Novo ensino médio cortará 2 meses de aulas tradicionais, dizem professores
A proposta da carga horária de 2.100 horas para o ensino médio vai impactar na diminuição de dois meses de aulas tradicionais, como matemática e português, segundo a avaliação de professores e pesquisadores.
O que aconteceu
O cálculo feito pelos educadores aponta que os alunos de escolas públicas teriam uma redução de cerca de 30 minutos por dia nas disciplinas tradicionais. Em documento assinado por mais de 30 pesquisadores, eles afirmam que o impacto será duplicado se a decisão final for por 1.800 horas para formação geral — proposta implantada durante o governo de Michel Temer (MDB) e que foi suspensa neste ano.
A manifestação acontece em meio à discussão para mudar novamente a carga horária dos alunos do ensino médio. O governo Lula (PT) enviou projeto de lei com 2.400 horas, mas o relator da proposta, deputado federal Mendonça Filho (União-PE), vai sugerir 2.100 horas.
O grupo de professores defende que alunos do ensino médio regular e do técnico tenham garantidas as 2.400 horas para aulas básicas. "Isso implica um esforço maior dos governos estaduais para garantir a existência de uma escola com infraestrutura e profissionais da educação valorizados", diz o documento.
Além da carga horária, o grupo critica a desobrigação para o ensino de língua espanhola. "O projeto do governo Temer rompia e esfriava a relação com os países vizinhos [ao incluir a obrigação apenas para o inglês]. É um retrocesso", afirma o professor da Faculdade de Educação da USP, Fernando Cássio.
O Consed, conselho que reúne os secretários estaduais de Educação, defende as alterações previstas por Mendonça. Os representantes se reuniram com o relator na semana passada. A reportagem procurou o grupo, mas o conselho diz manter as sugestões feitas ao relator e não quis comentar as críticas dos pesquisadores.
Reforma desagradou petistas
A reforma do ensino médio ocorreu no governo Temer e desagradou setores ligados ao PT. Houve o pedido de revogação do modelo no início do ano, mas o governo Lula decidiu suspender a implementação e abrir o tema para consulta pública.
Mendonça era ministro da Educação de Temer quando a proposta foi aprovada. Ele tem dito que apresentará um projeto parecido com o que foi fechado em 2017 — o novo texto deve ser divulgado na próxima semana.
O que diz o grupo de professores
A nota técnica assinada por mais de 30 pesquisadores cobra um "maior equilíbrio entre componentes curriculares e áreas do conhecimento, assegurando a presença de todas as disciplinas ao longo dos três anos do ensino médio".
Professores(as) que antes lecionavam apenas as disciplinas para as quais foram formados(as), agora assumem componentes curriculares para os quais não possuem qualquer acúmulo científico ou metodológico.
A proposta do MEC é respaldada por uma consulta pública bem ampla. Não faz sentido você adotar a posição de pequenos grupos, que inclusive fizeram a reforma do ensino médio em 2017 e que se mostrou um grande fracasso, e tratorar o debate.
Fernando Cássio, professor na USP e signatário da nota técnica
Relator rebate críticas
Ao UOL, o relator Mendonça Filho negou falta de diálogo. Ele contou que conversou com o MEC ontem e com secretários estaduais de Educação na quarta-feira (6) e que participou de uma audiência pública na Comissão de Educação com a presença de estudantes.
O deputado ressaltou que está ouvindo especialistas, mas cabe à Câmara decidir o projeto. "Eu assumo minhas posições, mas o Parlamento será soberano para deliberar sobre qualquer projeto."
A respeito da infraestrutura das escolas técnicas, ele argumentou que cabe aos estados e organizações providenciar. O relator disse que não é uma lei que resolverá os problemas, mas investimentos contínuos e graduais.
Mendonça Filho citou pesquisa Datafolha de 2022 que mostrou que 98% dos alunos de escolas públicas querem matérias voltadas ao mercado de trabalho. No projeto, ele informa, há a possibilidade de estudar matérias específicas com a pretensão de atender a esse desejo. "A consulta demonstra maioria de estudantes favoráveis ao ensino técnico e estamos respeitando a vontade deles."
O que diz o MEC
A mensagem que quero dar é de todo respeito ao Congresso Nacional, que é quem aprova as leis nesse país, e lembrar a todos parlamentares e ao ex-ministro [Mendonça Filho] que esse foi um processo de ampla discussão, não foi um projeto feito por Medida Provisória como da vez passada.
Camilo Santana, ministro da Educação
É um esforço que precisa estar acima de qualquer movimento ideológico. Espero que a gente possa dialogar com muito franqueza, não só com o relator, mas com os parlamentares.