Troquei o vício em pedra pelo prazer de estudar, diz finalista da Obmep
"Eu posso dizer que troquei o vício em pedra de crack pelo prazer de estudar". A frase é do adolescente Thiago*, interno em uma unidade da Fundação Casa em Ribeirão Preto que completará 18 anos em 3 de outubro.
Ele é um dos 1.522 mil menores de idade internados em instituições de recuperação a passarem para a final da Obmep (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas) e conta que, graças aos estudos, poderá recomeçar a vida. "Os números me salvaram", disse.
Há pouco menos de dois anos na unidade de Ribeirão Preto, ele assume ter realizado "mais de 50" roubos e furtos, a maioria deles para comprar pedras de crack. Ex-viciado, o adolescente conta que morou nas ruas por quase um ano e que apenas descobriu a facilidade para a matemática depois que foi apreendido.
"Eu tinha parado de estudar com 15 anos, no primeiro colegial. Vivi na rua e acabei na Fundação Casa com 16 anos. Antes, por dez meses, fui viciado em crack. Aqui, voltei a estudar e percebi que sabia matemática. Enquanto estava na escola, fora daqui, eu não conseguia entender", disse.
O desempenho escolar de Thiago foi tão positivo que ele está com emprego garantido assim que ganhar a liberdade. "Irei morar em uma república com mais quatro pessoas, todos ex-moradores de rua e que hoje trabalham. Também vou atrás de cursos para fazer e quero continuar a estudar, quem sabe fazer uma faculdade", disse.
Rotina
A rotina de Thiago e de outros internos incluem aulas no período da manhã, pausas para refeições e oficinas no período da tarde. Atividades esportivas e disciplinares também são ofertadas, assim como os alunos são incentivados a participarem de projetos de estudos de disciplinas específicas, como a matemática.
Segundo Márcio de Paula, diretor da regional de Ribeirão Preto da Fundação Casa, dados obtidos junto aos organizadores da Obmep, mostram que o índice de aproveitamento de internos da Fundação Casa chega a ser duas vezes e meia maior que o de estudantes da rede pública. "Foi assim na Olimpíada de Matemática e isso também é observado em outras disciplinas. Isso ocorre porque, como eles estão internados, então seguem uma rotina rígida na qual o estudo é tratado como prioridade", disse.
Ele conta que, na unidade Cândido Portinari, que tem 64 internos, 22 prestaram a prova, dos quais dez foram aprovados. Entre eles, quatro já estão em liberdade.
A opção é estudar
Outro interno da Fundação Casa em Ribeirão a ter sucesso na Obmep - o adolescente Gabriel* 16, que parou de estudar aos 15 e, menos de um ano depois, acabou apreendido, concorda com o diretor. "Não tem muita opção, a gente tem que estudar. E isso é bom pra gente mesmo", conta ele, que também foi aprovado e fez a prova da segunda fase da Obmep em 12 de setembro.
Internado depois de uma série de roubos, ele conta que matemática sempre foi a matéria preferida dele. "Eu sempre gostei de resolver os problemas. Parei de estudar e, quando entrei aqui, fiquei feliz por poder voltar a estudar", disse.
Ele conta que o pai dele, que é pedreiro, foi o responsável por despertar a paixão pelos números. "Ele também estuda, está terminando o ensino médio. Eu chegava em casa e ele falava para eu calcular a área de uma cozinha, por exemplo, para ele saber quanto de piso precisaria comprar", conta.
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