Metalinguagem - O que é saber uma língua?
É óbvio que, ao falarmos, não ficamos pensando na estrutura da língua. Falamos e pronto. Até onde se sabe, ninguém fica calculando o que diz em termos de metalinguagem (linguagem que serve para descrever ou falar sobre uma outra linguagem). Ou seja, quando alguém produz um enunciado qualquer não fica pensando: "Bem, agora vou falar um substantivo, agora um adjetivo, agora um verbo, um advérbio..." - e assim por diante.
Saber uma língua não é, necessariamente, saber fazer uso de sua nomenclatura gramatical, nem saber analisar e comentar sua estrutura sintática, por exemplo.
Imagine uma criança americana ou inglesa. Como qualquer outra criança no mundo na sua relação com a língua materna, seja ela o francês, o inglês, o tupi, o português, etc., lá pelos seus dois ou três anos de idade essa criança já domina, provavelmente, a estrutura básica de seu idioma nativo. Aliás, muitos estudos já foram e estão sendo feitos em relação à aquisição da linguagem, e são muito interessantes, independentemente da corrente teórica.
Usar a língua para falar da língua
Mas o que quero chamar atenção é para a confusão que muita gente faz ao confundir o que é saber uma língua e o que é fazer metalinguagem dessa língua. Ou seja, usar a língua para falar da língua, descrever a língua, analisar a língua e comentá-la.
Voltemos ao exemplo da criança inglesa ou norte-americana. Pois bem, ninguém arriscaria afirmar que, mais ou menos, aos três ou quatro anos de idade essa criança (falante do inglês) não tenha um certo domínio de sua língua, mesmo sem saber que em "I like you" (Gosto de você), "like" é um verbo, por exemplo.
Da mesma forma, ninguém arriscaria dizer que um analfabeto da língua inglesa não sabe inglês. Na verdade, o que ele não sabe é a modalidade escrita da língua, sua descrição estrutural, bem como sua nomenclatura gramatical; e não a língua propriamente dita.
Transfira essas suposições para o português e teremos a mesma coisa. Obviamente que um analfabeto em língua portuguesa sabe a língua portuguesa (pelo menos na sua modalidade falada, com as características peculiares de sua origem social, regional, idade, sexo e da situação de uso), embora não saiba, por exemplo, que "fazer" e "andar" são verbos.
É claro que ter o domínio escrito da língua amplia em vários sentidos os nossos horizontes linguísticos, além de nossos conhecimentos. Faz com que os indivíduos tenham contato com as literaturas, com os textos oficiais, com os jornais e revistas, enfim, com o padrão culto (ideal) da língua, possibilitando-lhes, assim, o alcance de um dos requisitos para o exercício pleno da cidadania. Mas isso não significa que quem não tenha tal domínio deva ser considerado menos capaz, menos inteligente ou até mesmo menos cidadão.
O que deve estar claro para nós é que saber língua não é necessariamente saber fazer uso da metalinguagem dessa língua.
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