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Reféns da dengue

Lucila Cano

24/06/2011 12h06

Ingressamos no inverno, embora nem todos os estados brasileiros apresentem as baixas temperaturas típicas da estação. No Nordeste, como é do conhecimento geral, o frio cede lugar às chuvas. Mas isso não pode ser afirmado categoricamente porque, já faz tempo, por influência de efeitos climáticos daqui e dali, tudo pode mudar, a qualquer momento.

O que parece persistir e se expandir é a incidência da dengue em qualquer ponto do País, sempre que sol e chuva proporcionem um ambiente morno para a reprodução dos ovos do mosquito Aedes aegypti. É a fêmea do mosquito que transmite o vírus da dengue, de preferência em áreas urbanas, densamente povoadas, ocupadas de maneira desordenada e que apresentam temperaturas mais elevadas.

Em parte, isso explica as duas manchetes do boletim Ambiente Brasil de 18 de junho. Uma delas registra 30.079 casos de dengue no Ceará, sendo que 1.978 foram somados em uma semana. No Rio de Janeiro, em 31 de maio, havia um total de 50.361 casos, tendo 5.041 deles ocorrido em apenas sete dias.

No final de março, a região Norte, igualmente castigada pelo avanço da dengue, já respondia por mais de 30% dos casos no País.

Relaxamento

A imprensa vem alertando a população para o perigo da dengue e para medidas simples, que podem ser tomadas por todos para combater o seu alastramento. As secretarias de saúde em todos os estados brasileiros mantêm páginas exclusivas em seus sites oficiais para falar da dengue e da prevenção necessária. Nas escolas, igrejas, empresas e demais locais públicos, assim como foi feito quando da campanha contra a gripe H1N1, cartazes convocam a população para adotar os cuidados básicos contra a dengue. Sem falar na colaboração espontânea de professores, assistentes sociais, voluntários. O que mais é preciso fazer?

O Instituto Oswaldo Cruz criou um site (www.ioc.fiocruz.br/dengue) a respeito da dengue, o mais elucidativo que vi até o momento. Lá é possível saber, por exemplo, que o Aedes aegypti é originário do Egito e que, desde o século 16, período das Grandes Navegações, vem se espalhando pelas regiões tropicais e subtropicais do planeta.

Segundo o instituto, em 1955, o Brasil erradicou o Aedes aegypti como resultado de medidas para o controle da febre amarela. Isso, porque o vírus da dengue, que a fêmea do mosquito carrega, e o da febre amarela pertencem a uma mesma família de vírus. Mas, no final da década de 1960, houve um relaxamento das ações adotadas, o que abriu as portas para o mosquito que hoje é encontrado em todos os estados brasileiros.

Escova, água e sabão

Sem uma vacina, eliminar a dengue parece impossível. Reduzir a sua incidência e mantê-la sob controle está ao nosso alcance. É bom lembrar, por exemplo, que o Aedes aegypti é um mosquito doméstico, que vive e se acasala bem próximo da gente.

A transmissão do vírus ocorre após o acasalamento, quando a fêmea sai picando as pessoas, porque precisa de sangue para alimentar os seus ovos. Ao picar alguém que já esteja infectado, há a possibilidade de o vírus ser transmitido para a parcela fêmea de ovos que, depois, darão origem a novos mosquitos transmissores. Uma única fêmea do Aedes aegypti pode gerar 1.500 ovos, os quais ela deposita aos poucos, em lugares diferentes.

Surpreendentemente, os ovos se mantêm intatos em ambientes secos até 450 dias, o que significa que eles podem ser transportados em recipientes secos para qualquer lugar. Eles só vão eclodir, depois, em um próximo período chuvoso e quente.

A desova ocorre em criadouros com água limpa e parada, mas os ovos não são depositados diretamente na água, como muitos supõem, mas nas paredes do criadouro, próximo à superfície da água. Então, não basta jogar fora a água parada de pratinhos de plantas e demais vasilhas. É fundamental lavar esses recipientes com escova ou palha de aço e sabão e eles devem ficar bem secos. Essa tarefa deve se incorporar à rotina doméstica, de preferência semanalmente, pois um único ovo pode permanecer grudado em alguma superfície e, passado um tempo...

*Homenagem a Engel Paschoal (7/11/1945 a 31/3/2010), jornalista e escritor, criador desta coluna.