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Cleópatra (1) - Rainha do Egito protagonizou o fim da república romana

Túlio Vilela

Cleópatra, rainha do Egito, é uma das personagens femininas mais famosas da história. As lendas criadas em torno de sua figura inspiraram peças de teatro, filmes e até histórias em quadrinhos. Durante muito tempo seu nome foi associado a uma beleza exótica, traiçoeira e sedutora.

Essa imagem foi posta em dúvida quando um museu de Newcastle, Inglaterra, expôs publicamente, pela primeira vez, uma antiga moeda de prata com as faces de Cleópatra e Marco Antonio. Datada de 32 a.C., a moeda mostra uma imagem da rainha bem diferente daquela apresentada nos filmes de Hollywood ou nos quadrinhos de Asterix: uma mulher com nariz adunco e queixo pontiagudo. Foi uma surpresa para o grande público, que ficou decepcionado ao constatar que a imagem gravada na moeda estava longe de ser a beldade do cinema.

Não temos como saber se aquele rosto é um retrato fiel de Cleópatra. Talvez o gravurista que a fez não fosse muito habilidoso, ou talvez não simpatizasse politicamente com a rainha e por isso tenha resolvido ridicularizá-la. Além disso, beleza é um conceito relativo e os padrões de beleza costumam variar conforme a época e o lugar. Seja como for, a moeda não é a única peça da Antiguidade em que vemos Cleópatra representada. Uma escultura de mármore representando a rainha faz parte do acervo de um museu em Berlim, na Alemanha.

Os historiadores sabiam há tempos que a Cleópatra da vida real devia ter sido bem diferente daquela imortalizada no imaginário popular. Nem por isso subestimam o poder de sedução e a capacidade de persuasão da egípcia, que conseguiu fascinar dois importantes líderes romanos, Júlio César e Marco Antonio.

Plutarco

Uma das mais antigas descrições de Cleópatra é a feita por Plutarco (46-119), antigo historiador romano que escreveu as biografias de Alexandre e Júlio César. Segundo Plutarco, mesmo não dotada de uma beleza extraordinária, ela era atraente e tinha uma voz encantadora, além de falar três idiomas (latim, grego e egípcio).

Plutarco nasceu muito tempo depois da época de Cleópatra e jamais viu ou ouviu a rainha, mas é bastante provável que tenha se baseado em fontes mais antigas para escrever seu relato. Afinal, na Antiguidade, os historiadores - como Tácito (55-118), Dio Cássio (155-229), Suetônio (69-c.141) e o próprio Plutarco - não tinham o hábito de citar suas fontes, ao contrário do que ocorre hoje, em que notas de rodapé e citações bibliográficas de obras alheias são presença constante na historiografia.

Muitas das fontes antigas sobre Cleópatra eram compostas por amigos e aliados do sobrinho-neto de César, Otávio (também conhecido como Otaviano), que veio a se tornar o primeiro imperador de Roma, adotando o nome de Augusto (que significa "divino"). Tais fontes, porém, eram obras de propaganda, com o objetivo de prejudicar ou desmoralizar Marco Antonio, amante de Cleópatra e principal rival de Otávio na disputa pelo poder em Roma.

Entre as obras que traçam um retrato negativo da rainha estão poemas de Horácio (65-8 a.C.) e Virgílio (70-19 a.C.). Outros poetas romanos atribuíram a ela a responsabilidade pela guerra civil que assolou Roma após o assassinato de Júlio César. Todos esses poetas faziam parte do círculo literário de Mecenas (70- 8 a.C.), político romano e patrono das artes.

Como Mecenas era conselheiro e grande amigo de Otávio, pode-se supor que essas fontes não fossem imparciais. A antipatia que os partidários de Otávio nutriam por Cleópatra é comparável à antipatia que muitos fãs dos Beatles nutrem ainda hoje por Yoko Ono, viúva do músico John Lennon, a quem culpam pela separação dos membros da famosa banda inglesa.

