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Tiro, porrada e bomba em alunos viram espetáculo violento em SP

Camila Neumam

Do UOL, em São Paulo

03/12/2015 20h08Atualizada em 04/12/2015 14h47

Está cada vez mais perigoso protestar pelas ruas da cidade. Ao menos, esta foi minha impressão na manhã desta quinta (3) durante a manifestação dos estudantes pela avenida Faria Lima, na zona oeste de São Paulo.

Bomba, xingamentos e ira de pedestres e motoristas, incomodados com o trânsito parado. Esses foram os desafios do alunos que protestavam contra a reorganização da rede estadual de ensino do Estado.

Era pouco antes das 9h quando ouvi o primeiro estrondo e estava no 8º andar de um prédio comercial a metros dali. O barulho era de uma bomba de gás lacrimogêneo que a Polícia Militar havia atirado contra os estudantes que bloqueavam a importante avenida, sentados em cadeiras escolares. 

Não houve diálogo. Os PMs chegaram jogando a bomba na direção deles, me contaram quando desci para fazer a reportagem. 

A molecada correu para o outro lado da avenida. Por alguns momentos, houve silêncio. Estudantes e policiais se encaravam à distância. Enquanto isso, trabalhadores desavisados chegavam aos prédios comerciais como se nada estivesse acontecendo.

Quando o semáforo fechou, a molecada voltou a fechar o cruzamento.

Não demorou para outras bombas ecoarem. A gritaria foi geral e todo mundo, inclusive eu, começou a correr. Estudantes, transeuntes, fotógrafos e jornalistas se misturaram e escaparam para uma viela.

Rapidamente o clima de terror se instalou naquele trecho esfumaçado da Faria Lima, uma região de escritórios bastante conhecida na capital paulista. Os comerciantes fecharam suas portas.

Mas os estudantes de cabelos e roupas coloridas já estavam preparados: eles continuaram andando e até ajudando a jornalista aqui a se safar dos desagradáveis efeitos do gás lacrimogêneo.

Os olhos e a garganta ficam em brasa (efeito do gás lacrimogêneo). Uma colega me salvou ao me dar uma camisa para cobrir o rosto. Logo depois, um estudante me pediu para abrir as mãos e pingou gotas de leite de magnésio. “Coloca nos olhos e nas narinas”, ele me ensinou. Eu, tonta, questionei: “Posso beber? Minha garganta...”. Ele já me rebateu: “Melhor não”. Aceitei a dica.

O cortejo continuava. Tenso. Clima que só mudava quando eles conseguiam parar algum trecho da avenida. Aí era uma festa: “Aqui não tem arrego!”, gritavam.

Mas os carros, apressados, queriam seguir e buzinavam enlouquecidamente para que eles saíssem. Por muitas vezes, fiquei com medo de que houvesse um atropelamento em massa. Alguns pedestres gritavam que eles eram vagabundos. A maioria respondia: "um dia eu quero ser trabalhador como o senhor, mas preciso estudar primeiro".

Por volta das 10h, três viaturas chegaram subitamente com as sirenes ligadas. Em uma ação rápida -- e sem nenhum tipo de negociação --, os policiais da Força Tática detiveram quatro pessoas.

Eu presenciei uma dessas detenções. O menino foi jogado no chão, com as mãos nas costas. A cena seria humilhante se não fosse extremamente violenta. O rapaz não estava armado, não estava agredindo ninguém. Só estava protestando. Mas foi levado pelo camburão com os outros colegas sem direito a qualquer contra argumentação. Meninas e meninos choravam e gritavam e xingavam. Muitos filmavam, inclusive eu.

Outra bomba foi atirada contra a multidão de estudantes, apoiadores, fotógrafos e jornalistas. Todos voltamos a correr.

Questionei-me se não haveria uma forma mais branda de detê-los. Aliás, eles deveriam ser detidos? A Constituição garante o direito de protestar. Fui perguntar para um PM. Ele me respondeu: “foram para a 15º DP”.

Fui à delegacia a pé, seguindo o protesto que virou cortejo. Meia hora depois a notícia: os detidos não estavam lá. Haviam sido encaminhados para outra unidade, a 14ª.

Já no novo endereço, descubro que a rua foi fechada para evitar que os manifestantes chegassem até a delegacia. Quem chegou levou bomba. De novo.

E de novo. Já eram quase 14h quando presenciei um dos momentos mais aterrorizantes na minha opinião. Eu vi muitos deles serem alvejados ininterruptamente com as bombas de gás a poucos passos de uma feira livre.

Ali mesmo, um rapaz foi espancado a céu aberto e a luz do dia por policiais. O falatório do comércio de frutas e legumes foi interrompido pelo som de gritos, sirenes e bombas.

Só nos restou correr e nos proteger em um canto. Tristes tempos.