Triste Fim de Policarpo Quaresma - Análise da obra de Lima Barreto
Oscar D'Ambrósio, Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação
Geralmente as leituras que são feitas do romance "Triste Fim de Policarpo Quaresma", de Lima Barreto, concentram-se apenas no protagonista, por meio do qual o autor critica o nacionalismo ufanista surgido no final do século 19 e início do 20 no Brasil.
O texto também pode ser lido como um embate entre a utopia e a realidade, pois o sonho de Quaresma, ao qual se dedica de corpo e alma, acaba por levá-lo a um final trágico, sendo condenado à morte pelas próprias forças políticas que apoiava. Assim, aquele que tanto sonhara com um Brasil melhor é derrotado em seus ideais.
Considerado pela crítica literária o principal expoente do Pré-Modernismo brasileiro, a narrativa foi publicada inicialmente em folhetins, em 1911, na edição vespertina do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro. Quatro anos depois, foi impressa em livro.
Floriano Peixoto
Na jornada que leva o protagonista da idealização de uma sociedade brasileira à condenação pela justiça, há críticas diretas ao presidente Floriano Peixoto (1891-1894) e ao pensamento positivista, caracterizado pela afirmação social das ciências experimentais, afastando-se da teologia e da metafísica.
Patriota fanático, Quaresma apresenta uma série de características que o mostram como um aficionado ao Brasil: o número de autores nacionais em sua biblioteca, a valorização do violão, instrumento geralmente vinculado apenas à malandragem, além do estudo de costumes e da música tupinambás. Propõe ainda ao Congresso Nacional a instituição do tupi-guarani como língua nacional.
Esse pensamento o torna objeto de ridicularizarão. É internado num hospício e aposentado por invalidez da função de funcionário público no Arsenal da Guerra. Ao deixar a casa de saúde, Quaresma compra um sítio no interior com o objetivo de viver da atividade agrícola que a fértil terra brasileira propiciaria. O clientelismo hipócrita dos políticos, a deficiente estrutura agrária e as saúvas, porém, levam-no ao fracasso.
Revolta da Armada
A insurreição dos marinheiros da esquadra contra o continuísmo do presidente Floriano Peixoto, conhecida como Revolta da Armada, traz Quaresma de volta à então capital do País. Alista-se para defender o Marechal e, ao conhecê-lo, expõe seu projeto de como tornar o Brasil uma nação agrícola, sendo chamado "visionário" por Peixoto.
Quaresma luta durante sete meses fiel ao presidente e, ao fim do conflito, é nomeado carcereiro da Ilha das Enxadas, prisão dos revoltosos. Assiste, pasmo, ao fuzilamento arbitrário de 12 deles e, ao escrever uma carta a Peixoto sobre o acontecido, é preso, sob a acusação de traição, sendo também condenado à morte.
É possível ainda estabelecer um paralelo entre a incompreensão sofrida por Quaresma e o preconceito racial vivenciado por Barreto (1881-1922). Filho de uma escrava com um português, teve que largar o curso de engenharia, devido ao enlouquecimento do pai, para trabalhar como escriturário na Secretaria da Guerra. Mergulhou, ao longo da vida, num círculo vicioso de álcool e crises de depressão. Sua morte, vítima de colapso cardíaco, é análoga ao de Quaresma. Ambos, com seus sonhos, sucumbem a sociedades que não os aceitavam.