazeiro nada. Aquela árve aqui nóis chama de árve do guverno.

Homem: Por quê?

Caipira: Vancê arrepare, ói. Tem parasita inté no úrtimo gaio!

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