Topo

Inclusão: Compreender e apreender para ensinar

19/05/2016 06h00

Vivemos tempos difíceis e confusos. Para além dos nossos problemas pessoais, familiares e locais, o fato de estarmos conectados e interagindo com o mundo todo, em tempo real, com imagens instantâneas, reduz a nossa “imunidade” relativa a problemas antes sentidos como distantes - geográfica, social e culturalmente.  O fato é que, nos dias de hoje, os problemas do mundo nos afligem. Quem não sofre com as cenas do drama dos refugiados tentando chegar à Europa?  Com cada novo desdobramento no conflito Israel – Palestina?  Com a população que perde suas casas, seja no incêndio no Canadá, ou no “mar de lama” de Mariana? O mundo ficou pequeno e todos viramos vizinhos.

Mas se o compartilhamento do sofrimento é penoso, os tempos atuais encerram também muitas esperanças de superação.  Como sempre, o modo de olhar a realidade é que determina a postura face à vida. Minha escolha é pelo lado da esperança e das boas perspectivas que as possibilidades de conexão, de colaboração e de compartilhamento trazem.  São possibilidades que requerem posturas ativas para que se concretizem em cada um dos campos da atividade humana e nas pequenas dimensões da vida de cada um de nós.

Pensemos nos desafios que estão colocados às escolas para educar as crianças e jovens nesse nosso mundo de hoje.  Não basta ensinar disciplinas. O que se requer das escolas vai muito além disso. Mas o que dizer de uma escola que precisa ensinar seus alunos a resolver problemas, sem saber resolver os seus? Que precisa ensinar valores como respeito, tolerância, empatia, equidade, justiça, se não os tem e nem os pratica?  Que forme pessoas que saibam trabalhar em grupo, colaborar, se nada disso faz parte de suas próprias práticas? Que precisa formar pessoas que saibam aprender a aprender, cidadãos capazes de viver e se adaptar ao mundo em constante transformação, se só repete o que sempre fez e se encerra em seus muros?

Inúmeras escolas já acordaram para essa realidade. E resolveram parar de esperar que algum salvador, sempre externo a elas, resolva seus problemas: um ótimo ministro da educação, secretário estadual ou municipal, um mantenedor generoso, um super diretor... Descobriram, antes que a maioria, que não há super-heróis. Que ninguém vai resolver seus problemas. Que o trabalho em equipe, com valores, planejamento, objetivos e metas, aprendendo uns com os outros, com outras escolas e outros grupos, com os pais e a comunidade é a saída. Que é preciso enfrentar as dificuldades com objetividade, vontade de superá-las e humildade para buscar parcerias e para aprender.  Vontade de mudar as coisas. De contribuir para um mundo melhor. Nossa realidade é muito favorável a que isso ocorra. Os recursos nunca foram tão disponíveis e propícios para que se estabeleçam redes de colaboração, de aprendizagem e de parcerias entre escolas, profissionais da educação, comunidade científica, pais e comunidade. Dependemos muito pouco de pessoas e de instituições para mudar essa realidade a nossa volta. Passo a passo, mas a mudança é de postura.

Esse mesmo raciocínio vale para a questão da inclusão de pessoas com deficiência nas escolas. A mudança de postura é condição inicial e necessária para que se viabilize. E, obviamente, ela beneficia a todos, não apenas aos “alunos de inclusão”, uma vez que induz à consideração de cada aluno, seus potenciais e dificuldades. Cada vez mais escolas assumem a inclusão como bandeira e, aquelas que o fazem com seriedade e compromisso, atestam ganhos para todos.

Por fim, gostaria de retomar o motivo que me levou a escrever esta coluna. Uma conversa com minha filha, depois de ler um post em um grupo de Facebook, sobre um menino de 5 anos que está prestes a ser “convidado a se retirar” da escola particular onde estuda. Ele tem síndrome de Down e, por não gostar que outras crianças o abracem, reage a isso. O diretor chamou os pais e disse que se ele “não aprender a se comportar”, terá que sair da escola.  Simples assim: a qualquer momento, a escola pode parar de “fazer o favor” de resolver o problema daqueles pais. Tais atitudes não se justificam nem ética nem moralmente. Tampouco pedagogicamente: temos muitas e muitas experiências bem-sucedidas de inclusão, especialmente de crianças menores, como é o caso. Não é mais possível essa desconexão com o nosso tempo. O que uma escola que não compreende e apreende com o mundo em que se insere tem a ensinar?