Ataques a escolas têm 100% de autores homens, e maioria de vítimas é mulher

Mulheres são 60% das vítimas em ataques ocorridos dentro de escolas no Brasil e os autores desses episódios violentos são homens — a maioria deles, brancos, segundo estudo de pesquisadores da Unicamp.

O que diz a pesquisa

Dos 36 ataques analisados pelo estudo desde 2001, em apenas 2 os autores não eram brancos — em Realengo (RJ) e em Poços de Caldas (MG). Cerca de 75% deles eram menores de idade e 46% tinham entre 13 e 15 anos.

Ao todo, foram 40 mortes e 102 pessoas feridas nessa situação. O estudo leva em consideração ataques cometidos por alunos ou ex-alunos das instituições de ensino, com a intenção de causar morte e que tenham sido planejados.

O levantamento considera os episódios de violência cometidos por alunos ou ex-alunos das instituições de ensino, com a intenção de causar morte e que tenham sido planejados. O relatório foi feito pela pesquisadora Telma Vinha, professora da Unicamp, e publicado pelo D³e (Dados para um Debate Democrático na Educação), com apoio da B3 Social e Fundação José Luiz Egydio Setúbal.

O estudo aponta também que mais de 50% dos episódios de violência dos últimos 23 anos ocorreram entre 2022 e este ano. 59,43% das vítimas são mulheres e 40,57% são homens.

Para Telma Vinha, não é possível "cravar que a intenção seja ferir mais meninas", mas ela ressalta que na prática o resultado é esse. No episódio de violência ocorrido na Escola Estadual Sapopemba, em São Paulo, três garotas estavam entre as vítimas — uma morreu e duas ficaram feridas.

Das 37 escolas que registraram ataques, 31 ficam em áreas de nível socioeconômico médio para cima. "O pânico e a expectativa de resposta rápida por parte das autoridades fizeram com que o policiamento fosse reforçado em escolas periféricas com um contexto de violência ao redor, mas essa relação não é válida", diz a pesquisadora.

Outra pesquisa, mesmo perfil

Relatório produzido durante o governo de transição já apontava jovens brancos como principais autores de ataques. "Adolescentes e jovens brancos e heterossexuais são os principais alvos de cooptação pelo discurso extremista e, assim, são também os promotores mais comuns dos ataques às escolas", diz trecho do material.

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O levantamento foi feito por 12 pesquisadores e coordenador pelo professor da USP Daniel Cara. Ele afirma que os estudos apontam a "misoginia como elemento estrutural e uma estratégia" das subcomunidades.

O extremismo estimulado nas subcomunidades, onde foram encontrados a maioria dos autores, é uma ideologia pautada na "aniquilação de outras pessoas", afirma o relator do texto. Ele explica que a existência dessas pessoas "tensionam, incomodam e desafiam o supremacismo branco".

'Violência é diferente das outras', diz professora

É uma violência muito ligada ao sentimento de "perda de poder" por parte de meninos brancos para meninas, meninos negros e outros grupos.
Telma Vinha, professora da Unicamp

Estamos falando de crimes contra mulheres. Não é um cara que sofre bullying e mata todo mundo, mas alguém imerso numa realidade de misoginia, acesso a armas e outros problemas. Em Realengo, os principais alvos eram as meninas.
Adriana Silveira, presidente da Associação Anjos de Realengo

A misoginia, o ódio inaceitável às mulheres, mobilizam os ataques. As mulheres são as principais vítimas. Isso é revoltante e assustador. A misoginia e o racismo são elementos estruturais do extremismo brasileiro. E o extremismo estrutura os ataques.
Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação da USP

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'O país que eu vivo, falhou comigo', diz mãe de vítima

Adriana Silveira perdeu sua filha de 14 anos durante o ataque à escola Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio. Hoje, ela é presidente da associação que discute o assunto.

Para Adriana, houve poucos avanços em relação à prevenção de ataques a escolas de 2011 para cá. A falta de psicólogos nas escolas é um ponto criticado.

Ela também defende que haja um monitoramento na internet para evitar esses episódios. "A investigação em redes sociais é importantíssima e deveria ter mais investimento. Com o que já foi feito, grupos foram identificados e ataques evitados".

O país em que eu vivo falhou comigo, com a minha filha e o pior: continua falhando com outras famílias. Troquei meu luto por luta e só terei justiça quando os ataques pararem de acontecer.
Adriana Silveira

Relatório do MEC propõe 13 ações

O extremismo estimulado nas subcomunidades, onde foram encontrados a maioria dos autores, é uma ideologia pautada na "aniquilação de outras pessoas", afirma Daniel Cara. Ele explica que a existência dessas pessoas "tensionam, incomodam e desafiam o supremacismo branco".

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Um relatório do Grupo de Trabalho de Especialistas em Violência nas Escolas, formado pelo MEC (Ministério da Educação), propõe também 13 ações para combater o aumento desses episódios nas instituições de ensino. O texto é fruto do trabalho de 68 especialistas da área e foi divulgado pelo MEC (Ministério da Educação) no início do mês.

Cara afirma que colocar as medidas em prática "depende da vontade governamental". Ele e outros especialistas afirmam que a tendência é que os governos agem apenas quando um episódio desse acontece.

É preciso prevenir e trabalhar sobre como devemos agir. O relatório é um importante insumo e está entregue ao público.
Daniel Cara

6 comentários

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Francisco Alexsandro Soares Alves

"Supremacismo branco"? É por isso que se gasta dinheiro nessas "políticas afirmativas" e nunca nada melhora. Desde essa realidade dos EUA fez parte do Brasil? Aí o petista vem com essa de supremacismo branco importado!

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Francisco Alexsandro Soares Alves

Agora o foco será políticas de proteção à mulher e não a violência em si. Ficou mais fácil, né, PT? Outra, se as vítimas são mais garotas, deve-se ver que o bullying também é praticado por elas sobretudo. Mais outra, os discursos de ódio de movimentos como Black Lives Matter também serviram já para assa ssi nos invadirem escolas e mat arem pessoas brancas. Aqui mesmo no Brasil foram assassinados dois jovens, um casal de namorados, por serem católicos. 

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Rubens Monteiro de Souza

Vale lembrar que em 1999 houve o massacre de Columbine nos EUA, um divisor de águas pela influência nos ataques às escolas por lá. Depois no Brasil, ainda em 1999, ocorreu o ataque no cinema em São Paulo, talvez o primeiro ato de violência do tipo, embora não escolar. A despeito de variações nos vinte anos subsequentes, em 2022 e 2023 aconteceram uma explosão de ataques causados provavelmente pela pandemia de covid-19 que começou em 2020. Isso nos dois países. No Brasil a interrupção das aulas, o aumento da exposição dos jovens na Internet e dos distúrbios mentais foram marcantes. A supremacia branca pode ser uma condição necessária, mas não é suficiente para decuplicar os ataques. Meninas são maioria no ensino médio, 52%, contra 59% de vítimas, então a maior parte é ataque circunstancial sem misoginia. A vulnerabilidade mental do adolescente masculino, brancos em particular, sugere que o rastreamento nas redes sociais é a medida mais eficaz.

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