Por que a educação brasileira vai mal em ranking internacional?
Dados divulgados nesta terça-feira (6) sobre o desempenho de estudantes brasileiros em ciências, leitura e matemática mostraram o que as avaliações nacionais já haviam sinalizado. A qualidade educação do país é ruim e precisa de melhorias. Segundo relatório do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos, em tradução livre), a maioria dos alunos brasileiros na faixa dos 15 anos não sabe fazer conta nem entende o que lê.
Divulgado recentemente, o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) 2015 também mostrou que a “nota” da educação no Brasil continua abaixo do esperado, principalmente nos anos finais do ensino fundamental (do 6º ao 9º ano) e no ensino médio.
Na tentativa de compreender os fatores que contribuíram para esses resultados negativos, o UOL conversou com quatro especialistas na área da educação. Um dos argumentos foi unânime: o problema da formação do professor.
Maria Helena Guimarães de Castro
Secretária executiva do MEC (Ministério da Educação)
Problema: Para a professora Maria Helena Guimarães de Castro, o país viu o investimento em educação crescer nos últimos 10, 12 anos. Apesar disso, faltaram políticas públicas voltadas para o setor.
“O Brasil foi um dos países que mais investiu em educação. E é bom mesmo que tenha tido esse crescimento, mas é bom verificar que não adianta só investir. O Brasil triplicou o investimento no ensino médio e os resultados pioraram”, explica. “Fiquei muito triste com os resultados. É preciso muito mais do que investimento”
A formação de professores também se mostrou como “culpada” pelo desempenho negativo do Brasil, segundo ela. “Os professores não estão tendo a oportunidade de desenvolver a sua formação. Tanto o MEC quanto Estados e municípios precisam trabalhar juntos nisso. ”
Solução: Castro considera que a aprovação de uma Base Nacional Comum Curricular, prevista para o ano que vem, será fundamental para melhorar a qualidade da educação no Brasil. Segundo a secretária, é ela quem dará o norte para que as políticas de formação de professores possam ser bem desenvolvida e aplicadas.
“A formação do professor tem que estar muito articulada com a base nacional para a educação básica como um todo. Ela deve ser uma referência”, afirma.
Olavo Nogueira Filho
Gerente de projetos do movimento Todos Pela Educação
Problema: Olavo Nogueira Filho justifica os dados negativos da educação brasileira como sendo resultados de dois grandes aspectos dentro do ambiente escolar: falta de atratividade da carreira de professor e a falta de estrutura de formação para o docente, tanto na fase inicial quanto no momento em que ele já está dentro da sala de aula.
“Se pegar a maioria dos países no topo [do ranking do Pisa], esse aspecto foi levado em consideração em todos eles”, explica.
Outro problema, destacado por Filho, está relacionado à falta de formação específica do professor durante as etapas do ensino. “Pensando em ciências, que foi a disciplina de destaque do Pisa, 65% dos professores no Brasil que dão aulas [na disciplina] no fundamental não têm formação específica em ciências. Quando vai para o ensino médio, apenas cerca de 20% dos professores de física possuem formação em física, por exemplo. As aulas são dadas mais por professores de matemática do que por físicos”.
Solução: Filho faz questão de dizer que na educação não se tem uma solução que resolva todos os problemas. Apesar disso, há algumas estratégias que vão impactar positivamente na melhoria da educação no Brasil, segundo ele. O reconhecimento e a valorização dos professores aliados à formação dos docentes são pontos estratégicos no processo.
“Se nós não reconhecermos a figura do professor como elemento estratégico, nós não vamos conseguir avançar. A carreira precisa ser mais atrativa e não falo só de salário. A sociedade precisa valorizar o professor. As condições de trabalho para o docente precisam ser melhoradas”, afirma. “Nenhum país conseguiu fazer uma transformação na educação sem atentar para a qualidade dos professores.”
Mozart Neves Ramos
Diretor de articulação e inovação do Instituto Ayrton Senna
Problema: Mozart Neves Ramos também considera que o Brasil está estagnado no desenvolvimento escolar e que a falta de formação de professores é um dos motivos. “Um professor bem formado faz uma enorme diferença na questão da aprendizagem [dos alunos].”
Outro ponto destacado por ele é a falta de um currículo escolar que esteja antenado com as necessidades dos estudantes do século 21 e que só se preocupa com dados conteudistas.
Solução: O currículo escolar precisa ajudar a desenvolver novas habilidades para a vida do adolescente, na opinião de Ramos. “Também é preciso ter mais foco na gestão. Veja, o Chile tem um investimento per capita [em educação] similar ao do Brasil, mas lá isso tem um impacto de 77 pontos [a mais] no desenvolvimento escolar”, explica. “O Chile agora está introduzindo as novas habilidades socioemocionais– como pensamento crítico, criatividade e trabalho colaborativo-- na formação de alunos e professores. Ele está fazendo a coisa que, se ainda não é compatível com os países que estão no topo da OCDE, faz com que ele fique no topo da América Latina”.
Antônio Augusto Gomes Batista
Coordenador do Cenpec, centro de estudos e pesquisa em educação
Problema: Para Antônio Augusto Gomes Batista, há uma grande desigualdade na qualidade da educação distribuída no Brasil –que é reflexo das desigualdades sociais que o país enfrenta. “As médias das escolas federais e das escolas particulares estão próximas das médias dos países europeus. As escolas particulares são para quem pode pagar e, nas federais, é feita uma seleção dos alunos. Vão para elas quem tem mais acesso a recursos culturais e, consequentemente, socioeconômicos”, explica.
Ele também aponta para a existência de uma “barreira” no ensino fundamental 2, que engloba do 6º ao 9º ano. “É um problema de atendimento e de fluxo. Cerca de 20% desses alunos de 15 e 16 anos que fazem o Pisa são jovens que ainda estão no ensino fundamental”, destaca, ressaltando que a distorção idade-série segue ainda muito grande no país. “Tem muita gente que sequer chega ao ensino médio [por desistir no meio do caminho]”.
Solução: Batista destaca que o Brasil tem seguido direções boas no sentido de melhorar a educação no país, mas que elas precisam ser mais bem integradas. Um exemplo é a iniciativa de criar uma base curricular nacional, que definiria para todos o que deve ser ensinado e aprendido, segundo ele.
Apesar dessa discussão estar em alta com as propostas de reforma do ensino médio, ele ressalta a necessidade do diálogo nesse processo. Além disso, Batista afirma que há uma necessidade de integração entre os sistemas de ensino federal, estadual e municipal, para que haja uma colaboração efetiva entre eles. “Sendo um sistema de federações, o Brasil precisa unir esforços. Não precisamos de competições entre estado e município, como acontece em alguns casos: há briga por matrícula, por quem é melhor do que o outro”, exemplifica.
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