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Após apontar racismo em prova, ex-aluna da UFF é denunciada à Justiça

Filipe Redondo/Folhapress
Imagem: Filipe Redondo/Folhapress

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

16/12/2017 04h00

Quatro anos após denunciar por racismo uma professora do curso de Biblioteconomia da UFF (Universidade Federal Fluminense), a ex-aluna Marcia  Brêtas, 30, foi acusada de denunciação caluniosa.

Em julho de 2013, ela comunicou ao Disque 100 o uso de conteúdos de cunho racista na universidade após uma professora aplicar uma prova com o texto "Estudo provando que o negro é inferior", de Oswaldo Melchior.

O caso chegou a ser investigado pela polícia, de forma equivocada segundo a defesa, como injúria racial, mas foi arquivado. No entanto, na última terça-feira (12), o Ministério Público do Rio de Janeiro ofereceu denúncia à Justiça em que a acusa de denunciação caluniosa.

Geilson Soares Ponciano, advogado da ex-aluna (ela se graduou neste ano), diz que o caso compromete o canal de denúncias que ferem os direitos humanos.

"Primeiramente, o caso não tem relação com injúria racial. O texto causou repulsa na estudante que comunicou o caso ao Disque 100. Trata-se de um episódio que viola gravemente direitos da população negra. Além de não ter sido corretamente investigado, a denúncia acabou se voltando contra ela. Não houve denunciação caluniosa, pois o crime somente ocorre quando se denuncia uma pessoa sabendo de sua inocência. Não é esse o caso. Isso é um tiro no pé na defesa dos direitos humanos, principalmente dos mais vulneráveis, pois está ocorrendo intimidação do ato de denunciar graves violações”, destacou o advogado. 

A polêmica envolveu a professora Renata Barbatho responsável pela disciplina de Ação Cultural em Unidades de Informação. A antiga aluna contou que a denúncia do MP não a surpreendeu. 

"Se preciso sentar no banco dos réus por ser contra a utilização desse tipo de texto, que seja! Não me causa surpresa. Na época, me alertaram que isso costumava acontecer com esse tipo de denúncia", afirmou Márcia, que relata ainda que o texto não era pertinente à matéria estudada.

A defesa tem até 10 dias para apresentar suas alegações. Depois disso, a Justiça vai resolver se aceita ou não a denúncia.

O caso está sendo acompanhado pela Comissão Estadual da Verdade da Escravidão Negra no Brasil da OAB/RJ (Ordem dos Advogados do Brasil do Rio).

Professora nega racismo

Procurada pelo UOL, a docente Renata Barbatho negou as acusações. "A denúncia feita dentro da UFF foi levada ao colegiado que, ao analisar os fatos, entendeu que se tratava de um texto racista para debater o racismo e não para propagar o mesmo."

A professora disse que espera ainda que a estudante seja responsabilizada.

"Escolhi acreditar que ela de fato não entendeu o debate. Mas foi uma escolha pessoal isso. Mas nada muda o fato de achar que ela precisa responder por suas ações. É adulta e estava dentro da universidade, logo, completamente responsável por suas ações", disse a ex-professora.

Segundo a ex-aluna, o texto aplicado na prova não era compatível com a disciplina. "O curso é bem técnico. Aquele texto não deveria estar ali. Aquilo foi divulgação de um material racista", defende. Marcia também negou que a proposta fosse um debate. "Quando me deparei com o texto achei que teria um outro. Um contraponto para um debate e não tinha. Ler aquilo me fez mal", completou.

Na ocasião, Barbathi prestou esclarecimentos internos no Instituto de Arte e Comunicação Social (IACS) e não sofreu sanções administrativas. Ela ainda recebeu uma carta de apoio assinada por outros 24 estudantes de Biblioteconomia que prestaram o exame. A docente era professora substituta e deixou a universidade logo após a polêmica. 

Procurados, o Ministério Público do Rio e a Universidade Federal Fluminense ainda não se pronunciaram sobre o caso.