Origem da dinastia dos faraós ptolomeus

Cleópatra pertencia à dinastia dos faraós ptolomeus, fundada por um dos generais de Alexandre da Macedônia. Após a morte de Alexandre, o império criado pelo grande conquistador acabou se dividindo em pequenos Estados governados por seus generais.

No Egito, o controle foi exercido por Ptolomeu, general macedônio que se proclamou faraó e adotou o nome de Ptolomeu 1º. A cidade de Alexandria, assim chamada em homenagem a Alexandre, foi escolhida por Ptolomeu 1º como nova capital do Egito. Portanto, Cleópatra pertencia a uma dinastia fundada por um estrangeiro e não por um egípcio.

Alexandre da Macedônia iniciou o processo de difusão da cultura helênica (greco-macedônica) no Egito. Isso significa que o país incorporou diversos hábitos e costumes da Grécia e da Macedônia. Essa adoção de hábitos e costumes estrangeiros intensificou-se ainda mais durante a dinastia dos Ptolomeus.

A maioria dos faraós e rainhas dessa dinastia nem sequer sabia falar a antiga língua egípcia. Eles falavam o grego. O nome Cleópatra é de origem grega e já havia sido dado para seis rainhas egípcias que a antecederam. Sem sombra de dúvida, Cleópatra 7ª foi a mais conhecida.

Jogos de poder

Alexandria era um efervescente centro cultural. Era lá que funcionavam uma das maiores bibliotecas do mundo antigo e um centro de pesquisas - o que aquela época teve de mais próximo de uma universidade. Foi lá que o sábio Erastóstenes, observando sombras em diferentes horas do dia, conseguiu calcular a circunferência da Terra. Erastóstenes errou por muito pouco, o que é impressionante considerando-se os poucos recursos da época.

Essa efervescência cultural não foi suficiente para impedir que o Egito passasse por um longo processo de decadência, que teve início em 170 a.C., quando Antíoco 4º da Síria invadiu o país. O que salvou o reino egípcio foi a intervenção diplomática de Roma. Apesar de o Egito se manter um Estado oficialmente independente, na prática transformou-se numa espécie de "protetorado" romano. Roma muitas vezes atuava como juíza nas disputas internas pela sucessão do trono entre os membros da família real egípcia. E estava longe de ser imparcial, pois costumava favorecer o lado que melhor atendesse a seus interesses.

A independência do Egito esteve mais uma vez ameaçada em 80 a.C., quando o faraó Ptolomeu 11 morreu sem deixar herdeiros legítimos. Segundo o testamento do próprio faraó, na falta de um sucessor legítimo o Egito deveria ser entregue ao controle direto de Roma.

Para evitar isso, os egípcios colocaram no trono um "bastardo", Ptolomeu 12, pai de Cleópatra 7ª. Inicialmente, o novo faraó não foi reconhecido pelo Senado romano. Porém, Roma mudou de ideia porque a única descendente legítima da dinastia dos Ptolomeus - a rainha da Síria Cleópatra Selene, filha de Ptolomeu 8º - reclamava a coroa.

Roma preferiu reconhecer um "bastardo", que manteria o Egito numa situação de dependência, a aceitar uma rainha capaz de unir a Síria e o Egito. Essa união significaria o surgimento de um Estado poderoso, livre da tutela romana.

Durante o reinado de Ptolomeu 12, Pompeu conquistou a Síria e a transformou numa província romana. Aproveitando a situação, políticos romanos recorreram a um velho documento, o testamento de Ptolomeu 11, para exigir o domínio romano sobre o Egito. Antes que isso se concretizasse, Ptolomeu 12 subornou um político romano e, com isso, conseguiu que fosse aprovada uma lei que o reconhecia como soberano do Egito. O tal político subornado era ninguém mais, ninguém menos do que o ambicioso Júlio César. O valor do suborno era considerável: cerca de 6 mil talentos, o que equivalia mais ou menos à renda anual do reino do Egito.

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